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Apresentação

Este blog nasceu no blog Janela das Loucas, onde assinava "Diva Latívia". Ali permaneci durante muito tempo, como autora principal das crônicas do blog. Redescobri que escrever é vital pra mim, guiada e editada por Abílio Manoel, cantor, compositor, cineasta e meu querido amigo. O Janela das Loucas não existe mais, Abílio foi embora pro Céu. Escrevo porque tenho esse dom divino, mas devo ao Abílio este blog, devo ao Abílio a saudade que me acompanha diariamente. Fiz e faço deste blog uma homenagem a aquele que se tornou meu irmão, de alma e coração. Aqui o tema é variado: cotidiano, relacionamentos e comportamento, em prosa e versos.







29 de jun. de 2012

O BANHO DE TINA


Que delícia refrescar-se em dias quentes! Vale quase tudo: mar, rio, cachoeira, represa, piscina, ar condicionado, ventilador, leque e até mesmo tina d´água.  Esperem! Tina d´água? Pois é. A Deuzinete não perdeu a chance de experimentar a água friazinha da tina d´água.
Família tem de tudo. Família tradicional, à moda antiga, tem costumes enraizados que, vez ou outra, desafiam o passar do tempo. O almoço da família da Dona Judite, patroa da Deuzinete, foi pra lá de tradicional. Enquanto a mulherada cozinhava e fofocava, os homens jogavam conversa fora e bebericavam cachaça, a tal da água que passarinho não bebe. Reunidos em uma mesa, lá estavam o avô, os tios avôs, o pai, os filhos homens, os primos, os irmãos, sobrinhos e marido da Dona Judite.
O calor parecia uma fornalha. O fogão à lenha teimava em piorar a situação. Feijão tropeiro, cordeiro, arroz branquinho e soltinho. Deuzinete suava em bicas. A chance de refrigerar a situação aconteceu quando a patroa pediu algo simples: - Pegue pra mim aqueles panos de prato com biquinho de crochê.
Bem que a Deuzinete foi  procurar os tais panos de prato, mas o suor escorria pela cabeça, percorria a nuca, desafiava a barreira de suas sobrancelhas. Pensou até no inferno! Eis que, pelo caminho, no quintal, deu de cara com a tina d´água. Não se fez de rogada. Primeiro, colocou a pontinha dos pés. Depois, recolheu a saia e molhou-se até à altura dos joelhos. Molhou o rosto, os braços. Não resistiu e sentou-se na tina. Chegou a esquecer da hora, totalmente envolvida com o frescor.
Praticamente despertou com a voz da patroa: - Deuzinete, cadê você?
Tentou levantar-se, mas parecia presa. Mexeu uma perna com dificuldade, a outra perna estava dobrada e encaixada de modo justo no recipiente. Forçou sua saída com os braços. Uma tentativa, duas, dez, vinte. Nem se lembrava como entrou naquilo, a coisa parecia tão apertada! Deuzinete estava entalada na tina d´água!
- Deuzinete, onde você está?
Pensou em mergulhar, pra se esconder. O corpo escorregou pra baixo alguns milímetros. Notou que o braço esquerdo também estava preso. Começou a chorar.
- Deuzinete, cadê meus panos?
Não tinha jeito. Pediu socorro: - SOCORROOOOOOOOOOOOOOOOOOOO!!!!
Chegaram para socorrê-la: a patroa, o avô da patroa, o pai da patroa, os filhos homens da patroa,  os primos da patroa, os irmãos da patroa, os sobrinhos da patroa e o marido da Dona Judite!
Explicações inexplicáveis, não havia muito o que explicar! Era caso de entalamento, se ela voltasse a se mexer, o certo mesmo seria chamar os bombeiros. 
– Deuzinete, estica a perna! 
– Deuzinete, levanta o braço! 
– Vem pra direita! 
– Volta pra esquerda. 
Por fim, a Deuzinete desentalou da tina d´água! Ao levantar-se, ainda meio torta e atordoada, só não foi aplaudida pelo bando de homens da família da Dona Judite porque a dita cuja era brava até demais! Deuzinete, vestida com uma camiseta branca, justa e molhada estava,  por assim dizer, pelada! Dava pra ver quase tudo, menos aquilo o que só mesmo um raio X é capaz de mostrar.  Fresquinha, literalmente!
Dizem que, pra fazer sucesso, basta passar de calça jeans fit, agarradinha, em frente a uma obra. Qual o quê! Deuzinete não precisou de nada disso. A camisetinha branca, com propaganda do mercadinho “Só Compre Aqui “ arrasou com a “homarada”!
Esse foi o último dia de trabalho da Deuzinete na casa da Dona Judite. Foi demitida sem justa causa. Injusto, talvez, mas segundo a Dona Judite isso aconteceu por uma boa causa. E só de pensar que tudo o que a Deuzinete queria era se refrescar, dá dó!

Em homenagem ao meu saudoso amigo, editor e webmaster, Abílio Manoel. 


28 de jun. de 2012

ABÍLIO MANOEL, DOIS ANOS SEM VOCÊ...

