
Quando abri meus olhos logo cedo, estiquei o braço tentando encontrar o corpo quentinho deitado ao meu lado. Escutei algo parecido com um grunhido, ou será que ursos rosnam? Ele se virou pro outro lado, puxou o cobertor como quem protesta contra a minha existência e começou a ressonar em alto e bom som.
Já acordada, meu cérebro foi invadido por pensamentos que alimentaram minhocas de todo o tipo. Todas as manhãs eu era abraçada “de conchinha”, agora lá estava a criatura com o traseiro virado na minha direção e sentindo-se incomodado com o pouco espaço que eu estava ocupando ao seu lado na cama. A minhoca chefe me disse: “ele se cansou da sua companhia”. As minhoquinhas filhotes começaram a reinar indisciplinadas. Em coro elas caçoavam da minha aflição: “perdeu, mana! Ele já arrumou outra!”.
Totalmente paranóica, decidi me levantar. Incauta, coloquei o pé esquerdo no chão, coisa que minha bisavó dizia que não se deve fazer, sob pena de começar o dia com o pé errado. Caminhei na pontinha dos pés, mal respirava. A maçaneta da porta do quarto fez barulho. Ele emitiu um novo rugido, moveu-se na cama e ficou espalhado em formato de X. Tentei não fazer qualquer tipo de ruído e entrei no banheiro. “Filhadamãe” da descarga do vaso sanitário só faltou explodir, tamanho o barulho que fez. Voltei pro quarto, novo rangido da maçaneta. Não havia lugar pra eu me deitar. Com jeito, fiquei encolhidinha, metade da bunda pra fora da cama.
Domingo, dia pra dormir até não querer mais. Perdi o sono, as minhocas estavam agora promovendo uma festa de arromba: ele estava farto da minha presença, era isso! Eu precisava levantar novamente, vestir minha roupa e ir embora, talvez deixar um bilhetinho assim escrito: “Caro Zé Colmeia, parti!”.
Eram 9h00, ele abriu os olhos. Como quem não sabe onde está, nem se lembra mais quem eu sou, levantou-se sem ao menos dizer “bom dia”. Saiu do quarto, largou a porta aberta, foi até o banheiro, fez muito mais barulho do que eu fiz. Acendeu um cigarro, entrou na cozinha e colocou a chaleira de água no fogo pra fazer café. A zoeira era de uma escola de samba! O minhocário caiu na gargalhada e disse: “burra! Burra! Burra!”.
Tentei desfazer o feitiço do “pé esquerdo”, sorri tentando disfarçar minha loucura, abracei-o carinhosamente. Inerte! Não reagiu. As lágrimas começaram a embaçar meus olhos. Foi então que ele resmungou: “eu acordo de mau humor!”.
Dizia minha avó que existe um ótimo remédio pra neurastenia: banho gelado no inverno! Eis o lado ruim de algo bom: lidar com o mau humor do par, isso sem brigar, é uma verdadeira arte. Antes de voltar pro aconchego do meu lar, olhei-me no espelho e contei até 1.000.000! Jurei deixá-lo de castigo, ficou sem conchinha o resto da semana. Ainda bem, amanhã é sexta-feira e, espero, terei ao meu redor melhor astral. Tomara!
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