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Apresentação

Este blog nasceu no blog Janela das Loucas, onde assinava "Diva Latívia". Ali permaneci durante muito tempo, como autora principal das crônicas do blog. Redescobri que escrever é vital pra mim, guiada e editada por Abílio Manoel, cantor, compositor, cineasta e meu querido amigo. O Janela das Loucas não existe mais, Abílio foi embora pro Céu. Escrevo porque tenho esse dom divino, mas devo ao Abílio este blog, devo ao Abílio a saudade que me acompanha diariamente. Fiz e faço deste blog uma homenagem a aquele que se tornou meu irmão, de alma e coração. Aqui o tema é variado: cotidiano, relacionamentos e comportamento, em prosa e versos.







29 de jun. de 2014

SAUDADE EM SI ( Para Abílio Manoel)

Saudade em si,
Claves, letras, céu.
Lá, nuvens que fazem nó.
Fá, som ao redor.
Sem ti é tudo dó.
Som, som, som.
Sua voz, música entoada sem ti.
Ré, melodia que te faz aqui.
Canção dentro de mim.
Nosso elo, dó, dó, dói sem ti!
Mi, mi, mi.
Sol, saudade em si.
Mi, saudade em mim.

(É pra você, Abílio. Fique em paz aí no céu e vá pensando no que vamos aprontar juntos na próxima vida. 
Saudade!).

27 de jun. de 2014

ABÍLIO MANOEL ( MANINHO, SINTO MUITA SAUDADE)


Abílio Manoel, meu irmão,
Quatro anos longe de suas maluquices, piadas, implicâncias e ideias sensacionais, isso é tanto tempo que parece uma eternidade.
Te amo, mano, e espero que minhas palavras todas fiquem escritas entre as estrelas, pra que você as leia e me devolva o afeto em formato de inspiração.

Diva Latívia ( Cláudia)




Abilio Manoel era cantor, compositor, escritor, cineasta e meu amigo muito amado. Alguém que fez grande sucesso na década de 70, ganhou festivais (o samba rock deve bastante a esse garoto). Tem uma música que ele compôs que, de modo interessante, eu aprendi na escola quando era criança. Algo que, talvez, meu leitor, minha leitora também conheça. Não é a canção que prefiro, mas é simples e muito conhecida. Bom Dia, Amigo!










25 de jun. de 2014

A MULHER INVISÍVEL

Era cedo quando o marido passou por ela, carrancudo e apressado, estava de saída para o trabalho. Fez festinha pro cachorro e foi da cozinha para a sala. Passou pertinho sem se despedir dela, que ainda tinha os olhos inchados da noite mal dormida.
A xícara de café esquecida, a esfriar sobre a mesa. O noticiário ainda não lido na página da internet. Estava de cara lavada, cabelos presos em um coque displicente, um visual que espelhava a sua alma. Seu olhar o seguiu discretamente.
Assim que escutou o barulho da porta da entrada fechar, o som da chave a girar na fechadura, ela concluiu: - Eu sou a mulher invisível!

VIUVEZ

O mundo pareceu acabar quando morreu Matilde, esposa mais do que perfeita. A princípio, o viúvo Agenor tramou matar-se 
Quando o elétrico da linha 367 se aproximou, conteve o impulso suicida, embarcou no ônibus e desceu no ponto final. Caminhou trinta metros e esbarrou no cartaz da escola de dança de salão.  
Primeira aula: dois pra lá, dois pra cá. Encontrou Doralice, morena de meia-idade. Ao som do bolero abandonou o luto. 

24 de jun. de 2014

A PALAVRA "DESTINO"

Quando eu era criança, apesar da insistência familiar para que eu pronunciasse corretamente as palavras, havia um substantivo abstrato que eu confundia. A palavra “destino” eu trocava pela palavra “intestino”. O meu “intestino” deveria ser de conto de fadas. Não é à toa que o final de algumas de minhas histórias nunca cheirou muito bem.
Intestino, quando solto, é uma tragédia, quando preso, uma desgraça. Do primeiro beijo ao adeus, do Lactopurga ao Imosec, jamais pude aceitar os reveses do “intestino”.
Até hoje, quando algo foge do meu controle, a barriga dói e a fada madrinha desaparece. A carruagem se transforma em abóbora, mistérios intestinais. Miséria do destino.
Não que a vida não cheire muito bem, mas é incrível a estranha coincidência. Sorte (ou falta de), tudo no final se transforma em texto, alguns escritos com batom em papel higiênico, emergência criativa.
Desídias, disenterias, pra isso não há purgante, ou antidiarreico que resolva. Desculpem a história, veio de minhas entranhas: o meu “intestino” não anda lá muito bem. Coisa do destino!

