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Essa história de ter que cozinhar, isso a princípio pareceu um bicho de muitas cabeças. Picar temperos, sujar as mãos. E escolher carnes então? Recém-casada, ganhei de presente de casamento um jogo de panelas inox. Na época, isso era novidade, algo chique e de bom gosto. O fogão, pra meu desespero, era alimentado por outra novidade: gás encanado. O medo de me queimar, cortar os dedos. Uma espécie de jardim de infância gastronômico, assim era a minha cozinha. Pra mostrar meus novos dotes culinários, em meio a muitas trapalhadas e imensos equívocos, resolvi preparar algo que considerava muito simples: frango assado com batatas. Telefonei pra minha mãe, ela explicou o que eu deveria fazer e, especialmente, o que eu não deveria fazer: sair de perto da cozinha, para evitar estragos e, quiçá, um incêndio.
Atrevida, a juventude é mesmo ousada. Escutei os conselhos maternos, mas eu me sentia uma mestre cuca, uma chefe de cozinha! Temperei a ave, descasquei as batatas. Escolhi uma forma para acolher o preparado. Quando liguei o forno, a coisa não pegava. Liga, liga, liga. Cheiro de gás. Resolvi desligar e, abanando o ambiente com um paninho de prato, esperei alguns instantes antes de insistir na mesma operação. Descobri que tinha esquecido de ligar a tomada do fogão, como o acendedor poderia funcionar? Problema resolvido, busquei a forma sobre a pia, abaixei-me para melhor visualizar o forno e tomei um choque desses de fazer os cabelos ficarem arrepiados. Creio, o meu grito deve ter sido escutado a longa distância. Ainda sem entender nada, o coração disparado, tocou o interfone. O porteiro, já esqueci seu nome, queria saber o que estava acontecendo. Eu não tinha colocado lâmpada naquele soquete que fica dentro do forno. A forma encostou no soquete da lâmpada e eis o motivo do choque que tomei. Já apavorada, busquei um chinelinho havaiana, afinal dizem que borracha isola choques elétricos. Olhava pro frango cru, inerte, como se fosse um monstro malvado.
Sentei na cadeirinha junto à mesa da cozinha com vontade de chorar. Até meses atrás eu sequer sabia distinguir asa de sobrecoxa! Nunca tinha preparado um só café! E eu ali, dona de casa. Senti raiva, senti muita raiva! Decidi ligar o forno antes de levar a forma novamente pro seu interior. Um milagre, lá estava o danado funcionando! Busquei a forma e esqueci algo muito importante: papel alumínio para cobrir o assado e proporcionar o seu cozimento. Já sabia que deveria esperar 30 minutos para retirar o assado do forno. Por isso, fui fazer o que sabia: lavar os cabelos, passar hidratante corporal, relaxar alguns instantes.
Quando abri a porta do banheiro, eu estava em uma espécie de sauna sem vapor, mas com muita fumaça. Frango incendiado, carbonizado, irreconhecível até mesmo com um exame de DNA. A fumaça invadiu meu apartamento e causou grande confusão no meu andar. A vizinha, alguém um tanto estressada, chegou a me chamar de irresponsável. Difícil mesmo foi consertar a confusão. Eu não sabia sequer como remover aquele grude que ficou na forma do frango, por isso joguei tudo, incluindo a forma, dentro da lixeira. O cheiro do incêndio impregnou meu apartamento. E eu, desconsolada, aprendi naquele dia que receitas foram feitas para serem seguidas à risca e que cozinha não é mesmo lugar de criança.
Três décadas se passaram. Cá estou escrevendo tudo isso pra vocês. Minha casa está quentinha, no forno costelas de porco com batatas e sobre o fogão feijão que acabei de preparar. A saladinha de rúcula e tomates foi lavada com muito cuidado. E eu, uma garota de 50 anos de idade, ainda cometo algumas loucuras gastronômicas, principalmente quando resolvo fazer duas coisas ao mesmo tempo, por exemplo: cozinhar e escrever. Ah, a vida. O tempo passa, a gente aprende tantas coisas! Quem diria que eu, que tinha medo de fogão, aprenderia tanto assim? Cozinha lembra um pouco alquimia. Quem diria que eu, um dia, amaria cozinhar?
Sei cozinhar de um jeito comum, normal. Aquelas comidinhas do dia-a-dia. Mas, se você "curte" gastronomia, deixo aqui uma dica muito boa, um blog que é sensacional: www.tropecosdeumgormet.wordpress.com
Aqui você encontrará temas ligados a comportamento, relacionamentos e cotidiano.
É proibida a reprodução não autorizada dos textos deste blog, de acordo com a Lei nº9.610, de 19 de fevereiro de 1998, que regula os direitos autorais.
