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Apresentação

Este blog nasceu no blog Janela das Loucas, onde assinava "Diva Latívia". Ali permaneci durante muito tempo, como autora principal das crônicas do blog. Redescobri que escrever é vital pra mim, guiada e editada por Abílio Manoel, cantor, compositor, cineasta e meu querido amigo. O Janela das Loucas não existe mais, Abílio foi embora pro Céu. Escrevo porque tenho esse dom divino, mas devo ao Abílio este blog, devo ao Abílio a saudade que me acompanha diariamente. Fiz e faço deste blog uma homenagem a aquele que se tornou meu irmão, de alma e coração. Aqui o tema é variado: cotidiano, relacionamentos e comportamento, em prosa e versos.







9 de mar. de 2012

TRISTONHAS MELANCIAS

Amanheci jururu. Quem usava muito esse adjetivo era minha avó paterna, uma amazonense miudinha, olhinhos muito verdes e o temperamento forte, típica matriarca. Talvez, metade do que digo seja fruto do que aprendi com essa senhora. Adelina, esse era o nome dela.
Está gravado no dicionário da língua portuguesa, ou pai dos burros, como ela mesma assim o chamava: jururu significa tristonho, sorumbático, melancólico.
Ah, a melancolia. Melancolia, quando eu era muito pequena, imaginava que fosse alguma fruta, algo parecido com melancia. Começa com mel, mas nada traz de doçura em seu experimento.  É agridoce a tal da melancolia.
Dona Adelina era difícil de ser engolida, melancolia não é melancia. Pequenininha, aparentemente frágil, a criaturinha era uma rocha inabalável. Jamais a vi chorar, por mais que a vida nela batesse, por piores que fossem seus dias. Não se curvava aos dissabores da vida.
Ruim com ele, pior sem ele. Essa frase marcou uma fase que parecia interminável na minha vida. Na metade do século XX, quem quisesse viver em sociedade precisava jogar pra torcida e suportar um casamento arrebentado e insatisfatório. Casou? Azar o seu. Ou, como ela também dizia: quem seu fundo aluga, não escolhe onde sentar. Osso duro de roer, ela era assim.
Sinto que sou um possante carro de Fórmula 1, lidero a corrida desde a largada, porém, preciso agora parar no box, para abastecer, ou não cruzarei a linha de chegada em primeiro lugar. A menos de dois anos da sonhada aposentadoria, há dias em que sinto vontade apenas de passear no parque. Talvez, após os 50 anos de idade, a gente saiba exatamente aquilo o que não quer. Afinal, saber aquilo o que se quer é um tanto complexo demais. Não quero mais cotoveladas em vagões lotados do metrô. Não quero mais caminhar sob o sol causticante, pisando o asfalto escaldante da cidade de São Paulo. Sinto vontade de atirar longe o celular, ficar temporariamente fora de serviço. Andar descalça, sem maquiagem, a raiz dos cabelos um tantinho crescida e sem tintura. E rir de mim, por mim e pra mim, sem prazo, sem cobranças, sem dia e sem hora, apenas escrevendo textos que jamais saberei se alguém irá ler.
Vontade de correr pro colo da minha avó. Perguntar a ela se jururu é doce ou salgado? Se tapioca é a mesma coisa que sorumbático e depois ganhar um beijo, desses que só mesmo as mães de alma sabem ofertar.
Tristonhas melancias, o tempo passa, o colo seguro se vai, restou apenas a lembrança melancólica, com aroma de balinha de alcaçuz, que juntas saboreávamos em total cumplicidade. Saudade!

Deve existir no Céu algum setor especial, com nuvens de algodão doce e aroma de alcaçuz. Lá estão as avós que se transformaram em estrelinhas. Este texto carregado de saudade é pra você, Vó. 





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