Quando ele se aproximou de seu rosto, no quintal da casa e
sob o pé de carambola, ela fechou os olhinhos muito negros e sentiu a
respiração acelerada do garoto. Quantos anos eles tinham? Buscou em suas
lembranças as datas, o tempo havia passado tanto que concluiu que isso não
tinha importância.
Eram duas crianças. Ele, um menino com os cabelos
desalinhados, muito magro e sua pele queimada de sol. Ela, com aparelho nos
dentes, sardas na face e laço de fita nos cabelos. O primeiro beijo tão apressado, o
pedido de namoro. Ele, seu primeiro namorado. Depois a vida correu em sentidos
opostos, a mudança de cidade, o fim da adolescência, o vestibular de medicina,
não mais se encontraram. Ele se casou, ela morou na Europa, perderam o contato.
Voltou a fazer as contas, talvez quarenta anos, esse o tempo
que havia passado desde aquela sensação de medo e delícia, tudo junto e ao
mesmo tempo. O papel que embrulhou o primeiro presente que ganhou estava amarelado
pelo tempo. Uma recordação dentro de uma caixa.
Aos cinquenta anos de idade visitou sua
cidade natal. Buscou amigos de infância e soube que ele era avô, um senhor
calvo, gordinho, dono de uma concessionária de veículos. Arriscou ir à loja. O
tempo modifica tudo, mas na primeira troca de olhares se reconheceram, eram duas crianças outra vez. Um beijo longo, sem pressa e sem promessas. Voltaram
a ser meninos. Amor passado, amor presente. Primeiro namorado, beijos
com sabor de carambola.
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