É proibida a reprodução não autorizada dos textos deste blog, de acordo com a Lei nº9.610, de 19 de fevereiro de 1998, que regula os direitos autorais.

Apresentação

Este blog nasceu no blog Janela das Loucas, onde assinava "Diva Latívia". Ali permaneci durante muito tempo, como autora principal das crônicas do blog. Redescobri que escrever é vital pra mim, guiada e editada por Abílio Manoel, cantor, compositor, cineasta e meu querido amigo. O Janela das Loucas não existe mais, Abílio foi embora pro Céu. Escrevo porque tenho esse dom divino, mas devo ao Abílio este blog, devo ao Abílio a saudade que me acompanha diariamente. Fiz e faço deste blog uma homenagem a aquele que se tornou meu irmão, de alma e coração. Aqui o tema é variado: cotidiano, relacionamentos e comportamento, em prosa e versos.







30 de abr. de 2010

SEXTA-FEIRA, DIA DE CERVEJA!


Era sexta-feira, ele chegou do trabalho suado e cansado. Abriu uma latinha de cerveja e ligou o notebook. Digitou: "brejoperfeito.com.br" e começou a ler os perfis das moças solteiras da lagoa.
Já estava na segunda latinha de cerveja quando esbarrou o olhar no perfil de lindamorena35. Exclamou: - Uau!
Caprichou na mensagem: “Olá, meu nome é Ataulfo, sou da cidade de Brejo Alegre. Divorciado, 47 anos, formado em ciências exatas, 1,78 e não sou gordo e nem magro. Procuro uma morena linda tal e qual você para compromisso sério. Aguardo ansioso a sua resposta. Beijos e carinho, Ataulfo”.
Duas horas depois, muitos perfis lidos e mais algumas latinhas de cerveja, chegou a resposta da lindamorena35.
Oie! Ki bom falar contigo. Tu tecla donde? Mi liga no meu cel XXX-XXXX, tb to anciosa pra ti add no meu MSN tenho cam e fotinhos. Bjkssss Maria das Dores”.
Ataulfo leu, releu. Olhou mais uma vez as fotos sensacionais da morena, resolveu esquecer o português errado e ligou pro número que ela mandou.
- Alouuuuu...
- Oi, aqui é o Ataulfo.
- De onde, bem?
- Ataulfo, do Brejo Perfeito.
- Ah, tá! É que eu tô com umas amigas e tá muito barulho aqui. Cidinha, fala baixo que não consigo ouvir p... nenhuma!
- Acho melhor eu ligar em outra hora, a gente se fala.
- Nãoooo, peraí! Tu é aquele que escreveu contando que é de Brejo Alegre, né?
- Sim.
- Então, olha só que demais, eu também sou de lá.
- Sério?
- Claro que é sério, né? Sou mulher séria. Pra casar.
- Que bom isso.
- Ataulfo, tu tem que marca de carro e quanto tu ganha de salário?
- Maria das Dores, preciso desligar, tenho um compromisso agora.
- E o nosso café?
- Fica pra outro dia, boa noite, beijo.
- Beijocas, te ligo, bem.

Faz duas semanas que Ataulfo deleta as mensagens de lindamorena35, que chegam às dezenas em sua caixa postal do Brejo. Está pensando em trocar o número do celular, a caixa de postal lotada de beijocas de Maria das Dores. E tudo porque ele queria companhia pra tomar uma cervejinha! Já fez um juramento: Brejo Perfeito, nunca mais!

29 de abr. de 2010

AT LAST



Era o mês do aniversário dela. Olhou o calendário no momento em que ia saindo pra caminhar no parque. Desistiu de sair, tirou dos pés o par de tênis e da cabeça o boné.
O tempo passava depressa, ela ainda sozinha. Tantos pretendentes, tudo por conta daquele amor mal resolvido, do amor não correspondido. Pra tentar esquecê-lo foi capaz de se atirar em braços e abraços de mais de um alguém.
Sentou-se diante do computador e releu todas as mensagens que um dia ele enviou pra ela. Uma a uma. Da primeira, quando mandou um arquivo mp3 com a música “At Last”, até aquela da noite anterior, quando ela recusou um convite pra dançar. Sem ânimo pra mais nada, escutou a música.
At Last, my love has come alone, my lonely days are over, and life is like a song.
Depois resolveu olhar as fotos todas. Ele pequenininho, usando gravatinha borboleta e calça curta. A outra, diante de um bolo de aniversário, já adolescente. Uma em que parecia um rebelde do final dos anos 70, magro e cabeludo. E a última, já grisalho e usando óculos de grau.
Pegou o telefone e discou os primeiros três números do celular dele. Parou. Lembrou-se das palavras que ele um dia disse, indiferente, à dor que ela sentia: “me compreenda ou me espere, tanto faz”. Lembrou dos seus acessos reiterados ao mesmo site de relacionamentos onde se conheceram. Desligou.
Começou, então, a escrever um e-mail que começava com: “At Last”. Achou ridículo, afinal ele jamais iria ler justamente em um final de semana. Se lesse poderia ser irônico ou fingir que nem leu. Deletou.
Acabou indo parar na barraquinha de pastel, onde os dois já estiveram juntos rindo e falando da vida. E o resto do dia foi de lembranças do passado recente. Um dia em que ela dimensionou sua falta de sorte no amor. Seus dias de solidão não terminaram.
I found a dream, that I could speak to. A dream that I can call my own.
Pegou o boné, calçou o tênis. Foi fazer a caminhada tentando parar de cantarolar “At Last”. Não foi sozinha, dentro de si estava a solidão e o amor que não podia apagar, deletar ou desligar. At Last!
(Texto de minha autoria, anteriormente publicado no blog Janela das Loucas, uma homenagem à cantora Etta James, que faleceu hoje).