Há tantos sábios dizeres populares. Volta e meia derramo algum dito popular em meus textos. Porém, há um desses sábios dizeres que considero verdadeiro, simples e objetivo: "quem não entende um simples olhar, não entenderá um longo discurso".
Sou absoluta e absurdamente discursiva. A palavra tem o poder de persuadir, cativar, magoar, encantar. Tantos sentimentos podem conter simples palavras! O olhar diz tudo sem ao menos ser proferida uma única palavra. Para bom entendedor, uma só olhadinha já basta.
E era assim o meu relacionamento com o Abílio Manoel, que não precisava escrever muitas palavras, falar muitas coisas, explicar nada. Empatia, identidade de almas, isso tínhamos tanto que nos tornamos mais que amigos, nós dois éramos irmãos com DNA diferente. Irmãos de coração!
A vida bate forte, bate de frente, às vezes consegue apunhalar pelas costas. Um dia, Abílio partiu repentinamente rumo ao infinito. Ele nos deixou, rumo às estrelas. Abílio me deixou, levado pela tão temerosa morte.
A amizade é rara, nem sempre todos aqueles que chamamos de amigos conseguem honrar esse laço afetivo. E eu sou amiga do Abílio, esteja esse meu amado irmão onde estiver agora.
Sinto saudade, às vezes choro quietinha pra que ninguém repare nas minhas lágrimas tristes. Fiquei muito mais ímpar, mais solitária, menos sorridente e brincalhona. Doeu e dói constantemente essa ausência inexplicável.
A vida não para, não sossega, o sol nasce e se esconde indiferente à dor humana. E eu sigo meus dias, de cabeça erguida, escrevendo textos no blog que ele me deu de presente. Mas, eu sei o quanto machuca a saudade de alguém que foi embora inerte, de modo inesperado, que não voltou de uma viagem breve, que se despediu dizendo até amanhã. Pra nunca mais, ou pra quem sabe um dia, na tal eternidade.

Abílio, dois anos longe e eu não aprendi ainda a conviver com a nossa despedida forçada. Um dia, meu querido irmãozinho, nós dois haveremos de nos reencontrar.

Cláudia ( Diva Latívia)

Deixo aqui um vídeo que, casualmente, encontrei no Youtube. Um admirador do trabalho do Abílio gravou esse vídeo. Catavento, uma das músicas do Abílio que mais gosto. 







27 de jun. de 2012

MARCAS DO QUE FICOU


Estava dentro do ônibus, rumo ao trabalho. Incrível, consegui um assento na janelinha. O dia amanheceu ensolarado, bonito. Pensei em meus afazeres do dia: chegar ao escritório, telefonar para algumas pessoas, escrever e-mails, ir ao banco, almoçar... Fui interrompida com um cutucão no meu braço. – Bárbara!
Ainda aterrissando na realidade, observei uma senhora idosa, olhos muito azuis, cabelos brancos e presos em um coque alinhado. – Desculpe, senhora, não sou a Bárbara.
- Bárbara Germânia! Há quanto tempo não nos encontrávamos!  Lembra de mim? Sou a Zilá!
Comovida, feliz por reencontrar a Bárbara, a senhora segurou firmemente minha mão. – Como estão seus filhos? Como está sua garotinha, a Diva?
A garotinha era eu. Bárbara era minha mãe. A confusão estava instalada. Dar a notícia do falecimento da minha mãe a uma senhora com mais de noventa anos, ou não? Decidi depressa, assumi a personagem.
- Diva está bem, ela se casou.
- Ah, essas mocinhas, elas depressa encontram um príncipe! E seu marido, ele ainda trabalha naquele escritório?
A coisa estava piorando, mais e mais. Meu pai, marido de Dona Bárbara Germânia, faleceu há muitos anos!
- Sim, ele foi promovido... É... Subiu de cargo!
- Que maravilha, Bárbara!
Ela cismou de olhar fixamente pra mim. Fiquei sem saber se virava o rosto pra janela, abaixava a cabeça, ou simplesmente a encarava. Escolhi a última alternativa, sob seu olhar atento.
- Bárbara, você envelheceu tanto!
- Nem tanto, Zilá. Afinal, temos a mesma idade.
- Bárbara, pare de mentir. Você é mais velha que eu 10 anos, sua idade é 83.
Foi assim que entendi que Dona Zilá tinha problema de memória, talvez problema de visão. Uma tremenda confusão.
Cheguei ao centro da cidade, precisei descer do ônibus. Mas, antes deixei meu cartão com Dona Zilá e expliquei que era o cartão de minha filha, Diva, que ela poderia telefonar sempre que quisesse conversar.
Dois dias depois recebi uma ligação, era a Dona Zilá. Queria me pedir o telefone de Bárbara. Enrolei, desconversei.  Disse que minha mãe e meu pai tinham viajado pra longe e que eu não sabia dizer quando voltariam.De vez em quando uma mentirinha do bem não faz mal a ninguém. Melhor deixar Dona Zilá em seu  mundinho, com suas ideias um tanto embaralhadas, sua inocência.
Encontrei no álbum de fotografias de minha mãe uma foto em preto e branco muito antiga, já amarelada pelo tempo. Dona Zilá ainda jovem, ao lado de minha avó. Creio, as duas deveriam ter quinze anos de idade, no máximo. Felizes, sorridentes, cabelos encaracolados.  Pensei na vida. Na vida de Dona Zilá, na vida de minha avó, na vida de minha mãe. Pensei na minha vida.