20 de jun. de 2014

O AMOR EM TEMPOS DE COPA DO MUNDO

Os dois estavam sentados no sofá da sala. Assistiam no televisor a uma partida de futebol. Ela entediada e ele muito interessado no jogo.
- Querido, estive pensando, vamos  comprar passagens para Paris? Melhor parcelarmos em seis vezes no cartão de crédito. O que você acha se eu pedir pra sua irmã emprestado aquele casaco? No Duty Free tem umas coisas que eu gostaria de comprar. Que tal trazermos presentinhos pra todos? Sabe como está o câmbio? Precisamos de euros.
- Pô! É falta, marca aí juiz!
- Querido, vamos comprar um novo jogo de malas?
- Quem? Apita aí juiz!
- Vou telefonar pra sua irmã e pedir também as botas emprestadas.
- Expulsa esse cara, juiz!
- Que legal, ela me emprestou também as luvas!
- Juiz ladrão!
- Vou entrar no site da agência de viagens, o que acha melhor, comprarmos no seu cartão ou no meu?
- Dá o cartão pra ele!
- Tudo bem, no seu cartão.
- Em seis parcelas?
- Dá o cartão pra esses dois, juiz!
- Só duas parcelas? Você quem sabe, querido!
- Isso mesmo, dá mais cinco minutos aí.
- Agora já era, amor, finalizei a compra, em duas parcelas.

Apita o árbitro, final de primeiro tempo no Maracanã.

- Você falou alguma coisa, Milene?
- Oui! Je suis très feliz!
- Pega lá uma cervejinha pra gente, aquela que eu deixei no congelador.
- Nada disso, vou abrir champanhe!
- Prefiro a cerveja!
- Pra gente comemorar!
- Comemorar o que?
- Paris!
- Que Paris?

Começa o segundo tempo do jogo no Maracanã!

- Paris, as passagens que você comprou hoje!
- É pênalti! Marca aí, juiz cego!
- Um brinde, tim, tim!
- Pra fora! Cara ruim de bola!
- Vou comprar perfumes, todos franceses, uh, lá, lá!
- Tá, tudo bem. Leva essas taças de champanhe daqui, traz a cervejinha?
- Faço tudo o que você quiser, mon amour, Paris, Paris, Paris... Vou à casa de câmbio. Levo seus reais, ou os meus?
- Milene, o que você quer que eu faça pra você parar de falar durante o jogo?
- Os reais!
- Pega na minha carteira.
- Oba, já disse hoje o quanto te amo? Vou até a casa de câmbio, volto mais tarde, tá?Au revoir!

- É gol, gol, gol, goooooooooolllllllllllllllllll!!!!!!!!!!!

19 de jun. de 2014

É DIFÍCIL SER DIFERENTE!

Despertei às 06h30, abri os olhos e notei que o dia já estava claro. Bocejei e estiquei meu corpo, um alongamento gostoso que batizaram "espreguiçar". Espreguicei. Todos os dias acordo nesse mesmo horário e, curiosamente, não preciso ser chamada pelo som agudo do despertador.
Tratei de apressar-me, fui ao banheiro, depois rumei para a cozinha. Preparei o café, busquei o bolo de fubá que eu havia preparado na véspera. Sentei-me à mesa e liguei o notebook. Entre um bocadinho de bolo e outro, um gole de café e outro, descobri que hoje é feriado de Corpus Christi. Foi então que compreendi o silêncio na cidade de São Paulo, a sensação de calmaria proveniente da rua, geralmente movimentada, onde resido.
Acordar cedo em pleno feriado, que sina a minha! Não me recordo quando dormi até tarde, deve fazer mais de cinco anos isso. Dentro da minha cabeça tem um cuco maluco que me chama pontualmente às 06h30. Cientistas devem ter alguma explicação pra isso. Pode ser feriado, final de semana, dia frio, ou ensolarado. Enquanto  quase todos dormem até às nove, ou dez da manhã, eu perambulo pela casa, cuido de muitos afazeres. Em compensação, meu expediente termina, no máximo, às onze da noite. Aí, mais uma vez, enquanto a maioria das pessoas se diverte, assiste à TV, ou lê um livro, eu durmo profundamente.
Difícil ser diferente,  mas há um ponto positivo nisso tudo: a maioria dos textos que produzi foi escrita antes das oito horas da manhã. Textos fresquinhos, quentinhos, um pãozinho saboroso que alimenta os sentidos de meus leitores.