O GRIFO, O RODO E AS ROSAS


Já notaram que eu só entro em confusão?
Trouxe trabalho pra casa, deixei pra tomar meu banho assim que terminasse e ia aproveitar pra lavar os cabelos. Estava já terminando quando ouvi um barulhinho meio assim: SHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHH... Parecia barulho de panela de pressão! Saí andando pela casa (quarenta metros quadrados, o passeio foi curto).
Era a torneira do banheiro aberta e correndo água sem parar. Outro dia um colar de continhas arrebentou enquanto eu estava me penteando na frente do espelho. As continhas encaixaram naquela gradinha do ralo da pia. Está meio entupida por isso. Quis fechar a torneira, não fechava de jeito nenhum. Então fui até o registro. Emperrado. E a água começou a cair pelo chão e ir pro corredor. Parecia uma cachoeira.
Joguei todas as toalhas de banho que tinha, pra fazer uma barreira. E nada da torneira fechar ou do registro fechar também. Liguei na portaria. Subiu o porteiro, o Zé. Não sabia o que fazer. Chamou a síndica. Ela veio e tentou também fechar a torneira e o registro. Nem a pau! Não sei de onde surgiu um vizinho, que nunca vi mais gordo, e sugeriu uma ferramenta que acho que se chama grifo. E foi assim que o porteiro conseguiu fechar o registro.
Ia fechando a porta do apartamento, quando apareceu a vizinha do apartamento em frente. Ofereceu-me um buquê de rosas vermelhas. Ganhou do namorado, com quem vive brigando e, entre atirar as pobres flores no lixo e presentar-me, escolheu a segunda opção. Então éramos nós: o grifo, o rodo e as rosas.
Enfim, eu de noite com um rodo puxando água, sem poder tomar banho de chuveiro. Tomei banho de canequinha e me sequei com a única toalha de rosto que sobrou.
As coisas meio resolvidas, mas eu com medo que tudo voltasse a transbordar. Vim de novo ao computador. Conversei com uma amiga no Facebook e a conclusão que tiramos disso foi que é melhor eu arrumar logo um marido, mas não qualquer um! O cara tem que saber fazer pequenos reparos domésticos, ou nada feito!
(Texto de minha autoria, anteriormente publicado no blog Janela das Loucas).

AMOR NO PRIMEIRO VERSO

AMAR


Enquete publicada em uma revista feminina online:

O que você acha melhor?
( ) Amar e não ser amado;
( ) Não amar e ser amado;
( ) Não sei responder.

Li incrédula. Pensei: tanta coisa importante pra ser abordada, mas que pergunta boba!
Continuei visitando as páginas da revista, mas o pensamento estava na tal da enquete. Voltei lá e cliquei: “amar e não ser amado”.Li: obrigado pelo seu voto. Resultado parcial: 68% acham melhor não amar e ser amado. 13% não sabem responder. 19% responderam o mesmo que eu.
Será que essa gente que votou tem noção do que é ser amado e não amar?
Vulgarizar assim o verbo amar. Como se amar fosse apenas romance, fosse algo breve, finito e casual.
Acho egoísta a situação de quem é amado e sonega amor. Não que sejamos obrigados a nos apaixonar por alguém que não desperta o nosso interesse. Porém, não devolver amor com amor, isso é coisa grave. O retrato da nossa humanidade.
Nem precisa beijar, dormir de conchinha. Nada disso, mas devolver um sentimento tão bonito com respeito, com um gesto de carinho, isso é questão de consciência.
Os desencontros amorosos estão pipocando pra todos os lados. Na “lagoa do Brejo”, nas telas dos computadores, nas ruas, nos lares. Quando o caldo entorna, isso pode lotar as varas de família dos fóruns.
Desamor. Ser amado pode incomodar. Pode significar ter um chiclete grudado na sola do sapato. Uma sombra que te lembra: eu te quero, mas você não me quer!
Transformar um ser que te pretende em amigo, amiga, isso é uma verdadeira arte. Requer respeito e uma dose de sabedoria.
O que é melhor? Talvez, seja melhor não saber a resposta. Mas não amar, isso é para os avessos a algo divinal.
Eu amo, ainda que não seja amada. Ainda que sem ter um par. Amo por simplesmente amar.
Desliguei o computador e fui caminhar no parque. Pensando no amor e nos 68% que preferem se fechar, que vetam o amor alheio, impermeáveis e confortáveis em sua recusa de ter no coração quem lhes tratou com devoção.
Amizade é amor. Amem! Ainda que sozinhos: amem! Porque sem amor não há beleza, nem encanto, nem poesia. Tudo fica em branco-e-preto. Portanto, vamos amar do jeito mais belo de todos: amar ao próximo!

26 de abr. de 2010




Stevie Wonder, You Are The Sunshine Of My Life.

PANE NO ELEVADOR


Hoje lembrei do "bombeiro_saradão", sapo do Brejo Perfeito. E tudo porque algo se passou no meu mundinho real. Explico!
Estava eu toda produzida. Salto 10, maquiagem, cabelos soltos, perfumada. Peguei a bolsa e chamei o elevador. Demorou, demorou... Chegou ao meu andar.
Lá dentro uma moradora de uns 99 anos de idade. Cumprimentei a senhorinha, apertei o botão do térreo. Desceu um andar e tudo ficou escuro, o elevador apagou e parou. E eu, que sofro de claustrofobia, pensei que o mundo ia terminar naquele momento.
- "Tia, a senhora está bem?".
- "Estou sim, acho que faltou luz".
Apertei o botão de emergência, não funcionou.
Comecei a gritar: - "SOCORROOOO, estamos presas no elevador!"
Nada, nem mesmo um único sinal de alguém por perto pra nos ajudar.
– "SOCORRROOOOOOOOO!!!".
E a velhinha ali, em silêncio, pensei que ela tivesse desmaiado ou morrido. Então uma luz fraquinha brilhou na escuridão. Fósforos, ela tinha fósforos na bolsa!
- "Tia, melhor não acender isso, vai que nosso oxigênio acaba e morremos asfixiadas?".
– "Você é burrinha mesmo, minha filha. Não vai acabar o oxigênio porque o elevador tem entrada de ar".
E eu de novo: - "Alguém me AJUDAAAAAAA!!!"
A vovózinha tão calma que me dava mais nervoso ainda. Tive uma idéia, telefonei pro número dos bombeiros. Uma atendente me disse que iriam enviar uma viatura com a máxima urgência.
Sentei no fundo do elevador, a senhora continuou em pé e riscando fósforos. A cada clarão um novo espanto, acho que ela sofre de Parkinson e tremia enquanto segurava os fósforos acesos. Pior, começou a cantar um hino de louvor evangélico. E eu pensei: é castigo divino, sei que é!
Mais de meia hora assim, ninguém apareceu. Pensei que o prédio podia estar pegando fogo! Achei que ia virar churrasco. Lembrei do meu filho, da minha mãe. Lembrei que não tinha pagado o seguro de vida e, bem feito pro "Credicoisa", não tinha ainda pagado a fatura o cartão de crédito também. E estava assim, aterrorizada, quando ouvi um uóóóóóóóóó... Eram eles, os bombeiros! Aí pensei... Hum... Eles ficam tão elegantes naquele uniforme. Será que virá um soldado bonitão, alto e forte pra me salvar?
Entraram no prédio, pude ouvir vozes de moradores e de heróis do fogo conversando.
- "Tia, é melhor parar de riscar esses fósforos, os bombeiros vão te dar a maior bronca". Ela parou, finalmente.
– "Senhoras, somos os bombeiros, estamos aqui. Fiquem calmas e sigam nossas orientações. Fiquem no fundo do elevador, não se aproximem da porta". A velha escorada na porta.
– "Tia, facilita, obedece o bombeiro, vai". Foi um custo, acho que ela é surda, estava cantando algo sobre Davi e Salomé, sei lá, creio que a dentadura dela estava frouxa, não compreendi uma só frase do que cantou, mas tinha "aleluia" no refrão.
Abriram a porta do elevador, estava entre um andar e outro. Entrou um bombeiro no elevador, ai, ai... E levou a tiazinha. Aí desceu uma mulher e me salvou. E eu, que nunca vi bombeira salvar gata, fiquei desolada. Não podia ter salvado a tia e ter deixado o bombeiro gostosão me salvar?
Enfim, nem tive um final feliz digno de Hollywood. Fui salva por uma mulher, ainda bem que...Argh... Eu não precisei de respiração boca-a-boca. Porém, hoje em dia somos nós, mulheres, que somos os super-heróis do planeta.
Então, parabéns aos bombeiros e às bombeiras e, Tia, quem brinca com fósforos, já sabe: faz xixi na cama. Melhor dormir de fralda esta noite.
Texto de minha autoria publicado no blog Janela das Loucas.