Apresentação
Este blog nasceu no blog Janela das Loucas, onde assinava "Diva Latívia". Ali permaneci durante muito tempo, como autora principal das crônicas do blog. Redescobri que escrever é vital pra mim, guiada e editada por Abílio Manoel, cantor, compositor, cineasta e meu querido amigo. O Janela das Loucas não existe mais, Abílio foi embora pro Céu. Escrevo porque tenho esse dom divino, mas devo ao Abílio este blog, devo ao Abílio a saudade que me acompanha diariamente. Fiz e faço deste blog uma homenagem a aquele que se tornou meu irmão, de alma e coração. Aqui o tema é variado: cotidiano, relacionamentos e comportamento, em prosa e versos.
20 de ago. de 2011
DIVINA COZINHA
Essa história de ter que cozinhar, isso a princípio pareceu um bicho de muitas cabeças. Picar temperos, sujar as mãos. E escolher carnes então? Recém-casada, ganhei de presente de casamento um jogo de panelas inox. Na época, isso era novidade, algo chique e de bom gosto. O fogão, pra meu desespero, era alimentado por outra novidade: gás encanado. O medo de me queimar, cortar os dedos. Uma espécie de jardim de infância gastronômico, assim era a minha cozinha. Pra mostrar meus novos dotes culinários, em meio a muitas trapalhadas e imensos equívocos, resolvi preparar algo que considerava muito simples: frango assado com batatas. Telefonei pra minha mãe, ela explicou o que eu deveria fazer e, especialmente, o que eu não deveria fazer: sair de perto da cozinha, para evitar estragos e, quiçá, um incêndio.
Atrevida, a juventude é mesmo ousada. Escutei os conselhos maternos, mas eu me sentia uma mestre cuca, uma chefe de cozinha! Temperei a ave, descasquei as batatas. Escolhi uma forma para acolher o preparado. Quando liguei o forno, a coisa não pegava. Liga, liga, liga. Cheiro de gás. Resolvi desligar e, abanando o ambiente com um paninho de prato, esperei alguns instantes antes de insistir na mesma operação. Descobri que tinha esquecido de ligar a tomada do fogão, como o acendedor poderia funcionar? Problema resolvido, busquei a forma sobre a pia, abaixei-me para melhor visualizar o forno e tomei um choque desses de fazer os cabelos ficarem arrepiados. Creio, o meu grito deve ter sido escutado a longa distância. Ainda sem entender nada, o coração disparado, tocou o interfone. O porteiro, já esqueci seu nome, queria saber o que estava acontecendo. Eu não tinha colocado lâmpada naquele soquete que fica dentro do forno. A forma encostou no soquete da lâmpada e eis o motivo do choque que tomei. Já apavorada, busquei um chinelinho havaiana, afinal dizem que borracha isola choques elétricos. Olhava pro frango cru, inerte, como se fosse um monstro malvado.
Sentei na cadeirinha junto à mesa da cozinha com vontade de chorar. Até meses atrás eu sequer sabia distinguir asa de sobrecoxa! Nunca tinha preparado um só café! E eu ali, dona de casa. Senti raiva, senti muita raiva! Decidi ligar o forno antes de levar a forma novamente pro seu interior. Um milagre, lá estava o danado funcionando! Busquei a forma e esqueci algo muito importante: papel alumínio para cobrir o assado e proporcionar o seu cozimento. Já sabia que deveria esperar 30 minutos para retirar o assado do forno. Por isso, fui fazer o que sabia: lavar os cabelos, passar hidratante corporal, relaxar alguns instantes.
Quando abri a porta do banheiro, eu estava em uma espécie de sauna sem vapor, mas com muita fumaça. Frango incendiado, carbonizado, irreconhecível até mesmo com um exame de DNA. A fumaça invadiu meu apartamento e causou grande confusão no meu andar. A vizinha, alguém um tanto estressada, chegou a me chamar de irresponsável. Difícil mesmo foi consertar a confusão. Eu não sabia sequer como remover aquele grude que ficou na forma do frango, por isso joguei tudo, incluindo a forma, dentro da lixeira. O cheiro do incêndio impregnou meu apartamento. E eu, desconsolada, aprendi naquele dia que receitas foram feitas para serem seguidas à risca e que cozinha não é mesmo lugar de criança.
Três décadas se passaram. Cá estou escrevendo tudo isso pra vocês. Minha casa está quentinha, no forno costelas de porco com batatas e sobre o fogão feijão que acabei de preparar. A saladinha de rúcula e tomates foi lavada com muito cuidado. E eu, uma garota de 50 anos de idade, ainda cometo algumas loucuras gastronômicas, principalmente quando resolvo fazer duas coisas ao mesmo tempo, por exemplo: cozinhar e escrever. Ah, a vida. O tempo passa, a gente aprende tantas coisas! Quem diria que eu, que tinha medo de fogão, aprenderia tanto assim? Cozinha lembra um pouco alquimia. Quem diria que eu, um dia, amaria cozinhar?
Sei cozinhar de um jeito comum, normal. Aquelas comidinhas do dia-a-dia. Mas, se você "curte" gastronomia, deixo aqui uma dica muito boa, um blog que é sensacional: www.tropecosdeumgormet.wordpress.com
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