22 de jun. de 2012

A SURDEZ MASCULINA


Bem que eu o avisei: - Divo, esse frasquinho de remédio sobre a prateleira da cozinha é o remédio pra verme do cachorro.
Ah, esses homens! Eles escutam a primeira frase que a gente diz, isso quando estão a fim de nos escutar. Porém, Divo estava tão entretido com o jogo de futebol na TV que não deve ter escutado uma única palavra do que eu disse. Anda tão estressado que comprei um vidrinho de floral pra ele, uma tentativa de ajudá-lo a melhorar o astral. O frasquinho tão parecido com o vidrinho de “mata-vermes” do cãozinho!
Sábado sempre é um dia especial. Acordamos cedo, vamos caminhar no parque, depois vamos à feira comprar verduras, legumes, comer pastel e beber caldo de cana. Depois, levamos o cãozinho Bono ao pet shop para tomar banho. Voltamos pra casa felizes, preparamos o almoço juntinhos. Sábado é uma delícia! Mas, aquele sábado não seguiu o script, tudo saiu errado.
Acordamos, fomos caminhar no parque e, lá pela segunda volta ele reclamou que estava com dor de barriga. Voltamos pra casa correndo, literalmente. Pobre Divo, mal deu tempo de entrar no banheiro. E assim foi pelo resto do dia, de meia em meia hora Divo corria pro banheiro. Difícil convencer um homem a ir ao médico. Homens não gostam de hospital, nem de injeção. E quem gosta?
Precisei ir à farmácia comprar fralda geriátrica de tamanho XXL. Divo foi se borrando pelo caminho, tadinho! Fiquei imaginando o que ele teria comido. Teria sido a pizza da noite anterior? Teria sido o leite longa vida? Ah, eu sempre desconfio da água! Em quinze minutos, a fralda cheia e o odor ao redor insuportável, Divo foi chamado. – Senhor Divo Latívio! Segurei sua mão gelada, fria, suada.  O médico era um desses sujeitos baixinhos, que fala tudo rapidinho: - O senhor tem alguma doença? É diabético? É hipertenso? E blábláblá. Escutei outro pum. Putz. Ele, realmente, não conseguia controlar a situação.Foi pro soro.
Fui chamada pelo médico. – Senhora, o que seu marido comeu ontem e hoje. Sorri amarelinho. O sujeito repetiu a pergunta, desta vez seu tom de voz ainda mais grave e irritadinho: - Ele tomou algum medicamento?
Divo não toma remédio, nem mesmo quando o médico prescreve. Claro que não tinha tomado medicamento algum.
- Ele tem sentido algum mal estar ultimamente?
 Divo é saudável, ele agora se tornou adepto dos florais de Bach, toma 10 gotinhas regularmente.  Resolvi contar isso pro doutor baixinho.  Ignorou totalmente a minha informação, achou impossível que floral desse tamanho piriri em alguém.
Divo estava pálido, enjoado e cagado. Resolvi demonstrar minha solidariedade. Respirei fundo antes de entrar no box  do pronto-socorro, onde estava repousando. O cheiro estava de matar! Respirei pela boca, me esforcei para sorrir. – E então, meu bem, está melhorzinho? Ele resmungou qualquer coisa impossível de ser traduzida. – Divo, você tomou algum remédio hoje? – Floral, tomei o vidrinho todo pra me acalmar.
Floral, ainda que alguém beba o vidro todo, não mata, nem envenena, isso disse o médico. Bom saber...
Divo precisou ficar em observação no hospital por 12 horas. Saiu de lá capengando, fraco, irreconhecível. A causa de seu mal-estar foi atribuída a uma virose. Quando a causa da doença é desconhecida ela se transforma em virose.
Domingo, a gente sempre acorda mais tarde, depois vamos à casa de nossos parentes. Acordei ainda sonolenta, o cãozinho Bono feliz e faminto. Lembrei que, devido à confusão da véspera, não tinha lhe dado o vermífugo. Procurei o frasquinho, não estava no mesmo lugar. Procurei e procurei, eis que o encontrei sobre a mesa da sala de jantar: vazio.
Pude então entender que Divo havia tomado o vermífugo do cachorro. Eis a explicação!
Decidi não contar a ele o que aconteceu. Melhor assim! Ah, esses homens. Tivesse eu falado qualquer coisa sobre a bunda da Juliana Paes, sobre a queda das ações na bolsa de valores, sobre a Taça Libertadores, ou sobre um modelo moderno de automóvel, ele teria escutado tudinho.  Fazer o quê?