A SEMENTINHA DA AMIZADE


No Brasil, duas horas da manhã. No outro lado do mundo já tinha amanhecido. Que pena que a nossa tecnologia ainda não permite que a gente se transporte através do MSN até o nosso interlocutor. Fica a imagem, a voz tão boa de ouvir, o sotaque acentuado do brasileiro que está distante, mas que traz o sorriso lindo pra tela do meu computador.
Assim tem sido a “dissecação” de um sapo do Brejo, um homem comum com idéias divinas e incomuns. Observar seus gestos e entender seus sentidos, isso traz uma satisfação que só posso traduzir em um texto. Este um relatório sem muita ciência, mas com a alegria de ter encontrado alguém que eu sei, com plena certeza, de contato cibernético se tornará amigo real, logo que pouse novamente em solo tupiniquim.
Tenho observado a criaturinha brejeira com a alegria de quem foi presenteada pelo destino com o encontro de uma alma que se assemelha à minha. Podemos nos desconectar, mas eu sei que continuamos conectados. Assim são feitas as verdadeiras amizades, aquelas que se fortalecem na ausência. Passo a passo, pouco a pouco. Afinidade.
Dizem que amigos são a família que escolhemos, sem laços de sangue, sem o mesmo sobrenome. E esses, eu sei disso, nos compreendem sem julgamento. Aconteça o que acontecer, estarão conosco, ainda que morando no outro lado do planeta. Encontrar um amigo é tão gratificante que aqui estou, narrando uma história que é virtual, mas que é real.
Ganhei um presente que guardarei com a doçura e o cuidado de quem cuida de uma plantinha. Que se torne árvore com raízes profundas, frutifique, traga alimento pra nossas almas e nos faça ainda mais felizes do que somos. Algo belo e raro, um amigo é uma estrela que brilha forte no céu de nossas vidas.

24 de abr. de 2010

AO MEU PAR


Dizem que há dezoito milhões de criaturas perambulando pelo Brejo. Entre elas, Diva Latívia, contadora de histórias e estórias.
Quando perguntam há quanto tempo estou sozinha, penso no dia 30 de janeiro de 1961. A data do meu nascimento. Cheguei sozinha ao mundo. Uma aventura esta vida.
Estou sozinha há 49 anos.
Temperamento forte, ânsia por liberdade, avessa a tudo o que é fútil ou banal. Já fui casada, mas afinidade de alma é mais do que casamento com véu e grinalda, é igualdade! E isso eu procuro sem expectativa, mas sempre estive e continuo atenta. Existe essa alma afim, mas eu sei, ele está longe fisicamente de mim, não é um vizinho de bairro, nem é um colega de profissão. Um astronauta, talvez.
Difícil estar sozinha, muito mais difícil estar longe dele. De vez em quando preparo algum prato especial. Pra mim. Ao sentar-me à mesa penso nessa criaturinha, no quanto gostaria que estivesse sentado ao meu lado e fizéssemos um brinde ao nosso encontro, ou reencontro. Algo me diz que viemos do mesmo planeta, da mesma cidade espiritual ou da mesma constelação.
Mesmo sem ter jamais respirado o mesmo ar que ele está em algum lugar respirando, eu o sinto presente, ao meu lado. Um chinês, talvez. Um árabe que caminha pelo deserto do Saara, pode ser. Um africano descendente de príncipes que foram escravizados há séculos, quem sabe? Tudo o que sei é que ele tem asas, feito eu. E voa ao meu encontro quando a saudade aperta o coração.
Nos meus sonhos, ele me acalenta em seus braços fortes. Quantas vezes eu tentei sintonizar minha alma com a dele? Incontáveis as vezes. E eu sempre tenho resposta, naquele instante ele pensa em mim e minha alma ganha um beijo e um abraço.
Os espíritas acreditam que ele esteja em outro plano. Por que não? Talvez esteja me esperando entre nuvens. A única certeza que tenho é que ele existe e vamos nos encontrar. Livres, sem elos senão o afeto autêntico que nos une desde agora, vamos dar as mãos um ao outro e continuar a caminhada, infinitamente. Somos dois, mas juntos seremos apenas um.
Saudade, hoje senti muita saudade de você, meu amor, meu par, quero muito te reencontrar. Isso acontecerá no primeiro olhar. Vamos nos reconhecer e tudo será diferente, não estaremos sozinhos mais. Um dia...
Este texto é seu. Pra você, onde você estiver, meu par!

23 de abr. de 2010

BAILE DE MÁSCARAS ( Guilherme Arantes)




Guilherme Arantes. Como não falar dele no meu blog? Eu tinha 16 anos quando ele lançou Baile de Máscaras. Eu era uma garota, mas entendi a letra desta música. Duas pessoas que se encontram e formam o par. Daí em diante não são mais tão sós. Sou fã, essa é, na minha opinião, a mais bela das músicas do meu compositor preferido. Admiro e respeito quem é tão sensível e talentoso. Bela música. Espero que ouçam e gostem.

LOUCO ENGANO


Estava em casa, à toa, feliz da vida, quando tocou o telefone.
- Alô!
- Oi, amor.
- Quem está falando?
- Não está reconhecendo a minha voz, é?
- Não sei quem é você.
- Sou eu, querida.
- Eu quem?
- Pedro Ernesto.
- ...
- Norma, estou louco de saudade, quero te ver.
- Ah, você ligou errado, aqui não tem nenhuma Norma.
- Não faz isso comigo, Norma!
- Moço, meu nome não é Norma.
- Norma, eu faço qualquer coisa pra você voltar pra mim!
- Eu me chamo Diva!
- Diva, por favor, chama a Norma pra mim.
- Mas não mora ninguém com esse nome aqui.
- Por favor, Diva, é caso de vida ou morte.
- Tá, mas eu não posso chamar a Norma. Ela não mora aqui.
- Então me diz onde ela está morando!
- Eu não conheço nenhuma Norma!
- Eu sei que ela te pediu pra não dar o endereço, mas seja sensível!
- Olha, eu vou desligar.
- Não faz issssooooooo!!!
- Mas você ligou errado!
- Norma, por favor, volta pra mim!
- Sou a Diva!
- Diva, Norma, tanto faz. Volta pra mim!
- Pra que número você ligou?
- 999999999
- Ligou errado, o meu número é 000000000.
- Por que não me falou logo? Eu aqui perdendo tempo com você!
E desligou.

