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Apresentação

Este blog nasceu no blog Janela das Loucas, onde assinava "Diva Latívia". Ali permaneci durante muito tempo, como autora principal das crônicas do blog. Redescobri que escrever é vital pra mim, guiada e editada por Abílio Manoel, cantor, compositor, cineasta e meu querido amigo. O Janela das Loucas não existe mais, Abílio foi embora pro Céu. Escrevo porque tenho esse dom divino, mas devo ao Abílio este blog, devo ao Abílio a saudade que me acompanha diariamente. Fiz e faço deste blog uma homenagem a aquele que se tornou meu irmão, de alma e coração. Aqui o tema é variado: cotidiano, relacionamentos e comportamento, em prosa e versos.







12 de set. de 2014

ATO FALHO AMOROSO

Dizem que a pressa atrapalha a perfeição. Quando estou apressada atropelo os móveis, topo o dedinho, derrubo objetos. Um tanto distraída, com uma pitada de mau humor típico de quem vive atrasada. Coisa de mulher urbana, com jornada múltipla. Casa, família, cachorro, trabalho, cursos, amigos, imprevistos e a cabeça sempre nas nuvens. Assim despertei na manhã fria de quinta-feira. Na agenda estava escrito com letras maiúsculas, minha caligrafia de causar vergonha:  NÃO ESQUEÇA A REUNIÃO ÀS 8H00.
Doutor Armando, meu ex-chefe, é personagem de sonhos assustadores e recorrentes. Desde que saí daquele escritório, ele povoa meus pesadelos. Fiquei traumatizada, sinceramente. A cobrança de prazos, o receio de perder algum papelzinho, aquilo se incorporou aos meus neurônios restantes. Todo compromisso de trabalho com hora marcada me assombra. Tive um pesadelo, lá estava Doutor Armando a rasgar todas as cédulas de cem reais que tirava da minha carteira. 
A noite mal dormida, sonolenta. Logo cedo encontrei Divo, também atrasado, porém pensativo e enigmático. Conversar assim que desperto, fazer a tal da “discussão da relação”, pra mim é impossível. Ele comentou qualquer coisa a respeito do final de semana, compromissos que modificariam meus planos de sossego. Contrariada, escutei e escutei calada. Voltei para a cozinha, bebi café forte e sem açúcar, fui tomar meu banho, depois dei comida pro meu cachorrinho. Olhei ao redor, Divo estava no terraço. Fiz um esforço apaziguador, me despedi e fui para o trabalho.Dez da manhã, no escritório, tocou meu celular, era da portaria do edifício onde moro: -  Dona Diva, o Sr. Divo está na sacada gritando, pedindo socorro.
O sangue esfriou tanto que imaginei hemácias on the rocks. Pensei na torradeira, que de vez em quando esqueço ligada. Um incêndio, assalto, desabamento?
Fui para casa e passei pela portaria sob o olhar do porteiro. Olhei para o alto, tentei visualizar o apartamento. O elevador subiu e subiu lentamente, Abri a porta de casa, o cãozinho latiu mais estridente do que o normal. Ao ouvir a minha chegada, a vizinha do apartamento ao lado apareceu no corredor. Disse apenas uma palavra: - Coitado!
Lá estava Divo, no canto do terraço, encolhido de tanto frio. A porta da sacada trancada pelo lado de dentro. Quando me despedi, tranquei a porta, um ato falho. Divo, possivelmente com a pressão arterial alterada, estava meio roxo. Abri a porta e ele somente lançou um olhar pontiagudo para mim.
Pedi desculpa, ele não respondeu. Busquei um copo d´água, que ele bebeu em um gole só. Perguntei se precisava de alguma coisa: café, remédio, médico, hospital. – Quero que você suma da minha frente!
E foi assim que eu sumi. Escrevo este texto ainda no escritório. Voltar para casa parece uma péssima ideia neste momento. Será que Freud conseguiria explicar essa situação? Bem que no meu horóscopo estava escrito que eu prenderia o amor nesta semana. Se fosse mais específico, o tal do horóscopo deveria ter avisado que eu o prenderia no terraço do apartamento.

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