20 de jun. de 2012

INVENTARIANDO


Com todo respeito aos que portam o DNA semelhante ao meu, quando alguém quiser rogar uma praga em outrem, deseje-lhe que se transforme em ... Sapo? Não! Nada disso. Deseje-lhe que... Engorde! Também não. Tudo isso é pouco, muito pouco. Uma praga bem rogada é desejar que essa pessoa se transforme em inventariante!
Inventariante nada mais é do que  o representante do espólio de um finado alguém. É ele quem responde pela prestação de contas do patrimônio do de cujus. Pobre mamãe, virou “de cuja”. 
É o inventariante quem assina documentos, quem providencia outros tantos papéis. Quem enfrenta: filas, trânsito, carimbos, xérox, assinaturas, conversa com advogado, cara feia, mau-humor, quem consulta na internet todo o santo dia como vai o paralisado andamento processual. 
Inventariante, aquele autêntico, se pega com os santos, faz promessa,  acende velas, aprende a rezar o terço bizantino, começa a falar sozinho, ganha imensas olheiras, perde o sono e, quiçá, o juízo. Estou no final dessa etapa, afinal o meu juízo anda capenga.
Em suma, eu sou inventariante. Perder a mãe é terrível e, quem diria, depois de todas as lágrimas que chorei, recebi essa incumbência nobre, digna de me fazer resolver mudar em breve pra roça, um lugar sem telefone, sem televisão, computador, ficar incomunicável, papeando com grilos, galinhas, pererecas e muriçocas. As formigas, ainda bem, me compreendem!
Quantos anos demora a conclusão de um inventário, ainda que consensual? Sei lá!  É coisa a perder de vista. Tudo o que sei é que sinto saudade da minha infância, quando o aroma de papéis do escritório de advocacia do meu avô parecia delicioso. Mal sabia eu que, um dia, teria alergia à poeira fininha emanada dessa papelada. Bons tempos que jamais voltarão.
Por essas e outras, encontro meu ponto de equilíbrio no toque do teclado, nos textos que escrevo, no olhar sapeca do cãozinho Bono Latívio, no abraço carinhoso de Divo. Lá fora do meu mundo tudo parece frio e cinzento. Ser inventariante é gélido, burocrático, formal. Isso sim, não é nada normal.
Que o futuro seja breve, com seus registros, suas formalidades e resoluções. A essa altura, qualquer "teje dito" já estava bom. Fartei de tamanha complicação! Fico a imaginar o que fiz pra merecer essa missão! Ah, já sei:  na infância furtei docinhos ( bananinhas) da despensa de minha casa, não deixei uma só pro resto da turma. O castigo veio a cavalo, ou melhor, a passos de tartaruga. E eis que me transformei em um bicho esquisito, insone e que resmunga coisas ininteligíveis: eu, inventariante.



15 de jun. de 2012

AH, A SAUDADE...


Ah, a saudade. Ela se incorpora à alma da gente, embebe nossos sentidos e nos entorpece. A distância estanca as horas, paralisa o tempo. As lembranças, feito migalhas, abrem e fecham  feridas. Cicatrizes.
Ah, a saudade. Seremos senhores dessa senhora? Ou será que a ela pertencemos? Escravos de recordações que se distanciam, mais e mais. Prisioneiros de sentimentos doloridos, revividos desesperadamente, para que não se percam. Rostos que mais e mais se dissipam nas lembranças, descorados em fotografias amareladas. Ausência.
Ah, a saudade. Sobras de presença, vestígios deixados em objetos guardados, em músicas que insistem em tocar. E os dias chegam, passam, vão embora. O amanhecer finge ignorar a súplica de quem restou. Memórias.
O coração se parte em mil pedaços quando alguém se vai, seja pra vida, ou pra morte. Adeus, essa palavra não deveria existir. Saudade, ela deveria ser temporária, jamais eterna.  Ah, a saudade...

Aos meus parentes e amigos que partiram rumo ao Céu. 

14 de jun. de 2012

DIVA, A VIP!