DIETA SENSACIONAL!


Ao nos encontrarmos no MSN fiquei surpresa. Há meses não conversávamos. Ligamos a webcam e não pude acreditar: ela estava magrinha!
E eu, tal e qual a maioria das mulheres, brigo feio com a balança. Perguntei qual foi a dieta, quem sabe servisse pra mim?
Não fez regime. A causa do emagrecimento foi o término do namoro, ou seja, sofrimento mesmo.
E eu fiquei admirada. Ela pode estar triste, mas o resultado estético foi sensacional! Em um mês acho que ela perdeu uns oito, dez quilos!
Tentei lembrar se emagreci tanto assim quando me vi solteira, mas a minha memória tem uma trava, um bloqueio que impede a recuperação desses dados. Esqueci tudo, ainda bem!
De tão surpresa, cheguei a elogiá-la. Estava de parabéns, poderia comprar roupas tamanho 40! E usar biquíni na praia!
Ansiosa pra desabafar a tristeza, ela contou em detalhes seu drama. E eu pensando no meu drama: quero emagrecer também!
Cheguei a uma conclusão: preciso com urgência arrumar um namorado e levar um fora no auge da paixão! Voltar a caber naquele jeans número 38 que está pendurado no meu guarda-roupa!
Fico até imaginando. Posso fazer luzes nos meus cabelos, bronzeamento, quem sabe eu apele pro botóx? Mas primeiro preciso encontrar quem irá me dar um chute na... Vocês sabem onde. Já posso me ver de biquíni pequenininho e na praia, o próximo verão será divino!
Acho que o candidato ideal pra missão “musa do verão 2011” tem que ser alguém recém-separado. É! Todo recém-separado não sabe ainda o que quer. Depois de um mês sente culpa pela felicidade atual e saudade da ex. Acaba voltando pra ela. Pode ser galinha também. Um bonitão que se ache a último bombom da caixinha. Ou então um desses executivos que viajam sem parar e não têm tempo pra namorada. Deve ser confuso, pensar na ex com mágoa. Se tiver filhos dependentes dele, melhor ainda! Isso! E ele deve ter na ponta da língua as seguintes frases: “eu não te prometi nada”; “não quero ser cobrado”; “você é louca”!
Esse é o perfil de quem vou procurar. A questão é que 90% dos sapos correspondem a esses requisitos, escolher não será fácil, mas prometo eleger um que seja romântico, a princípio afetuoso e que me enrole com conversas online e palavras bonitas.
O “homem ideal” é melhor que laxante, mais eficiente que horas a fio malhando na academia e a única contra-indicação é que, uma vez iniciada o plano, ele não poderá ser cancelado ou deletado.
Estão vendo só? Encontrei um lado positivo pra separação. Não vejo a hora de me separar novamente!

20 de abr. de 2010

O AMOR ESTÁ DENTRO DE VOCÊ!


Muito reclamamos sobre a ausência de amor em nossas vidas. Seja porque estamos solteiros ou porque achamos insuficiente o amor trocado com o par romântico.
Porém, amor é algo sublime. Significa desejar ao próximo a felicidade. Fazer o máximo empenho para ajudá-lo nesta vida.
O amor romântico costuma ser egoísta. O ser humano costuma ser assim.
É comum idealizarmos alguém, um sonho quase impossível. Um ser que deverá corresponder às nossas expectativas.
Aliada a essa idealização utópica, vem a intolerância. Ele ou ela terá que me fazer feliz, senão será trocado (a) ou dispensado (a).
Felicidade é uma dádiva, reside dentro de nós. É levando adiante a alegria de viver, sendo distribuída essa energia boa com mais pessoas, que somos felizes. Não adianta nada procurar fora de si. Mora dentro de você e não no seu ideal feminino ou masculino de par.
Quem está bem consigo mesmo, conquista a felicidade. Pode não ter muito dinheiro, talvez, mas é feliz.
Amor é muito mais que estado de paixão. Não causa frio na barriga ou taquicardia. É sereno e perene. Realiza-se na entrega, na oferta generosa de seu tempo, de seus planos, de sua vida.
Ninguém é obrigado a amar-nos, mas toda a infelicidade, de guerras a assaltos, de políticos corruptos a mazelas no trabalho e nos lares, ocorre por conta do desamor.
Algo que vem da alma. Independe de sucesso profissional, riqueza material, grau de instrução, nacionalidade ou cor da pele. O amor não tem currículo e nem cursou uma universidade.
Quem não é feliz, não ama. E quem condiciona o amor a algo, também não ama. Portanto, não é feliz. Eis a razão pra tanta solidão, tanta discórdia, tantos problemas graves que giram ao redor do planeta e das vidas dos terráqueos.
Uma simples florzinha, nascida no mato, é essência de puro amor. Generosa, simples, oferece a quem a observa a sua beleza e perfume, sem nada pedir em troca.
Assim deveríamos todos ser. Levando o sorriso, o auxílio que nada exige, o afeto sem expectativas.
O que seria de nós se o sol cobrasse algo em troca pra brilhar todos os dias? Ou se a chuva fizesse o mesmo? Nós somos por eles amados.
Pra quem procura o par esse deveria ser o exemplo a ser seguido. Ame sem esperar nada em troca. Ofereça o que tem de bom em si, sem esperar resultados.
O amor pode ser romântico ou não. Pode ser fraternal, por exemplo. Seja generoso, entregue o sentimento que está guardado somente sob condições e seja feliz. Floresça! Brilhe!

