Evitei reencontrá-lo. Fugi dos aniversários, festas
surpresa, happy hours, viagens de final de semana com a turma. Por fim, quando
o Cléber foi atropelado – Cléber era o nosso amigo mais novo- não teve jeito.
Nós dois acabamos nos reencontrando no saguão de um hospital público. Ele, mais
magro, barba crescida de dois dias. Um tesão, não menos que isso foi o que na
hora calculei. Nas mãos, dedos longos, um anel no dedo anular direito. Notei,
porque ele segurava o capacete da moto. Que moto? Ele nunca tinha pilotado uma
moto!
-Oi, Diva.
- Oi, Del.
- Falei com a enfermeira, ela disse que ele está sendo
operado.
- Que coisa, né? Será que o motorista o socorreu?
Ele não respondeu, ficou me olhando. Aquela olhada que deixa
a gente nua. Eu, que sempre o evitei, estava ali, do avesso, a meio metro dele.
Pude sentir seu perfume, Armani. Ele sempre usou o mesmo perfume. Delícia.
Ficamos em silêncio durante um tempo indefinido. Pensei em
sair correndo, fugir, sumir. Resolvi telefonar pra Paty, ela deveria estar ali.
Onde estariam todos? Telefonei pra um, pra outro. Tudo caixa postal. Droga de
celular!
- Tá nervosa?
- Del, dá licença, eu vou lá fora fumar.
De fato, eu precisava respirar, ainda que fosse a fumaça do
cigarro. Minhas mãos estavam suadas e geladas. Acendi o cigarro, dei duas
tragadas, joguei fora. Caminhei alguns passos. Resolvi ir ao banheiro. Quando
me olhei no espelho notei que eu estava horrível. Meus cabelos presos de
qualquer jeito, eu com a camiseta que usava em casa. Um lixo. Que aliança seria
aquela na mão direita dele? Teria se casado? Estaria namorando alguma garota?
Fui tomar um café. Lá estava ele na lanchonete do hospital.
Não me viu chegando, pude secá-lo, literalmente. Alto, cabelos grisalhos. Ele
sempre ficou bem assim, usando jeans e camiseta. Como será que fomos nos perder
um do outro? Não queria pensar nisso, não queria mais lembrar.
- Diva, senta aqui.
Achei demais ele me chamar pra perto de si. Sentamos
juntinhos, eu ao lado dele na mesma mesa. Segurou minhas mãos. Meu coração
disparou acelerado. Passou as mãos nos meus cabelos e falou baixinho, com os
olhos cheios de lágrimas: - Vieram falar comigo, ele não resistiu à cirurgia, o
Cléber morreu.
Chorei pelo Cléber, chorei por mim, chorei pelo Del, por
todos nós. No dia seguinte, no enterro, vi o Del com um cara loiro, alto,
bonito. Os dois de mãos dadas. Disse a Paty que eles dois moram juntos, que o
Del namora o sujeito.
Preferi não mais pensar no Del e comecei a cuidar de mim. Vida
curta, vida breve. Adeus, Del.
2 comentários:
Estes tipos como o Del são um perigo! Uma granada sempre pronta a explodir na nossa mão. E na primeira, sei lá se na segunda vez ou...a gente se apaixona de verdade. Este Del tem um quê de sensibilidade a mais que nossas antenas femininas captam mas não traduzem ou se esforçam para não traduzir, talvez. Arrisco a dizer até que já sabíamos mas não queríamos acreditar. Na verdade sempre vimos no Del algo muito, muito especial e definitivamente não queremos questionar muito nossa razão quando enxergamos, disfarçados, certos gestos, certos deslizes...digamos assim. O bom seria que todas pudéssemos um dia enxergar como tu, na lata, sem mais dúvida. Mas enquanto nem todos os Del do mundo ficam tão esclarecidos para nós, continuamos nossa paixão, continuamos buscando onde erramos para ele nos ter deixado ou para nós termos desistido. Chegamos até nos sentir culpadas por não ter investido mais ainda.
É, este tal de Del tem um veneno gostoso e causa um estrago enorme no nosso coração!
Cláudia Cavalcanti,
Del é o castigo em formato de homem. Ninguém merece o Del.
Obrigada pelo seu comentário e venha sempre, gostei muito da nossa dupla e feliz coincidência!
Um beijo
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