VIP , que palavra esquisita! Very important people. Ah, eu sou uma pessoa muito importante, ao menos pra meia-dúzia de seres humanos e pra um cãozinho.
Recebi ontem uma mensagem de texto no meu celular que avisava: “você, que é cliente VIP da nossa loja, venha aproveitar a nossa promoção com preços até 50% off, não perca! “. Que mulher resistiria a uma mega liquidação em sua butique favorita? A minha reação foi simples assim: disfarcei a emoção, afinal Divo é bondoso, porém um tanto... contido com valores e despesas. Disfarcei bem, mas após 12 horas, quando o dia de hoje amanheceu, de modo dissimulado eu disse ao meu marido: - Benhê, eu hoje irei ao shopping, preciso comprar UMA calça. Ele acreditou em mim. Nesse ponto a minha consciência dói absurdamente. Divo me deu uma carona até a porta do shopping e eu, quando entrei na loja, parece que entrei em transe. Provei todas as peças de roupas, experimentei vestidos, casacos e blusas. Claro, experimentei calças também!
Três horas depois, ainda dentro da loja, chegou o difícil momento de pagar a conta. – A senhora aceita “uma água”? Chá? Café? Gostaria de sentar?
A gerente da loja somava o preço das roupas, seus olhos pareciam brilhar. – Por que não leva também aquela jaqueta de couro vermelha? E aquelas botas? A bolsa também está na promoção!
Que difícil resistir a tantas ofertas! Precisei me conter, uma das calças jeans eu não comprei! Quis provar a mim mesma que sou capaz de resistir a tentações mundanas, que sei administrar meus gastos, que prezo meu patrimônio. Paguei uma conta de quatro dígitos, mas pensei nas consequências. Divo acharia lindo me ver tão bem vestida, mas detestaria saber o quanto tudo aquilo custou.
Quatro sacolas, das grandes, lotadas de roupas de grife. – A senhora quer que a gente leve as compras até seu carro? E lá fui eu, parecendo madame, conduzida por uma vendedora da loja. Coitadinha, quatro sacolas é coisa demais. Recusou-se a me entregar ao menos uma das sacolas, quis levar tudo sozinha.
Vim pra casa pensando no que dizer a Divo Latívio. Ensaiei pelo caminho todinho: - “Benhê, as peças estavam 70% off... Sabe esta blusinha? Ganhei de brinde! Eu gastei menos da metade do preço que pagaram as clientes que não são VIPs!”.
Entrei em casa, encontrei Divo sentado na sala. Sisudo. Eu, com quatro sacolas, comecei a gaguejar. Bono, o cãozinho, pulava feliz para me receber. – Oi, Divo, demorei? Divo sequer olhou pra mim. – Diva, você esqueceu em casa o seu celular. – Oh, meu amor! Você quis falar comigo? – Não, mas chegou mensagem de texto pra você. 
Olhei a mensagem no meu celular. A operadora do cartão de crédito avisando que eu tinha gastado XXXX naquela butique e, se por acaso eu não reconhecesse essa compra, por gentileza entrasse em contato com a central de atendimento aos clientes.
- Divo, você leu a mensagem?
- Li!  
E foi assim que nem precisei interpretar aquilo o que eu havia ensaiado. Divo sabia o quanto eu tinha gastado, ele leu a mensagem de texto. Tudo culpa minha, que esqueço o celular em casa direto e reto.
Mulheres gostam de se vestir bem. Mulheres gostam de se vestir melhor que as demais mulheres. Mulheres não gostam de repetir roupas. Mulheres gostam de se sentir lindas, gostosas e poderosas quando vestem suas roupas novas. Mulheres gostam de ser elogiadas por seus namorados e maridos. Mulheres ficam mais felizes quando compram roupas novas!
Ora, ora, ora. Eu trabalho e pago minhas contas em dia. Preciso me vestir bem! Divo continua me olhando meio zangado. Mas, deixem chegar a oportunidade de eu vestir aquele vestidinho lindo que comprei, ele não vai resistir. Vai me achar a última bolachinha do pacote. Ou será o último bis da caixinha? Ah, tanto faz. O que sei é que ele vai adorar!
A vida é breve. Entre fazer terapia e comprar roupas, escolhi a segunda opção, afinal eu sou VIP!

13 de jun. de 2012

ORAÇÃO DE SANTO ANTÔNIO CASAMENTEIRO

Ontem foi o Dia dos Namorados. Quem não comemorou, por estar sozinha, ou sozinho, hoje tem a oportunidade de pedir socorro ao santinho casamenteiro: Santo Antônio.
Há alguns anos minha mãe, que era católica, me deu um santinho, desses impressos em papel fininho. A estampa da imagem de Santo Antônio em uma face do papel e, do outro lado uma oração, que prometia o milagre de encontrar um marido.Ah, as mães de antigamente! Minha Mami se preocupava com minha solidão.
Guardei o santinho dentro da minha carteira e, por assim dizer, ali eu o esqueci. Os anos passaram, tentei encontrar um bom par, mas pra quem está sozinho o mar de possibilidades traz muito mais pneus velhos, botas furadas, penicos enferrujados, do que peixes e sereias. Enfim, não encontrei quem eu procurava, apesar das minhas tentativas. Um dia, finalmente, conheci Divo Latívio.
Deixo aqui a oração, com o meu agradecimento ao santinho.Não é preciso seguir uma religião, mas acreditar que o Amor existe e que o seu par também está por aí, te procurando. E foi isso o que eu fiz! Segue abaixo a oração de Santo Antônio. Boa sorte, afinal encontrar o amor da vida da gente é possível, tenho Divo pra provar isso!

                                         
                                                  ORAÇÃO DE SANTO ANTÔNIO


Santo Antônio, eu sei que o casamento é uma vocação abençoada por Deus. É o sacramento do amor, comparado ao amor que Cristo tem para com a Igreja.Eu me sinto chamada para o casamento: por isto, Santo Antônio, ajuda-me a encontrar um namorado bom, amável, sério e sincero, que tenha os mesmos sentimentos de afeto que eu sinto. Faze que nos completemos um ao outro e formemos uma união abençoada por Deus, para que nós dois, juntos, sejamos capazes de vencer possíveis problemas familiares e conservemos sempre vivo o nosso amor, para que nunca falte a compreensão e a harmonia familiar.Santo Antônio, abençoa-nos a mim e ao meu namorado; acompanha-nos até o altar e conserva-nos unidos pelo resto da nossa vida.Santo Antônio, rogai por nós.









10 de jun. de 2012

FELIZ DIA DOS NAMORADOS!