18 de abr. de 2010

MINHA CASA COR-DE-ROSA


A mais doce lembrança da minha infância mora em um casarão cor-de-rosa, amplo, com um imenso jardim. Junto ao portão de grades altas, de cor grafite, havia uma cerca de azaléias.
A pitangueira ficava no fundo do quintal, frutos docinhos, galhos delicados. Sob o limoeiro colocávamos a rede. No verão o espaço ganhava uma dessas piscininhas desmontáveis, uma folia que abrigava os quatro irmãos, crianças da vizinhança e, vez ou outra, até os adultos participavam.
A edícula de nossa casa era o escritório do meu avô. O aroma era de livros, algo em torno de dez mil, entre muitas prateleiras. Na sala dos fundos, havia a lareira que jamais acendemos. Nela brincamos de esconde-esconde algumas vezes. Bem em frente ficava o piano. Sobre o piano o quadro da minha bisavó. Mais adiante Peter Pan, um peixinho dourado, tornou-se o mais novo membro da família. Incrível, ele viveu quase seis anos!
Tínhamos papagaio, cachorros, gatos e passarinhos. O televisor era imenso, à válvula, ficava sob o quadro de Jesus Cristo. A sala de jantar era adorável, tinha a cristaleira. A poncheira de cor azul. Da janela podíamos observar a quaresmeira em flor. A campainha era de sinos e entoava um melodioso “ding dong”. Na copa a mesa era grande, sentávamos todos ali, nossas refeições eram preparadas por uma velha cozinheira, a Dona Ernestina. Lembranças ensolaradas, de tantos anos atrás.
O tempo passou, crescemos depressa. A casa foi vendida, tem um prédio no mesmo lugar. O flamboayant, que existia na calçada, caiu em um desses temporais de verão, mas ainda resta outro, da mesma época. Toda vez que passo ali em frente, fecho os olhos e faço de conta que o tempo não passou, que ainda estamos ali brincando, que temos oito anos de idade e a vida inteira pra sonhar.

17 de abr. de 2010

A HISTÓRIA DE MIRELA


Mirela é a mais velha. Depois dela nasceram mais dois irmãozinhos. Todos de olhos bem azuis, iguais aos dela.
Ela é ruivinha e usa trancinhas nos cabelos. Tem sardas no nariz.
Sua cores preferidas são vermelho e amarelo. Na caixa de lápis de cor, sempre são esses que primeiro terminam. Ela aponta até acabar.
Tem uma cachorrinha, o nome dela é Continha e seus pêlos são brancos feito neve. Vão todas as manhãs até à pracinha passear.
No frio, Mirela usa cachecol de lã , que sua avó tricotou.
No aniversário foi sua tia quem preparou seu bolo preferido, chocolate com cobertura de brigadeiro.
Ganhou de presente uma boneca Emília, de pano, que sua mãe costurou. Emília usa vestidinho verde, tem cabelinhos de fios de lã e seus olhinhos são de botão. É a sua nova filhinha.
Mirela adormeceu ouvindo uma cantiga de ninar. Sonhou que estava nas estrelas, levando Continha e Emília pra brincar. As nuvens eram macias, pularam até se cansar. Um sonho cor-de-rosa.
Boa noite, Mirela. Amanhã você vai acordar e irá tudo recomeçar.


Um texto incomum, porque não escrevo nada pra crianças, ou sobre crianças. 18 de abril, Dia Nacional do Livro Infantil. Foi na infância que tive a alegria de aprender a ler e escrever. Livros acompanharam minha vida toda. Isso se tornou um privilégio, nem todos têm acesso a boas escolas. Que a leitura seja mais estimulada entre as crianças, é o que espero.

16 de abr. de 2010

ACHADOS E PERDIDOS


Dois convites pra sair recusados, uma taça de vinho tinto pela metade e o computador ligado diante de mim. Sexta-feira, tu não estás santa!
Vida de Diva deveria, obrigatoriamente, ter glamour. Nada de louça pra lavar, supermercado por fazer ou fila de banco pra encarar.
A semana me superou. Foi mais louca do que eu. Ainda bem, agora é final de semana. Com direito a DVD e pipoca, caminhada no parque, encontrar alguns amigos e não arrumar o guarda-roupa, coisa que sempre deixo pro próximo final de semana.
O box do banheiro quebrou. Dona Marieta, minha faxineira, não soube explicar como aconteceu, disse que essas coisas não são de boa qualidade. Ou melhor, disse: “Dona Diva, essa porcaria de box não presta!” Culpou o box. E lá se foram cem reais pra arrumar.
Meu tapete da sala tem apelido. Floquinho! Sabem aquele cachorro do Cebolinha, das histórias em quadrinhos? Pois no Floquinho pode cair brinco, clipe, amendoim japonês, tampa de caneta. Com muita sorte o aspirador de pó vai capturar o objeto perdido. De tão felpudo poderia ser rebatizado: achados e perdidos. Ou perdidos e perdidos? Nesse tapete só não desaparecem os problemas.
Hoje tive a ingrata notícia. Meu aspirador de pó engasgou, travou, parou. Não funciona mais. Cheguei em casa, abri o recipiente que coleta a poeira. Lá estava uma colher de café, dois grampos de cabelo, uma meia de nylon ¾ de cor preta, uma borrachinha de prender o cabelo e, pasmem, uma nota de dez reais. E Dona Marieta disfarçou, cantou um hino evangélico e foi pra cozinha. Não, ela não fez aquilo. Claro que não. O aspirador de pó é tarado, comeu o Floquinho na minha ausência. Uma suruba divinal no meu apartamento, só pode ter sido isso. Existe outra explicação? Não. Fiz um interrogatório quase policial, ela chorou, fungou, enxugou os olhos no avental e entoou um hino de louvor da igreja que freqüenta.
Estava terminando o texto, resolvi abrir minha garrafa de Marquês de Borba, um vinho tinto português. Na minha adeguinha havia um espaço vazio. Procurei, revirei, já tinha falado meia-dúzia de nomes bem feios. Tive, então, a idéia de abrir a geladeira. E lá estava, suando na porta do refrigerador, o meu vinho tinto que custou mais de quarenta reais. Aberto e pela metade.
Está agora explicado o que aconteceu com a porta do meu box. Como diria Sherlock Holmes, elementar meu caro Watson! Dona Marieta encheu o latão de vinho do bom, com o aspirador de pó. Passou o aspirador até dentro da minha gaveta de bijuterias. Depois, foi tomar banho, entrou no box sem abrir a porta, quebrou o lacre com a cabeça. E não se lembra de nada.
Seu álibi é o louvor que canta desafinadamente. Um ótimo disfarce. Ela é a minha suspeita número um. O suspeito número dois é o Floquinho. Pode estar de caso com o aspirador de pó.