Aos que já despertaram desejo bom dia. Aos dorminhocos desejo bom sono.

16 de jun. de 2014

ESTILHAÇOS

Busquei letrinhas para juntar e os sentimentos paralisaram meus dedos, não consegui escrever uma só palavra. Insisti algumas vezes, reprovei o resultado. Este é o quinto texto que começo. Gostaria de falar de amor, de carinhos doces e sem fim. As frases não se casaram, nem foram felizes para sempre e eu as compreendi.

Somos parecidas, as palavras e eu, destino semelhante, com dias bons, dias ruins e a sensação ímpar de quem não consegue fingir contentamento. Busquei letrinhas para juntar, encontrei lembranças e estilhaços de esperança que explodiram no céu de mim.

13 de jun. de 2014

DEVOLUÇÃO PARA SANTO ANTÔNIO

Dia 13 de junho, Dia de Santo Antônio, santo casamenteiro. Um dia após o Dia dos Namorados, uma espécie de "day after" com a oportunidade de rezar com fé e sair de vez da solidão. Há quem garanta que encontrou um namorado, ou marido após fazer promessas e simpatias. Mas há também quem obteve um milagre e depois se arrependeu do resultado. Duvida? Leia isso!

Querido Santo Antônio,

Santo Antônio pra quem tanto rezei, agradeço a Graça alcançada, o par amoroso que me trouxe. Mas, teve um problema e, desculpe o mau jeito, santinho querido,  preciso devolver o seu presente, aquele cara não pode ser meu pretendente, nem namorado, nem marido. O moço tem um sério defeito: várias namoradas e pavor de compromisso. Esse não é pra casar, acho que não é também pra namorar e, por isso, fiquei empacada, nem só e nem acompanhada. Moço nenhum me corteja, pra não desonrar meu suposto compromisso. Nem posso me cadastrar em um site de relacionamentos, porque acham que sou casada com o dito.

É por isso, Santo Antônio, sem querer fazer desfeita, que te devolvo o traste do jeito que o recebi, com as flores que ele me deu, com os poucos beijos e abraços que me ofereceu. Aproveito a ocasião e reforço o pedido anterior: Santo Antônio, meu santinho, traga pra mim um bom marido!
Amém!


11 de jun. de 2014

AMOR, CENTELHA DE ESPERANÇA: AME!

Ame, porque sem amor a vida não faz sentido, não tem graça. Pra dizer a verdade, sem amor a vida não passa, ela se arrasta e nada mais.
É preciso existir um amor, ainda que escondidinho dentro do coração. Um amor quente, que sobreviva às intempéries e que seja uma espécie de herói que nos salva da solidão ocasional, do medo do futuro, das loucuras diárias, do amarelado do tempo.
Tem que haver um amor que seja centelha de esperança, fonte de felicidade, pra gente encostar a cabeça no travesseiro depois de um dia complicado e somente a lembrança do ser amado valer por todas as preces.
Porque o amor salva,  o amor cura, o amor rejuvenesce, o amor devolve sonhos e alimenta a alma. Então, nada melhor do que amar. O que você está esperando? Ame!

Feliz Dia dos Namorados!

EU TE AMO!