Dia dos namorados. Dia daqueles que se conheceram na festa, na balada, na escola, na faculdade, naquele curso, na rua, na academia, no parque, no supermercado, na casa do(a) amigo(a), na viagem, no metrô, no ônibus, no trabalho, na livraria... E, ops! Eis uma boa desculpa para dar, quando alguém pergunta: ”onde vocês dois se conheceram”?
Ah, conhecer alguém na internet é a coisa mais moderna e normal deste mundo cibernético! Mas, como explicar isso pra mãe, pro pai, pros avós, pra tia? Na livraria... Isso dá um toque intelectual a qualquer tecladinha feliz!
Tem gente que se conhece por acaso. Por acaso é um jeito excelente de conhecer o par! Por exemplo: por acaso, eu estava com dor de cabeça, fui à farmácia e ele era quem?  O farmacêutico! Por acaso, eu dei de cara com ele (a) e me apaixonei assim, sem mais, nem menos. Onde? No pet shop! Na igreja! No danado do trânsito!
Namorar é mais doce que rapadura. Por falar em rapadura, o amor é isso mesmo: doce, mas a vida é mesmo dura. Não é fácil namorar. Quem namora se apaixona, ou não. Quem namora casa, ou não. Sorte, talvez. Namorar só é bom, pra valer, quando o fogo da paixão é correspondido,  e quando o “pra sempre” dura muitos e muitos anos.  
Paixão combina com namoro. Namoro combina com beijos. Beijos combinam com flores. E de flores e amores, assim é feita a vida.
Tanto faz o estado civil, se os namorados ainda não casaram, se não pretendem se casar, ou se um dia irão se casar. Não importa se são noivos, ou se casaram faz pouco, ou muito tempo.  Coisa boa que é casar e continuar namorando! Namorar é estado de alma! Tem coisa mais gostosa que  sentir aquele friozinho na barriga, o coração acelerado, que sonhar acordado(a)? Namorar não requer idade, estatura, cor de pele, sexo ou nacionalidade!  Que o amor se faça em prosa, em versos!
Este texto foi escrito ao lado de Divo, vestido com seu pijama, distraído. Ele é meu marido, é um desafio sermos namorados. Escrevi lembrando dos meus pais, que namoravam, apesar de tantos problemas em seu relacionamento. Escrevi pensando nos meus irmãos, vitoriosos em seus casamentos. Mas, especialmente, escrevi pra você, que lê minhas histórias. FELIZ DIA DOS NAMORADOS!


5 de jun. de 2012

60.000 ( SESSENTA MIL VISITAS)


Sessenta mil. 60 mil. 60.000! Nós chegamos hoje a essa marca, um número de visitantes considerável e realista, sem maquiagem, sem aumento de um só numeral na contagem.
A cada marca redondinha eu deixo aqui a homenagem ao meu incentivador, o criador de Diva Latívia. Meu saudoso amigo Abílio Manoel. Que chegue ao Céu o meu beijo, o meu abraço, o meu carinho, tão bonitos e especiais quanto  é a nossa amizade, que é eterna.
Leitor, obrigada! Minha inspiração é alimentada pelo seu regresso neste espaço. Minha felicidade passa por este mundinho cibernético. Sua presença é fundamental para que eu, mais e mais, escreva tudo o que você gosta de ler.
Um abraço, 
Diva Latívia

PIRATEADA


Dedo mindinho, seu vizinho, maior de todos, fura-bolo e cata piolho. Cadê a letrinha que eu queria digitar aqui? O gato comeu! O teclado parecia morto, ou desmaiado.Notebook, meu filho! O que há com você?
Hoje, sem aviso prévio, sem qualquer sinal de cansaço, febre, ou tosse, um mal súbito vitimou a minha máquina, aquela que tanto me serve  e que me conduz pelos mares bravios da internet.
Notebook não tem mouse. Notebook tem bateria. Notebook, oh notebook!  O que fazer sem meu instrumento de trabalho e brinquedinho favorito? Corri pro celular, um smartphone. Baixei os e-mails, tentei acessar o Facebook, bisbilhotei o número de visitantes do meu blog. Insatisfeita, resolvi pedir socorro ao técnico do computador. Diagnóstico: - Dona Diva, a senhora executou algum programa? – Meu filho, eu já não saio de casa faz tempo. – Não, senhora,  eu acho que não compreendeu minha pergunta: a senhora baixou algum arquivo no seu computador?
Baixar arquivos. Lembrei que o antivírus fez uma pergunta a respeito de eu ter, ou não ter certeza de querer executar um programa. Vírus! Um pirata invadiu esta embarcação, capturou algumas senhas, desvendou segredos guardados em pastas. Terá visto minha foto usando biquíni? Terá lido os textos de Diva Latívia? Terá chorado de pena, ao ver meu saldo bancário?
O problema foi corrigido em poucos instantes. Antivírus atualizado, limpeza de disco e outros procedimentos necessários foram feitos. Senhas foram alteradas. Que chato,  Mr. Hacker!  Você teve tanto trabalho para invadir a minha praia, e eu te flagrei fuçando minha gaveta de calcinhas, digo, meus arquivos pessoais.
Cá estou novamente. Persistente, de pantufinhas nos pés, bebericando vinho tinto. Cá estou a exercitar um dos maiores prazeres da minha vida: navegar, digitar ideias, publicar histórias. Eu e meu notebook, nas ondas deste mar.



2 de jun. de 2012

OH, CUPIDO!