15 de abr. de 2010

INFINITO AMOR




Já fazia muitos anos que eles não se encontravam. A última lembrança que tinha era a porta da casa dele batendo atrás de si. Nunca mais se viram.
Quando ela foi ao seu encontro, tanto tempo depois, em uma fração de segundos toda a história passou, parecia um lindo filme em preto-e-branco.
O primeiro encontro, o primeiro beijo, a primeira noite, os finais de semana juntos, os primeiros planos.
O encanto foi interrompido quando ela o viu à distância, aproximando-se, onde marcaram o reencontro. O mesmo cenário de tantos anos atrás.
Lembrou-se da ausência inesperada. Isso intercalado com o sorriso dele, as palavras inesquecíveis que fizeram seu coração bater tão forte de felicidade. A briga que tiveram e o estampido da porta quase arrebentando.
Quando ele chegou a dois metros de distância, o sofrimento já tinha tomado conta do seu ser. Um mal-estar imenso a invadiu. A sintonia desapareceu, pairou no ar e se desfez nas primeiras frases que trocaram.
O coração parecia não bater. O sangue esfriou. Tudo o que conseguia lembrar era do adeus. O adeus. O adeus... A porta gritando ensurdecedora e ecoando em seus ouvidos.
O sorriso lindo se desfez. Enrugou a testa. Tornou-se formal.
Olhou-se no brilho dos olhos dele. E viu-se solitária e triste.
Era ele! Estavam a poucos centímetros um do outro! Mas ela não estava ali, tinha viajado ao passado. Na bagagem todas as lágrimas que chorou. E chorou... E chorou...
O adeus mora no infinito, onde somente as almas podem estar. Hoje, eles adormecem e se encontram em sonhos. Ali não há portas, apenas há prosa e versos. É lá que o amor se realiza, enfim, sem fim...

SAPO LELÉ


Era final do dia. Ainda estava fazendo relatórios do trabalho no computador. Tocou o meu celular.
- Alô, dra. Diva? A senhora pode falar?
Difícil alguém me chamar de “doutora”, apesar de na minha profissão assim sermos intitulados.
- Pois não, quem está falando?
- Dra. Diva, a senhora precisa me ajudar.
E eu sem entender nada, nada, nada.
- Quem é?
- Sou eu!
- Eu quem?
- Doutora, estou desesperado!
- Calma, qual é o seu nome?
- Preciso que venha aqui, venha depressa!
- Ir onde?
- Aqui!
- Moço, eu vou desligar, não sei quem é você!
- NÃOOOOO!
- Então diga quem é você!
- Eu sou eu!
- Tá, eu estou ocupada, tchau.
- Doutora, a senhora esqueceu de assinar a receita!
- Quê?
- Estou na farmácia, não querem vender o tarja preta pra mim!
- Xi, eu acho que você ligou errado.
- Não faz isso comigo, doutora. O farmacêutico está aqui, vai falar com a senhora.
- Alô, boa tarde, aqui é da Drogaria Socorro Emergente. Doutora Diva, a senhora não assinou a receita controlada do seu paciente e não poderemos vender o medicamento. O rapaz está alterado, sugiro que a senhora venha aqui para ajudar-nos a controlá-lo.
- Moço, “seu farmacêutico”, eu não sou a Dra. Diva, eu sou a Diva.
- Doutora, seu paciente está tendo um surto. Se a senhora não vier para cá imediatamente vamos ter que chamar o resgate para levá-lo.
E eu aqui, sem saber o que fazer.
- Tá, me deixa falar de novo com ele.
- Doutora, venha logo! Ele já bebeu um vidro de xarope pra tosse e está ameaçando tomar uma caixa de laxante que pegou na prateleira. Os clientes estão apavorados.
Expliquei que meu nome é Diva Latívia e que não sou médica psiquiatra, apesar de eu escrever textos muito loucos.
O farmacêutico teve a impressão que eu também estava surtada.
No dia seguinte recebi outro telefonema.
- Alô, Diva, sou eu.
Pensei: ai não! De novo?
- Pois não.
- Diva, a gente se conheceu no Brejo Perfeito. Sou eu, o Demerval!
Era só o que faltava, um sapo insano! – Oi, tudo bem com você?
- Tudo, Diva. Ontem eu ia ligar pra minha médica dermatologista e por engano liguei pra você. Ela também se chama Diva.
E eu só lembrando que não tinha sido exatamente essa a história na farmácia.
- Depois o farmacêutico conseguiu ler a letra ruim dela. Já comprei a pastilha pra garganta.
- Tá, Demerval, desculpe, mas eu preciso desligar. A gente conversa outra hora, pode ser?
- Posso ligar amanhã? Quero tomar um café com você.
Coitadinho, achei melhor não contrariar: - Ah, vamos sim. Beijo, tchau!
E depois ainda acham que sapo é tudo normal? Coisa de louco isso!
Troquei o chip do meu celular. Aliás, acho que vou jogar o chip anterior na lagoa do Brejo, pra afogar as lembranças de tudo aquilo o que surta e coaxa.

13 de abr. de 2010

QUADRILHA

Poema "Quadrilha" de Carlos Drummond de Andrade narrado por Paulo Autran.

MEMÓRIA MÍOPE


Estava saindo do supermercado quando escutei: - Diva? Você é a Diva? Nossa, menina, há quanto tempo!
Era uma senhora grisalha, cabelos curtinhos, um pouquinho acima do peso.
Respondi um “olá” reticente. Minha cabeça ficou a mil por hora. Quem seria aquela? Alguma amiga da minha mãe? Uma antiga professora do meu saudoso colégio?
Minha memória anda precisando de mais alguns “megas”. Pudera, vivo em São Paulo e é frenética a rotina desta diva.
Esbocei um sorriso.
- Estou bem, obrigada. E a senhora, como está?
Foi aí que entendi o tamanho do “fora” que dei.
Senhora? Ninguém merece ser chamada de “senhora” nesses meus momentos de amnésia divinal.
- Não está me reconhecendo?
Acho que meu sorriso transformou-se no oposto daquela propaganda de creme dental. De brilhante, branco e radiante transformou-se em apagadinho, amarelinho e mixuruca.
- Será que estou tão diferente assim?
A aflição começou a tomar conta de mim. Nenhuma pista, nenhuma dica, quem seria aquela mulher?
- Estudamos juntas no colégio, não lembra? Eu sou a Marisa!
Meus neurônios congelaram imediatamente.
- Diva, você morava em Perdizes, não é? Íamos todos os dias juntas à aula!
Céus! Pareceu impossível no primeiro instante. Aquela era a Marisa, que tem a mesma idade que eu, era bonitinha, magrinha, cabelos negros e longos. Aquela ali parecia a avó da Marisa!
Precisava de um argumento, ela jamais poderia desconfiar da minha decepção e surpresa.
- Marisaaaaaaa!!! Nossa, há quanto tempo! Você está ótima! Acredita que sem os óculos eu não vejo nada? Faz um favor pra mim? Pode ler aqui na embalagem se a caixa que peguei é de sucrilhos ou de sabão em pó?
Trocamos telefones, ela indicou um oftalmologista, um tal dr. Frederico. Ufa! Ainda bem que pensei depressa. Jamais me perdoaria se ela desconfiasse que ao reconhecê-la quase caí de costas.
Pensei em devolver a gentileza da Marisa com a indicação do meu cabeleireiro, mas pude me conter. Melhor não!
Ai a idade! Ao menos ainda consigo enxergar muito bem. Apenas ando um tanto desmemoriada. Só isso!
Vocês poderiam me dizer se há um tigre estampado na caixa do sabão em pó “Bruma Espuma”? Não? Então que desenho será aquele na caixa do sabão?
Acho que está explicado o motivo de hoje cedo eu ter despejado sabão em pó sobre a banana amassada com mel.
Dr. Frederico, oftalmologista, lá vou eu!