Sei que muitas pessoas procuram meu blog para encontrar aqui inspiração para escrever uma carta de amor, uma frase legal para uma mensagem. Há muitas coisas por aqui, mas vou lhes contar uma coisa: amor não se copia, amor se cria!
Ainda que você não seja escritor, não seja poeta, não saiba o que escrever em um e-mail ou torpedo no celular, basta dizer simplesmente “te amo”, ou “gosto de você”. O que há de tão poderoso nessas duas formas de expressar afeto? Há o mundo em poucas palavras. Dizer “eu te amo” é algo que costuma ser cuidado, medido e, às vezes, evitado. Como se amar fosse um compromisso que caminha à beira do abismo, ou correntes que prendem e impedem a liberdade. Uma bomba que faz tic-tac e está prestes a explodir.
Mundo estranho o nosso! Mandar alguém pra algum lugar pouco bonito de se escrever é fácil, mas dizer “eu te amo” pode causar desconforto, sensação de claustrofobia, pode ser comprometedor! Ser romântico pode parecer babaquice, tolice, até burrice. Ser indiferente, ou medir as palavras, causa uma sensação de segurança e invulnerabilidade: estou protegido(a), não disse eu te amo, nem demonstrei que gosto dele(a), estou são(sã) e salvo(a)!
“Eu te amo” são três palavrinhas que carregam o mundo dentro de si. Podemos dizer “eu te amo” para nosso par romântico, para nossa família, nossos amigos, nossos animaizinhos de estimação, para o sol, a lua, o mar, para nós mesmos! Não dói, não machuca, não nos torna bobos, nem é arriscado, é pura e simples expressão sincera de afeto. Para que este nosso mundo melhore, sem tantos problemas graves, sem tanta violência, sem tanto egoísmo, temos que exercitar mais vezes o amor. Pois que seja assim, dizendo “eu te amo” pra alguém, pelo menos uma vez ao dia.
Não é preciso escrever versos, nem é preciso saber escrever nada. Basta ter um coração e a boa vontade de amar. Essa é a minha sugestão pra vocês que aqui chegam e procuram boas ideias para escrever textos apaixonados. Seja simples, seja você mesmo(a) e diga o que sente em poucas palavras.

Eu te amo!

10 de jun. de 2014

BEIJOS COM SABOR DE CARAMBOLA

Quando ele se aproximou de seu rosto, no quintal da casa e sob o pé de carambola, ela fechou os olhinhos muito negros e sentiu a respiração acelerada do garoto. Quantos anos eles tinham? Buscou em suas lembranças as datas, o tempo havia passado tanto que concluiu que isso não tinha importância. 
Eram duas crianças. Ele, um menino com os cabelos desalinhados, muito magro e sua pele queimada de sol. Ela, com aparelho nos dentes, sardas na face e laço de fita nos cabelos. O primeiro beijo tão apressado, o pedido de namoro. Ele, seu primeiro namorado. Depois a vida correu em sentidos opostos, a mudança de cidade, o fim da adolescência, o vestibular de medicina, não mais se encontraram. Ele se casou, ela morou na Europa, perderam o contato.
Voltou a fazer as contas, talvez quarenta anos, esse o tempo que havia passado desde aquela sensação de medo e delícia, tudo junto e ao mesmo tempo. O papel que embrulhou o primeiro presente que ganhou estava amarelado pelo tempo. Uma recordação dentro de uma caixa.
Aos cinquenta anos de idade visitou sua cidade natal. Buscou amigos de infância e soube que ele era avô, um senhor calvo, gordinho, dono de uma concessionária de veículos. Arriscou ir à loja. O tempo modifica tudo, mas na primeira troca de olhares se reconheceram, eram duas crianças outra vez. Um beijo longo, sem pressa e sem promessas. Voltaram a ser meninos. Amor passado, amor presente. Primeiro namorado, beijos com sabor de carambola.

8 de jun. de 2014

DIA DOS NAMORADOS ( AME!)

Namorar é tão bom que o tempo deveria parar nesse instante e eternizar-se, entre beijos e mais beijos, sonhos e mais sonhos, entre todos os planos e desejos, sem futuro, só presente, todos os dias, infinitamente. Com um laço de fita com sabor de lua de mel e cores escorridas de paixão. 
Namorar é brilho escancarado no olhar e sorriso que devora os pensamentos. Despertar de sonhos adormecidos, adormecer de almas entrelaçadas. Doçura em gestos, paz pincelada de afeto. Energia vital, força divina que aquece o peito e se traduz em afagos sem fim. 

Seja feliz, ame, namore, viva! Nesta vida o que existe de mais significativo e valioso é o amor que levamos no peito e entregamos a alguém. Amar, isso torna a vida muito mais bonita. Feliz Dia dos Namorados!

7 de jun. de 2014

UM TEXTO NADA INSPIRADO

O texto do final de semana entalou em minhas ideias, de um jeito tão justo e sob um sufoco tão grande que logo deduzi: ela foi embora. A inspiração gosta de brincar de esconde-esconde, pega-pega, duro ou mole. Na brincadeira de mocinho e bandido ela já foi o bandido várias vezes.
Perdi as contas, não sei quantas vezes fui por ela assaltada no meio da noite, em locais públicos movimentados, em situações socialmente inaceitáveis. Quantas vezes precisei de socorro urgente, uma caneta qualquer, um pedaço miúdo de qualquer papel. Cheguei a fazer de lápis batons, lápis de olhos. Justamente agora, sábado, aqui preparada e feliz com meu café com leite a esfriar, minha convidada não apareceu.
Talvez, a inspiração esteja adormecida, esteja de ressaca, ou bem acompanhada e dormindo de conchinha com seu amor. E eu, caro leitor, deixo aqui este breve texto de sábado, sem a inspiração, mas com as palavras que fluem facilmente na ponta dos meus dedos. Um texto solo, nada inspirado.