O cúmulo da distração é cair dentro do lago do parque, ao se afastar dois passinhos para tirar uma fotografia. Todo primeiro encontro deveria ser perfeito, mas a vida real não tem ensaios, tudo é improvisado e inclemente. Aconteceu, já era.
Zé Antônio conheceu Maria do Sol no forró. Baile bom aquele! A morena dançou a noite toda, o suor dos dois misturado na mais perfeita química e, não fosse o adiantado da hora, Zé não teria ido embora.
O único dia de folga do Zé era o domingo, quando largava o caixa da loja de tecidos, onde trabalhava dez horas diárias, e voltava pro quartinho alugado na pensão. Maria do Sol era manicure do salão de beleza de uma dona que falava enrolado. Do Sol, como gostava de ser chamada, não sabia se a patroa era japonesa, ou italiana.
O encontro no parque foi combinado pelo celular. Zé caprichou na colônia após barba e no desodorante. Escolheu a melhor camisa, calça social e tênis que comprou em dez suaves prestações. Do Sol vestiu  um shortinho curto, da moda, aquele tecido com lycra.  A blusa com seu umbiguinho de fora. Seus pés calçados nas botas de salto alto, que achou lindas. Isso tudo parecido com o visual daquela personagem de novela .
O primeiro beijo teve sabor de algodão doce, comprado na barraquinha do moço que não tirava os olhos dos pernões de Do Sol. A ideia da foto foi do Zé, que sonhava em mostrar na loja onde trabalhava a formosura da morena, seu troféu de “pegador”. Já imaginava a inveja que os colegas do trabalho sentiriam de sua “irresistível pessoa”.
- Vai, bem, vai mais pra direita!
Esses celulares modernos, adquiridos nos grandes magazines, tiram fotos quase tão boas quanto as melhores câmeras fotográficas digitais. Zé comprou uma dessas com seu décimo-terceiro salário. Caprichou no ângulo, tratou de enquadrar as pernas de Do Sol na foto.
- Isso, linda, mais pra trás. Só mais um pouquinho. Legal, dá pra ver os patos nadando na água. Só mais um passinho. Aí!
E foi assim que, de modo estabanado, ela deu dois passos, ao invés de só mais um passinho. Do Sol não sabia nadar, nem o Zé. Quem salvou nossa personagem  das águas profundas do lago, foi o vendedor de algodão doce,  aquele dos olhos compridos, um tal de Edinaldo. Fez respiração boca a boca, agarrou os peitos da Do Sol, jurando que era massagem cardíaca. Zé se sentiu um corno.
A confusão começou quando Zé descobriu que a Do Sol tinha bebido muita água do lago, mas estava lúcida e nada afogada. De safada a mulher à toa, proferiu diversos desaforos. Deixou Do Sol falando sozinha e foi embora, resmungando que “mulher é bicho que não presta”.
Do Sol mudou pra casa do Edinaldo uma semana depois. Tudo muito rápido e intenso, com incontáveis e quentes reprises da cena dos primeiros socorros proferidos pelo Zé.  Aconteceram muitos beijos, mais doces que algodão doce, patrocinados por Cupido, aquele que mira a flecha sem mandar o menor aviso.

1 de jun. de 2012

KKKKKKKKKKKKK!!!


Não sei de onde vem essa minha vontade de rir de tudo.  Risos que, via internet, expresso assim: KKKKKKK!!! Boba da corte, assim eu sou, esta eu sou.
Recordo-me de tempos idos, quando minha mãe, entendedora de física quântica e astronomia, filosofava longamente a respeito da quinta dimensão, do infinito, e eu, noite adiantada e sonolenta, mudava o assunto e comentava qualquer coisa banal. Puro balde de gelo, que cortava seu raciocínio e a fazia rir ao meu lado. Creio, ela admirava minha  capacidade de transformar qualquer tema em palhaçada.
Diva Latívia, esta que assino, nasceu de parto normal, sem dor, facilmente. Uma piadinha aqui, uma lembrança ali e “voilá”, eis-me aqui! Um blog que brotou entre risos.
Quanto mais séria a situação, mais minha cabeça trabalha a favor da piada. Seja o protagonista um sisudo professor, um motorista desastrado, um parente afastado, ou o amor da minha vida. O mais recente personagem  de minhas histórias está com tosse e seu nome é Bono Latívio, assim chamado, realmente. Um cão! Enquanto digito palavras, distraída, ele rói as minhas pantufas.
Quantos hoje se queixaram que o dia amanheceu frio e nublado? E eu? Eu saí pelas ruas com meu guarda-chuva de bolinhas cor-de-rosa. O pedreiro que trabalha em um edifício em construção, próximo à minha casa, ensaiou um elogio: - Ô, gostosa! E eu? Evidentemente, ri. Gostosa, eu? 51 anos de pura formosura, meu manequim saltou para o tamanho 44, comprei roupas novas e agora a cintura começa a parecer apertada. Enfim, acho que um pintor renascentista seria capaz de se apaixonar por mim à primeira vista. Michelângelo, provavelmente, pintaria um afresco comigo enrolada em algum paninho. Entre suspiros apaixonados, daria à obra um título divinal qualquer. Eu, musa colossal, tanto quanto o tamanho do meu traseiro. Na falta de um pintor renascentista, fui elogiada por um pintor de paredes. Nada mal!
Na volta pra casa, descobri que os dois elevadores do meu prédio estavam parados, um problema de ordem técnica havia ocorrido e demoraria duas horas para o conserto ser concluído. Precisei subir pela escadaria exatamente dezesseis andares. Eu ria a cada novo andar, lembrando a música do “passo do elefantinho”. Quando cheguei ao meu apartamento, sequer tinha forças para abrir a porta. Bono Latívio veio me receber, feliz de tão contente. Divo Latívio olhou-me estupefato. Eu estava suada, desconjuntada, carregava duas sacolas de compras que fiz na quitanda. Eu, frutas, legumes e verduras chegamos em casa sãos e salvos. O abacaxi  e os pés de alface puderam compreender o quanto foi divertido escalar tamanha altura.
Rir é um antídoto poderoso contra vários males. Quem ri espanta pra longe de si uma série de amarguras, maus pensamentos, problemas diversos, e também afasta gente nociva, nefasta. E eu, que rio e faço rir, fiz deste dia mais uma piadinha. Sexta-feira nublada, chuvosa, um tanto friazinha. Bela sexta-feira, dia de desligar o computador, sair do escritório, alcançar a rua, afrouxar a gravata, trocar o tailleur por roupas civis e se divertir, descansar, celebrar a vida.
Escolhi rir. E você?