VAMOS DANÇAR?


Pra acabar de vez com o marasmo da semana, decidi retornar às aulas de dança de salão. Aquela coisa de bolero, forró e salsa. Subi as escadas que levavam à sobreloja de um centro comercial na região da Avenida Paulista.
A música que tocava era valsa. Três casais dançando. Recostei-me à parede, fiquei observando. Aproximou-se uma senhora gorducha, cabelos tingidos de loiro indefinido. Sorriu simpática, perguntou se eu gostaria de ter uma aula grátis. Não revelei que já fui dançarina de salão, aceitei a oferta.
Sentei e esperei a próxima aula. Aula básica de dança de salão. Entraram duas moças. Logo pensei: "acho que vamos as três dançar com a vassoura, onde estarão os sapos?".
O tempo foi passando, olhei pro meu relógio de pulso, a aula estava atrasada e ninguém mais tinha chegado à escola de dança. Comecei a me arrepender. Tanta coisa interessante pra fazer naquele sábado à tarde, por que eu não tinha ao cinema? Ou ido à livraria visitar as prateleiras que me encantam? Ou...
- Olá!
Voltei pro mundo quando escutei isso. Era um senhor com uns duzentos anos de idade, mas com o olhar mais doce que já vi.
- Você é nova aqui?
Coisa boa escutar que é nova em alguma coisa.
Começou a aula. Três mulheres e o senhorzinho.
Passinho pra frente, passinho pra trás. Um, dois, um, dois. E eu lá, indo e vindo.
A professora disse: -“ Muito bem, agora vamos tentar juntos. Américo, pode ajudar a Diva? Ensine à ela a giradinha”.
Nunca fui conduzida com tamanha leveza. Meu par, Américo, era um tremendo pé de valsa. Na segunda volta ao redor da sala ele pisava em nuvens. Extasiado, sentiu-se o rei da cocada preta. Estufou o peito, encolheu a barriga. Tirou do bolso um lenço Presidente branco e passou na testa.
- “Parabéns, mocinha, você aprende depressa”.
Até me achei nessa hora. Eu, mocinha?
Chegou um casal. Ele baixinho, ela uns dez centímetros mais alta que ele.
E nossa professora: - “Agora vamos todos dançar os primeiros passos de forró. Um, dois, um, dois. Devagar, prestem atenção”.
E eu lá, velha sabedora daquilo tudo. Um, dois, um, dois.
Não fiz a matrícula. Pra mim teria que ser um curso mais avançado, mas não tive coragem de revelar, isso quebraria o encantamento.
Foram duas horas divertidas. Adorei o lencinho do Américo. Todo homem deveria usar lenço. É um charme só!

11 de abr. de 2010

EU NÃO EXISTO SEM VOCÊ

Bela canção de Vinicius de Moraes na voz de Oswaldo Montenegro.

VINHO, JAZZ E ZUZUBEM!

Conheci Adeilson no tal do site de relacionamentos e fomos pro MSN onde começamos a travar laços de afeto e sincero apreço. Bonitão, olhos azuis, 47 anos. Na minha cibernética opinião, o homem dos meus sonhos. Médico ortopedista, divorciado e tocava piano. Marcamos o nosso primeiro encontro, passei o dia todo ansiosa, experimentei metade dos vestidos que tinha no armário, roupa alguma parecia perfeita para o mágico encontro com o candidato a senhor dos meus sonhos de felicidade. Chegou com seu carro importado, fomos a uma casa noturna ouvir jazz e blues. Pediu uma garrafa de vinho, eu na época tomando antidepressivos pra ajudar os pés no traseiro anteriores, fazia que bebia. O dito cujo tomou uma garrafa sozinho e pediu outra. Começou a explanar sobre o quanto é bom estar solteiro, as muitas mulheres que conquistou ao longo dos últimos anos, que não mais teria filhos, que não desejava novamente casar-se. Enfim, foi detonando a imagem que soube construir no MSN ali, diante de mim. No final da segunda garrafa, já bêbado e totalmente inconveniente, contou um erro médico que cometeu. Em seguida, perguntou-me com a língua etilicamente enrolada: - "Ô gata, zê num zenti tesão por mim? Num tem atrazão zexual por mim? Vamo pro motel... axim a gente pode xi conhecer melhor". Ah, minha Nossa Senhora dos Pares Perfeitos! O que de mal fiz pra merecer tamanho castigo? Talvez, tenha eu na outra vida lançado meus amores e amantes em algum poço de jacarés famintos e agora, nesta oportunidade de resgate, esteja padecendo nas mãos de um por um desses infelizes algozes espirituais. Levantei-me da mesa, agradeci o convite pra sair e fui embora sozinha. Dia seguinte tocou o meu celular, era Adeilson. - "Oi loirinha, ainda zangada? Vamos sair de novo?". Desliguei o telefone e tratei de excluir Adeilson do MSN. Ah os sapos... Eles podem adquirir a forma de garbosos cavaleiros, românticos guerreiros, nobres, poetas ou solitários. Porém, cedo ou tarde voltam pro Brejo, lugar onde o sinal da internet jamais deveria funcionar!(Texto de minha autoria, publicado no blog Janela das Loucas).

