É proibida a reprodução não autorizada dos textos deste blog, de acordo com a Lei nº9.610, de 19 de fevereiro de 1998, que regula os direitos autorais.

Apresentação

Este blog nasceu no blog Janela das Loucas, onde assinava "Diva Latívia". Ali permaneci durante muito tempo, como autora principal das crônicas do blog. Redescobri que escrever é vital pra mim, guiada e editada por Abílio Manoel, cantor, compositor, cineasta e meu querido amigo. O Janela das Loucas não existe mais, Abílio foi embora pro Céu. Escrevo porque tenho esse dom divino, mas devo ao Abílio este blog, devo ao Abílio a saudade que me acompanha diariamente. Fiz e faço deste blog uma homenagem a aquele que se tornou meu irmão, de alma e coração. Aqui o tema é variado: cotidiano, relacionamentos e comportamento, em prosa e versos.







6 de dez. de 2014

VINTE E DOIS DE JANEIRO

No aeroporto ela esperou que o avião decolasse e o viu partir. Namorava o mesmo garoto desde os treze anos de idade, uma história que começou na rua onde moravam e que durava sete anos.
Aquela era a primeira vez que se separavam, justamente na época das festas de final de ano.
Olheiras escuras se penduraram sob seu olhar cor de mel. O ano terminou, outro ano começou, um mês afastados.  O tempo pareceu não passar e  tudo o que recebeu dele eram foram notícias breves e raras.
Era dia vinte e um de janeiro quando ele voltou das férias e, ao contrário do que era esperado, não a avisou sobre o dia e horário de chegada. Ela o descobriu de volta no dia seguinte, em fotos publicadas no Facebook. Um encontro dele com os amigos em um bar, ocorrido na véspera. Em sua companhia sorria com dentes muito brancos uma garota bronzeada. Mexeu e remexeu em perfis na internet até descobrir a tal de Taís.
No mesmo instante atravessou a rua e pisou duro os cem metros de distância entre sua casa e a casa dele. Tocou a campainha descontroladamente e ingressou na casa sem fazer cerimônia. Lá estava ele de bermuda, descalço e sem camisa, sentado à mesa do café. Ao vê-la gaguejou algo inaudível.
A cena do tapa que ela deu no braço do namorado foi assistida pela plateia composta pelo pai, a mãe e o cachorro barulhento da família, isso marcou a pele do rapaz e justificou o final do namoro no dia vinte e dois de janeiro.
O ano passou e seu isolamento social era discreto, mas perceptível. Conseguiu bolsa de estudos em uma universidade estrangeira, estaria a milhares de quilômetros daquela rua. De malas prontas rumo ao Canadá, a dois dias da viagem o encontrou no ponto de ônibus, ele de roupa social, a barba bem feita, os cabelos mais curtos. Seu coração voltou a bater e desejou que naquele instante parasse o tempo. Contou-lhe que mudaria para o Canadá, dele ouviu qualquer coisa do tipo: - boa viagem. O ônibus da linha 8769 chegou, ela embarcou e essa foi a última vez que o viu.
Há cinco anos em Toronto ela concluiu a faculdade e foi convidada para trabalhar em uma indústria farmacêutica. Conheceu Jean Paul, seis anos mais velho. Casou sem festa e nem papel e quase superou o passado, não fosse a celebração às avessas que ocorre todo dia vinte e dois de janeiro, quando chora às escondidas e acena para um avião imaginário. Depois lava o rosto, respira fundo e espera a chegada do dia vinte e três.