6 de jun. de 2014

UMA PRECE PARA NÃO PARAR DE SONHAR

Que eu não perca a capacidade de sonhar, ainda que a vida me convide a perder o brilho do meu olhar.
Que eu não desista de amar, ainda que o amor alheio seja raro, miúdo e indiferente a mim.
Que eu não desista de meus planos mais bonitos, por medo, dúvidas e deduções injustas.
Que eu tenha a coragem de desmanchar tudo e recomeçar, quantas vezes for preciso.
Que eu não esqueça que a vida é rara e breve, não perca tempo a seguir caminhos equivocados.
Que eu tenha as palavras certas para confortar a dor alheia, o coração aberto para reconhecer a amizade.
Que eu viva até o fim com dignidade e a mesma coragem que me ensinou a aceitar aquilo o que não posso modificar.
Que eu não fique só, mesmo em momentos ocasionais de solidão.
Que tudo isso faça parte de meus gestos, palavras, pensamentos e atitudes, diariamente. Amém.

5 de jun. de 2014

POEIRA DAS LEMBRANÇAS

Pensei em contar-lhes o que se passou comigo. Como eu já disse uma vez por aqui: ah, já que o blog é meu, então abusarei do olhar aqui derramado – o seu olhar, caro leitor – e entregarei um pedacinho de minha história contemporânea.
A casa antiga, de meus falecidos pais, está à venda. Um imóvel que foi o cenário de muitas alegrias, muitos encontros de parentes e amigos, paredes que assistiram a décadas da minha vida e da vida da minha família.
Todas as vezes que entro na casa sinto algo parecido com o que um ator sente ao ver o teatro vazio, sem plateia. Os espetáculos foram ali encenados, houve aplausos e alegria, mas hoje as luzes estão apagadas e não há um espetáculo em cartaz. Fiquei para apagar essas luzes, eu e toda a imensidão do vazio ao meu redor. Muitos textos escrevi ali, em meu antigo quarto. Muita inspiração brotou naquele endereço, uma rua tranquila da cidade de São Paulo.
Semana passada, depois de muita hesitação, eu me enchi de coragem e decidi buscar todas as fotografias antigas, guardadas no alto de um armário no aposento que foi o escritório do meu pai. Peguei uma escada, fiz uma espécie de prece para reforçar a coragem e deparei-me com muitas caixas de papelão, todas com um conteúdo que, pra mim, era um verdadeiro mistério. Segredos de minha mãe, talvez. Objetos bem guardados, uma herança de valor estimativo incalculável. Fotografias, fitas de vídeo, fitas cassetes, LPs de músicas clássicas, bonecas de porcelana, papéis aos montes dentro de pastas.
Desci da escada com meu coração aos pulos, talvez a mesma sensação de quem desenterrou um tesouro. Aquilo tudo estava ali guardado há muitos anos, sem que ninguém tivesse ousado profanar um santuário de memórias significativas, importantes para meus antepassados.
Fiquei ali no escritório parada, olhei pro alto durante muito tempo e admirei à distância a confusão daquele amontoado de relíquias. Voltei ao topo da escada e puxei uma das caixas de papelão, aliás muito pesada. Dentro estavam os álbuns de fotografia. Sentei-me no chão e abri o álbum de fotos de casamento dos meus pais. Lindos, jovens, sorridentes, eternizados. A casa de meus avós ali ainda existia, todos jovens em seus sorrisos, havia a certeza da eternidade.
Não sei quanto tempo esqueci da vida e me deixei levar pelo passado e por minha fértil imaginação e insaciável curiosidade. Uma lágrima teimosa desceu pelo meu rosto, saudade aperta muito o coração e inunda os olhos feito um mar. Enxuguei as lágrimas com o dorso de minha mão. Uma poeira fininha e muito preta cobria aquelas fotos, todas elas. Decidi trazer pra minha casa o meu tesouro, para organizar e guardar comigo aquele mundo de lembranças em preto e branco.
Um apartamento pequeno não comporta tantas recordações, mas dei um jeito de empurrar documentos e toda minha papelada para um lado e ajeitei como pude aquela caixa de papelão no canto da sala. De vez em quando eu pegava um álbum, outro, uma foto e outra, mostrei para meus amigos do Facebook o quanto eu era bonitinha em meus tempos de criança, a noiva bonita que foi minha mãe, meus irmãos ainda pequenos.
No dia seguinte amanheci com meus olhos muito vermelhos, coçavam sem parar. Logo deduzi: alergia, só pode ser isso. Fiz uma compressa de água fria, mas nada parecia amenizar o desconforto, que piorou tanto que precisei ir ao oftalmologista. O diagnóstico: conjuntivite viral. Medicada e cheia de recomendações médicas, passei a cuidar-me com mais atenção e a tentar descobrir como que fotografias antigas podiam ter infectado meus olhos.
Isso completou uma semana, já estou melhor, mas continuo com os olhos inundados de um mar de lágrimas a cada nova foto que admiro, afinal pra saudade não existe remédio.
Cheguei à conclusão de que a conjuntive aconteceu por culpa do vírus, mas especialmente porque doeu muito ver a vida perfeita flagrada por flashes de momentos únicos e mágicos. Momentos que hoje pertencem a um passado muito longínquo e cujos personagens envelheceram, ou faleceram.  De fato, eu preferia não ter visto nada disso, apesar de gostar muito das fotos de minha família.
Não é à toa que minha mãe guardou aqueles pertences no alto de um armário e fechou a porta para não mais olhar aquilo tudo. Tento imaginar quantas vezes minha mãe chorou ao olhar aquelas fotografias. Com meus olhos irritados e somados às lágrimas de orfandade, guardei a caixa de papelão em um armário bem alto de minha casa, para o futuro, ou quem sabe para nunca mais.
Episódio verídico ocorrido comigo, que por aqui assino Diva Latívia. Hoje voltei ao cenário do passado e resisti à necessidade de novamente trazer comigo recordações empoeiradas. Passado e presente, entre nós a poeira de recordações muitas.