DIAS DE PIJAMA


- “Nossa que linda você na foto! Tem uma de corpo inteiro?".
Pronto, começou a odisséia de procurar uma foto em que o ângulo fosse menos desfavorável. De preferência luz diurna, porque a luz do flash parece escurecer meus cabelos. Mandei.
-"Muito linda na foto. Tem outra de corpo inteiro?".
Escolhi aquela em que apareço com a barriga pra dentro, peito pra fora e sorrindo segurando a respiração.
- "Linda, você é linda! Tem webcam?”.
Ai, ai, ai... Corri pro espelho. Como ligar a webcam de rabo de cavalo e pijama? Vesti uma camiseta, soltei os cabelos, passei um batonzinho. Liguei a webcam. Putz, os óculos. Esqueci os óculos! Tirei às pressas. Ele não ligou o som. Mudo. Letrinhas pareciam hieróglifos ao som da chegada das mensagens no MSN. O que terá escrito?
Eu e essa presbiopia (vista cansada, ou melhor, cegueira pós-quatro décadas de vida).
Não teve jeito, coloquei os óculos. Ele sorriu, passou as mãos nos cabelos grisalhos. Um charme só.
- "Pode se levantar pra eu te ver?”.
Danou-se! Eu estava ainda usando a calça do pijama! Larga, elástico frouxo, de listrinhas. Pedi um momento. Levantei da poltrona quase agachada e escorreguei até o quarto. Uma calça, eu precisava de uma calça... Peguei o jeans sobre a cama. A empregada lavou, passou e deixou ali. Tinha que entrar... Entra desgraçado! Lembrei que minha amiga Alice mandou por e-mail o falso regime da USP: um copo d´água de manhã, uma folha de alface à noite. No quinto dia pode comer uma maçã. Deixei o botão da calça aberto, cobri com a camiseta e voltei pra frente do computador. Doía o estômago. Queria respirar! Sentei novamente na poltrona. Cara-de-pau, linda, magra, poderosa e gostosa. Desfilei asfixiada pra ele me ver de corpo inteiro.
- "De quando é aquela foto?”.
Confessei, de fevereiro deste ano. Porém, vocês sabem... José Raylton teve diarréia e sumiu. Depois, Dona Bárbara Germânia, minha mãe, ficou dodói. Descontei a imensa tristeza em doces, salgados, azedos e amargos. Foram 8 quilos acima dos 59 kg de sempre. São os declarados 67 kg no meu perfil. Não inventei nada. Mas, as fotos todas são do tempo dos 59 kg, há 6, 7 meses atrás. E quem tira foto triste? Eu não! Já emagreci 4, luto pra emagrecer os outros 4. Ando quase desmaiando fome.
O moço foi educado. Continuou conversando comigo, eu quase roxa estrangulada dentro da calça apertadíssima.
Desligamos o MSN. Fui até o espelho mais uma vez. Sorri pra mim. Olheiras profundas de noites mal dormidas. Prendi os cabelos. Vesti novamente o velho e confortável pijaminha. Sentei no sofá. Peguei o controle remoto da TV. Assisti ao telejornal. A tragédia do planeta pareceu uma valsa perto do rock pauleira que estou vivendo. Desliguei a TV, liguei o rádio. O locutor: - "Como você está se sentindo hoje? Romântico?". Malvado rádio. Maldita webcam. Como pude um dia gostar de finais de semana? Fui tentar dormir. De pijama listradinho. Eu, meu mundo e nada mais!
(Texto de minha autoria, publicado no Janela das Loucas em setembro de 2009, aqui na íntegra sem modificações).

DEUSA E DIVA


Há meses vínhamos tramando um evento com o encontro dos colaboradores e leitores de um blog.
Não foi possível realizar o nosso plano, mas não esqueci o combinado.
Foi assim que, em plena sexta-feira fria e chuvosa na capital paulista, começo de noite, fui até o bairro do Itaim.
O primeiro encontro que tive com uma mulher, que conheci na internet. Minha amiga Isis.
Quase um ano trocando figurinhas no MSN, estava mais do que em tempo de nos encontrarmos ao vivo.
Quando a vi fiquei sem palavras. Incrível, mas a Isis é real!
Fomos direto pra um barzinho, o Bar do Arnesto. Ela foi de vodka com soda e eu de cerveja geladíssima. Uma deusa e uma diva, sentadas à mesma mesa.
Foram momentos incríveis, porque eu olhava pra aquela criaturinha diante de mim e mal podia acreditar. Estava ali a minha confidente, cúmplice de tramóias no Brejo, leitora mais assídua dos meus textos.
Um encontro alegre, que selou a nossa amizade.
E pares perfeitos, mais e mais eu acredito nisso, são os amigos. Não pedem nada em troca, senão a nossa presença, palavras e silêncios. Desejam a nossa felicidade, ajudam a tornar os nossos dias mais leves.
Aqui no mundo real há risos, lágrimas, momentos felizes e momentos tristes.
E textos, muitos textos escritos e textos que ainda serão criados.
Este texto é seu. Obrigada pela acolhida, afeto, por seu doce olhar e sorriso fraternal. Amiga do coração de açúcar. Desde ontem a vida ficou mais bela. Da tela do computador pra minha vida, seja bem-vinda minha amiga Isis!

SAUDADE NO PRESENTE


Desde pequenos aprendemos que saudade é algo que nos remete ao passado. Alguém, algum lugar, alguma coisa, mas descobri outra verdade. Hoje sinto saudade no presente, saudade de um amor que vive dentro do meu coração e perfuma a minha alma. Saudade daquele que me acompanha invisível, ou quase, pouco maior que uma foto 3x4, mas aqui, no meu peito, nas minhas veias, ao meu lado, latente, mas real. Esteve comigo do raiar do dia até o anoitecer. Do dia em que cheguei ao mundo até agora, sempre por perto mesmo não sabendo onde.
A Lua vem e vai e suas fases delimitam um estado de espírito que começo a conhecer. Às vezes ele chega de mansinho pra tocar jazz, blues, uma sinfonia que embriaga meus sentidos.
Dançar, sonhar, cada qual em seu lugar. Meu amor, meu par, meu bem querido é uma saudade presente. Tão perto de mim. Um dia após o outro, passo a passo, se aproxima aos pouquinhos, meu coração diz que sim!
É sutil a afinidade, que se revela na ausência, em silêncio e chega na brisa a esperança de finalmente quebrar a barreira do que nos distancia pra que se torne presente e dancemos felizes sob o luar. Igualdade. É o que há entre nós. Dois corações, duas almas, dois seres que não estão nem longe nem perto, sempre estiveram juntos.
Saudade de um momento do agora, de qualquer momento, de todos eles! Enquanto estou aqui sentada e pensando em você, que pensa em mim e me adora. Eu quero você, agora! Mas fica, não vá embora. Que todos os dias sejam agora. Até o fim, presente, desde o passado até o fim, pra sempre. (TEXTO ANTERIORMENTE PUBLICADO, AUTORIA DE DIVA LATÍVIA E QUICKY).

ERRÁTICA E GRAMÁTICA


Quando ela se fartou decidiu dar fim a tantas reticências...
Entre vírgulas o chamou. Surgiu um ponto de interrogação.
Em negrito e letras maiúsculas proferiu seu ultimato: ele deveria definir-se.
Abriu aspas e pontuou as entrelinhas.
O travessão foi bem colocado entre uma frase e outra.
Incrédula, escutou uma exclamação, ele não queria ser cobrado.
Abriu parênteses e definiu os limites do relacionamento.
Buscou um adjetivo que traduzisse seu desapontamento.
Dor talvez fosse antônimo de amor.
Desligou o celular e, sem despedir-se, atirou o objeto direto na parede.
O sujeito, agora sem muitos predicados, silenciou.
Sentimento singular, ao seu lado na cama um espaço vazio.
Lembrou-se dos momentos plurais.
Conjugou o verbo chorar e, quando secou a última lágrima, colocou um ponto final.
Foi adeus.