E OS MEUS CABELOS, QUANTA DIFERENÇA!


Final de semana significa descanso, diversão, mas também significa compras no supermercado, organização da casa, compras no shopping center e ida ao cabeleireiro. Quem já passou dos 40 anos sabe o quanto é desagradável ter uns fiozinhos de cabelo branco. Sem tempo para ir ao salão de beleza, comprei na farmácia tinta de cor aloirada, para retocar a raiz dos meus cabelos. Li atentamente as instruções. Li três vezes, a última em voz alta. Divo, intrigado com o falatório proveniente do banheiro, bateu na porta e perguntou: - Querida, você está passando bem?
Primeiro, coloquei as luvas. Depois, segui passo a passo as instruções da embalagem do produto. Comecei por onde sempre começa minha cabeleireira: a franja. Passei, dando uns toquinhos suaves com o pincel. Maravilha! Fiquei admirada, eu poderia ter nascido esteticista! As primeiras mechas de cabelo consegui tingir facilmente. Começou então o problema. Eu não podia enxergar a parte de trás da cabeça. Conforme ia pincelando os cabelos por mim não visualizados, uma mecha melecada de tinta esbarrava em outra. Grande lambança. Eu tinha sujado de tinta a minha testa, as orelhas, o nariz, o pescoço. Tingi duas toalhas de rosto. Por fim, o trabalho pareceu terminado.  Removi as luvas das mãos, sentei no vaso sanitário olhando pro meu relógio de pulso, também respingado de tinta.
Meia hora. Lembrei que, a essa altura do campeonato, a cabeleireira fazia uma leve massagem na raiz dos meus cabelos. Meleca, meleca... Esperei mais dez minutos e fui pro chuveiro.  A tinta escorria inclemente pelo meu corpo e se derramava amarelada sobre o piso do box. O tapetinho antiderrapante foi mudando de cor, de incolor tornou-se amarronzado. Nada que fazer a respeito, então continuei a enxaguar os cabelos. Depois, shampoo caprichado. A seguir, condicionador com fartura. Saí orgulhosa do chuveiro e fui até o espelho me admirar. Gritei: - SOCORRO!!!!! Divo, que antes imaginou que eu estivesse passando mal, desta vez suspeitou que eu tivesse me acidentado. Entrou no banheiro sem bater. – Nossa, Diva! O que você fez???
Meus cabelos estavam verdes, tão esverdeados quanto  um maço de salsinha, agrião ou rúcula. Sem saber o que fazer, comecei a chorar. Lembrei de Medusa, lembrei da mula sem cabeça, lembrei do quanto meus cabelos eram lindos, antes de passar aquela tinta. Divo começou a rir. Meu olhos estavam avermelhados, meus cabelos  estavam esverdeados. Se eu sorrisse amarelo poderia ser colocada em algum cruzamento de ruas, poderia substituir um semáforo.
Telefonei para minha cabeleireira, ainda soluçando. Ela falou em tom triunfal, como quem diz: "bem feito, quem mandou dispensar meus serviços?". Agendei um horário. Pra sair de casa, coloquei um boné. Para disfarçar meus olhos inchados de tanto chorar, passei corretivo ao redor dos olhos e  coloquei óculos escuros. Eu me sentia monstruosa!
Entrei no salão da cabeleireira,  ali uma dúzia de clientes fixou os olhos em mim, bem na direção de toda a verdura que emoldurava meu rosto. Precisei tingir meus cabelos de um tom castanho, muito escuro. Deixei de ser loira, mas também deixei de me parecer com um ingrediente de salada. 
Semana que vem tentarei fazer luzes, para clarear minhas madeixas. Quem vai fazer as luzes pra mim? Acho que é muito simples, observei minha cabeleireira fazer. Basta usar o produto correto e obedecer o tempo exato de ação do produto. Creio, será fácil, por isso eu mesma farei as luzes em mim!