A penumbra do ambiente, a luz da luminária antiga. Sua cabeça doía e parecia brincar de roda, um gira-gira de
lembranças que iam e vinham e a assombravam. A janela do terraço restava
aberta, o vento espantava a cortina de renda, que rodopiava assanhada a
derrubar os enfeites de cristal sobre a mesa lateral. Cristal quebrado, admirou
impassível os minúsculos pedacinhos coloridos espalhados sobre o tapete. Assim
era a sua história, a sua vida, assim estava o seu coração: partido!
Todos os amores deveriam nascer com um certificado de
garantia eterna. Amores deveriam ser infinitos e intensos, mais e mais, a cada
dia. Suspirou e enxugou outra lágrima. Olhou para o relógio e percebeu que ali estava, praticamente jogada sobre o sofá, desde as cinco horas da tarde. O tempo
parecia paralisado, ela não notou o caminhar das horas. Tratou de enxugar as
lágrimas, recolher os minúsculos pedacinhos de cristal, fechar a janela. Antes
de chegar ao quarto, escutou o som da chave a rodar na porta de entrada. Era
ele!
Amores deveriam morrer silenciosamente e à seco. Sem choro,
sem lágrimas, sem gritos, sem apelos patéticos. Amores deveriam morrer
dignamente. Seu coração acelerou, sua cabeça parecia querer explodir. Perdeu o
controle de si. Seus gritos foram escutados em outros apartamentos, em outros
andares. Enfurecida, magoada, ensandecida. Havia ainda um sentimento qualquer
dentro de si, algo que implorava: “ por favor me ame, não me deixe! “. Amores
deveriam ser recíprocos!
A dor do adeus, para vida, ou para a morte, é lancinante.
Dizer adeus, nunca mais saber se aquele alguém está feliz, ou triste. Se está
resfriado, ou se viajou novamente. Se ainda bebe café com cinco gotas de
adoçante, ou se continua escutando as mesmas músicas. Perder alguém, perder-se
de alguém para a vida! Adeus...
Ele passou ligeiro pela sala, atravessou o corredor e
fechou-se no quarto. Não mais que meia
hora e saiu de lá carregando duas malas e uma sacola. Falou qualquer coisa sobre
o advogado, a separação. Teimosas lágrimas, outra e outra a escorrer por seu
rosto. Olhos inchados, mãos trêmulas. Quis dizer alguma coisa, balbuciou seu
nome. Ele saiu pela porta sem olhar na sua direção. Foi embora sem dó e
rapidamente. Pelo terraço do apartamento ela conseguiu vê-lo entrar no carro,
lá embaixo, na calçada do lado oposto da rua. Acenou, ele não a viu. Adeus... Todo
adeus deveria durar apenas uma fração de segundo e ser sucedido por uma reconciliação calorosa e feliz.
Amor, feito rosa, desabrocha lindamente e, um dia, se esvai.
Pra onde irão os amores desfeitos, cujos laços se desmancharam pela vida, ou
pela morte? O sol voltou a brilhar no dia em que derramou o olhar sobre um
outro alguém. Feito roseira, uma nova flor despontou em botão, um recomeço, o papel do amor a se executar outra vez. O
perfume das rosas é eterno, as flores são mortais. Que pena, os amores
bailam na vida em um vem e vai, brotam no olhar, na voz, nas palavras todas e morrem no adeus, a esperar uma nova primavera em flor. Adeus...
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