4 de jun. de 2014

ENTRE RENDAS E RESTOS DE SI

Entre rendas e restos de si, ela abriu a caixinha de costura e buscou descuidadamente o retrós de linha azul. Espetou o dedo na agulha e admirou a gotinha de sangue a despontar reluzente. Feito criança, lambeu o dedo na tentativa de curar a ferida.
Deixou de lado o conserto da meia rasgada, viajou em pensamentos distantes. A vida remendada, o coração trincado, o olhar emoldurado por ruguinhas de preocupação e cores de tristeza. O que se rasgou afinal?
Aterrissou dos pensamentos e voltou à costura, um band- aid no dedo anular. Tratou de correr contra o tempo, faltava pouco para o meio-dia. Manhã fria, a meia costurada calçada no pé. Fechou a caixinha de costura e saiu apressada.
O mundo lá fora a correr ligeiro, indiferente ao seu dedo ferido, ao seu coração partido, ao seu olhar apagado. Não havia tempo a perder, mergulhou na multidão, passos apressados.
Naquele dia não mais pensou na vida, a meia em seu pé voltou a rasgar, no dia seguinte novamente abriria a caixinha de costura para buscar o retrós de linha azul. Retalhos de sua rotina.

2 de jun. de 2014

LAÇO DE AÇÚCAR

Que me importa se seu signo não combina com o meu no horóscopo chinês? Se você não gosta de jazz, não bebe vinho enquanto degusto um bom cabernet sauvignon ao som de Miles Davis?
Não me importa se você prefere Nova Iorque a Paris, contanto que esteja feliz ao meu lado em qualquer lugar. Que me importa se prefere Neruda a Fernando Pessoa, Rio de Janeiro a Lisboa, verão ao inverno?
Tudo o que me importa é que dentro do seu peito o nosso amor seja eterno e exista com toda sua força a cada segundo, a cada sorriso, a cada palavra, feito laço de açúcar entre nós.

VINHO, FLORES E DECLARAÇÃO DE AMOR

Flores do campo miudinhas, um festival de cores abraçou o seu olhar. Atrás do buquê delicado o sorriso do ser amado e sua presença iluminada. 
Brindaram com vinho, taças de cristal, testemunhas que tilintaram suavemente. Entre nuvens de afeto dançaram à luz de velas e trocaram um longo beijo. 
Quando ela despertou o sonho não coube dentro de si, escreveu uma poesia e perfumou os versos com uma declaração de amor.