Acordei achando que já fosse de manhã. O quarto escuro, a rua silenciosa. Olhei para o relógio e passava pouco da meia-noite. Fui despertada por um sonho que tive. Em uma igreja decorada com flores brancas e azuis, eu estava vestida de noiva. Tocava a marcha nupcial. A igreja lotada de gente, flashes de câmeras fotográficas me cegavam. Sozinha, caminhei por um tapete de veludo branco até o altar. Então, ele apareceu: Frankenstein. Sorriu um sorriso de quem nunca tinha escovado os dentes e estendeu as mãos frias e ásperas para mim. Usava fraque e cartola, na lapela um botom com o escudo do Corinthians. O padre indiferente ao meu espanto, meus pais tranquilos, todos pareciam achar tudo aquilo lindo.
O padre: - Senhor Frankenstein, é de sua livre e espontânea vontade se casar com a Senhorita Diva Latívia?
Frankenstein: - Sim, dá ela logo pra mim!
O padre: - Senhorita Diva Latívia, aceita o monstro Frankenstein para ser seu marido?
Frank babava, cheirava mal, sua roupa estava suja de terra, suas unhas eram encardidas, seus cabelos oleosos, certamente sofria de dermatite seborreica e aquela cicatriz no meio do rosto estava coberta de purpurina.
Meus pais sorriam emocionados. Frank exalava seu mau hálito quando abria a boca e resmungava palavras incompreensíveis.
Eis que apareceu Dom Quixote de la Mancha! Montado em seu cavalo atravessou a galope a igreja, lutou bravamente com Frankenstein e, enquanto eles dois se socavam, saí correndo pela rua, entrei no primeiro ônibus lotado que passou. Os passageiros eram bem interessantes: Branca de neve e os sete anões, Cinderela, Chapeuzinho Vermelho com a Vovó e uma ex-presidente, que prefiro não mencionar o nome. Não fosse a bondade de Santa Teresa de Calcutá, a Madre, que ali estava pedindo esmola para seus pobres, eu teria sido expulsa do coletivo na parada seguinte, pois não tinha dinheiro para pagar a passagem. Quando Madre Teresa já tinha me convencido que meu lugar era no convento, acordei achando que fosse de manhã.
Sonhos estranhos deveriam entrar em cartaz em nossas mentes somente em dias úteis. Aos finais de semana deveríamos sonhar com coisas amenas, assuntos que não nos levassem aos porões de nossas mentes, temas interessantes para psicólogos e psiquiatras em geral. Sei que monstros não existem, mas tem um monstro no altar me esperando. E vocês ainda querem falar comigo sobre casamento?
Penso seriamente em escrever um texto com o título mais ou menos assim: prefiro prender meu dedo na porta do que me casar. Coitado do Frank. Com tanta mulher no mundo dos sonhos, foi escolher Diva Latívia, a noiva mais ligeira na corrida dos cem metros de passarela de igreja.
Contei o sonho à minha auxiliar do lar, Zezé. Ela começou a rir e não parou mais. Achou que Dom Quixote fosse o Zorro, que Madre Teresa fosse minha parente e que aquilo era sinal de que alguém do outro mundo queria falar comigo. O que esperar de uma criatura que me perguntou quem é o atual presidente do Brasil e, quando respondi, se espantou: - quem é esse?
Agora não sei se vou ao psicanalista, se vou à igreja, ou se escrevo um texto e volto a dormir. De certo mesmo, apenas a semelhança que nunca notei: Zorro se parece com Dom Quixote e Madre Teresa se parece muito com minha tia Marieta. Tem jeito, não. Vou ter que marcar uma sessão com meu analista, antes que eu imagine que Frankenstein está aqui ao meu lado, só esperando que eu diga "sim".