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Apresentação

Este blog nasceu no blog Janela das Loucas, onde assinava "Diva Latívia". Ali permaneci durante muito tempo, como autora principal das crônicas do blog. Redescobri que escrever é vital pra mim, guiada e editada por Abílio Manoel, cantor, compositor, cineasta e meu querido amigo. O Janela das Loucas não existe mais, Abílio foi embora pro Céu. Escrevo porque tenho esse dom divino, mas devo ao Abílio este blog, devo ao Abílio a saudade que me acompanha diariamente. Fiz e faço deste blog uma homenagem a aquele que se tornou meu irmão, de alma e coração. Aqui o tema é variado: cotidiano, relacionamentos e comportamento, em prosa e versos.







26 de abr. de 2011

TRAGO O SEU AMOR DE VOLTA EM TRÊS DIAS!


Desde o dia que João Alfredo terminou com ela o namoro, Linda Cristina vivia pelos cantos a choramingar. Nada, nem mesmo um bonito dia de sol, conseguia trazer um breve sorriso, um pensamento doce. Nada! Era somente tristeza seu coração. Lembranças, todas elas bailavam ao seu redor. As músicas lhe traziam recordações torturantes, assim como os lugares por onde foram, os perfumes, sabores, tudo lembrava o quanto doía a saudade que sentia do amado João Alfredo.
As amigas tentavam dissuadi-la do intuito de afundar-se em um poço de recordações, mas Linda agarrava-se a cada breve lembrança, tal e qual quem deseja encontrar o fio de um emaranhado de lã. Noites insones, dias sonolentos. Parecia que a vida a desafiava com sua indiferença. O sol brilhava, apesar de sua dor, isso pra ela algo incompreensível.
Era uma tarde de quinta-feira quando Linda Cristina estava voltando do curso de espanhol e viu em um poste de iluminação um cartaz anunciando algo inusitado. Assim estava escrito: Vó Dandá, faço e desfaço despacho, mandinga, macumba, afasto o mau olhado. Trago o seu amor de volta, rastejando aos seus pés, em 3 dias.
Mais do que depressa, Linda procurou o celular dentro da bolsa e marcou a consulta com a “vidente”. O endereço não era muito distante daquele local. Vó Dandá tinha seu escritório – se é que esse tipo de lugar pode ser assim chamado – sobre uma bicicletaria. O aroma de incenso dobrava a esquina. Tocou a campainha duas vezes, até que um garoto de seus 14, 15 anos veio atender. Subiu uma escadinha escura e íngreme e foi convidada a sentar-se em uma sala com poucos móveis. Eis que chegou Vó Dandá.
Senhora obesa, idade acima dos 70 anos. Brincos dourados de imensas argolas, vestido rodado estampado de vermelho e dourado. Muitas pulseiras e colares de miçangas coloridas. O mais impressionante eram suas unhas muito longas, talvez postiças, pintadas de um tom marrom, quase cor de terra.
Silêncio. Algo aflitivo, constrangedor. Ali poderia estar, diante de si, a salvação para o seu problema, a sua dor que aumentava a cada dia. Quem sabe um breve despacho, uma simpatia, algo assim? Qualquer pequeno sacrifício? Uma galinha, um bode, um avestruz?
E eis que começou a consulta. Cartomancia, búzios. E baixou o santo em Vó Dandá. – Fia, ôce tem pobrema de inveja. É muita inveja! Seu ômi vai vortá! Em treis dia seu ômi vai vortá, mas pra isso percisa primeiro comprá um materiá.
A lista era enorme, tinha de peru defumado da Sadia até damascos secos, champagne Vèuve Clicot e vodca russa! Aquilo tudo não ficaria por menos de dois mil reais, assim calculou Linda Cristina. Porém, tão generosa e bondosa pareceu ser Vó Dandá! Não cobrou um centavo sequer pela consulta e, ainda pegou o nome, o telefone e o endereço de João Alfredo, tudo pra que as poderosas forças ocultas lá fossem visitá-lo para reapaixoná-lo por Linda Cristina.
Iludida, desesperada, ansiosa, Linda comprou todos os itens e, pessoalmente, entregou à Vó Dandá. Passados os três dias, sem receber um só telefonema de João Alfredo, decidiu voltar ao lugar onde fez a consulta. Pasme, estava escuro e trancado. Intrigada, deixou um bilhete aflito sob a porta: “Vó Dandá, estive aqui, preciso falar urgente com a senhora”.
Dois dias mais tarde, Vó Dandá telefonou. Precisava de vinte dúzias de rosas vermelhas, um vidro de Chanel n. 5, um jogo de malas de viagem novo e de boa qualidade, dois cortes de tecido de crepe de seda, uma sandália de salto baixo, couro puro, tamanho 38 e cem velas de sete dias. Apesar de achar isso tudo meio esquisito, Linda comprou o que foi pedido. Nova promessa: em dois dias seu amado estaria de volta, apaixonado, até a pediria em casamento!
Dois dias depois, nada! Nem mesmo um e-mail, um torpedo no celular. Nem sinal de João Alfredo. Pela primeira vez, Linda compreendeu que havia caído no conto do “trago o seu amor de volta”. Revoltada, foi a uma delegacia. Fez o B.O. com lágrimas nos olhos. O escrivão, tão simpático, solícito. Comovido, trouxe café, água. Por fim, já que estavam no horário do almoço, convidou Linda pra com ele almoçar.
E foi assim que Linda Cristina conheceu seu novo amor, Paulo Olavo. Desse dia em diante não mais chorou, os dias de sol voltaram a brilhar, as músicas voltaram a trazer alegria e todos os lugares por onde um dia havia passado com seu ex não traziam tristes recordações.
E quanto à Vó Dandá? Ninguém sabe, mas parece que agora se mudou pra zona Oeste da cidade, afinal por ali há vários cartazes em postes anunciando a volta do amor em três dias.

2 comentários:

Antonio Zilmar disse...

Retribuindo a visita. Gosto de brincar entre ficção e realidade na primeira pessoa. Tem dia que eu mesmo não sei se estou falando de mim ou ficcionando algo. Um abraço e obrigado pelas visitas e comentários. Gostei do texto, as vezes nós mexer faz as coisas acontecerem, seja de um jeito ou de outro né?

Cláudia Cavalcanti disse...

Antônio, escrever é assim mesmo. A gente conta, às vezes inventa e reinventa uma história. Tem muito de nós em nossas palavrinhas escritas.
Obrigada, um beijo.