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Apresentação

Este blog nasceu no blog Janela das Loucas, onde assinava "Diva Latívia". Ali permaneci durante muito tempo, como autora principal das crônicas do blog. Redescobri que escrever é vital pra mim, guiada e editada por Abílio Manoel, cantor, compositor, cineasta e meu querido amigo. O Janela das Loucas não existe mais, Abílio foi embora pro Céu. Escrevo porque tenho esse dom divino, mas devo ao Abílio este blog, devo ao Abílio a saudade que me acompanha diariamente. Fiz e faço deste blog uma homenagem a aquele que se tornou meu irmão, de alma e coração. Aqui o tema é variado: cotidiano, relacionamentos e comportamento, em prosa e versos.







29 de jul. de 2011

CHÁ CALMANTE


Às vezes me pego pensando o que seria de mim, não fosse a ajuda tão valiosa de minha ajudante do lar, Zezé.Cheguei em casa no começo da noite. Cansada! Zezé, esquecida da vida, estava na sala, televisor ligado na novela das seis. O jantar, pelo aroma e som da panela de pressão, estava a caminho.

- Dona Diva, a senhora acredita em paixão da vida toda?

- Paixão? Não, Zezé. Paixão é feito foguete que sobe e depois desce.

- Aff, Dona Diva. Deixa o Seu Divo saber disso.

- Lavou a verdura pra salada, Zezé?

- Lavei alface.

- Vou agora tomar um banho, tempera a salada pra mim, por favor?

Olhou-me indignada. – Dona Diva, nessa novela tem paixão da vida toda e eu não posso perder o que vai acontecer. “Despois” eu lavo a alface.

Resignada, fui cuidar da minha vida. Uma hora depois, voltei pra sala. Zezé assistia ao telejornal.

- A senhora viu o que fez aquele deputado? “Robô” o dinheiro da merenda das “criancinha”, coitadinha das “criancinha”!

Suspirei, tentando não me zangar.

- Zezé, já temperou a salada?

- Vixe Maria, esqueci, “peraí” que já vou lá.

Depois do jantar, sentamos juntas na sala. A novela das nove rolava solta. Entre suspiros e comentários diversos, Zezé não se conformava com o descaso do mocinho, que parecia não querer nada sério com a mocinha.

Durante os comerciais, veio outra daquelas perguntas que ela bem sabe fazer. – Dona Diva, se o Seu Divo te falasse que não vai se casar com a senhora, o que a senhora faria?

- Eu daria um pé no traseiro dele, com certeza.

- Xi...

- Por que o “xi”, Zezé?

- É que ele não quer mesmo casar, então a senhora vai dar um pé no traseiro dele. Ainda bem que ele é gordinho, não vai doer tanto assim o pé, né Dona Diva?

- Ô Zezé, você já lavou a louça do jantar?

- Já vou lavar! Quer um chá pra acalmar?

- Pare de fazer perguntas, Zezé.

- A senhora tá parecendo aquela minha patroa japonesa. Japonesa? “Num” sei se era chinesa, coreana. Já sei, era japonesa mesmo!

- O que houve com sua patroa japonesa?

- Ah. Eu tinha uns catorze anos. A patroa todo dia colocava umas comidas na frente da “estauta” de um santo japonês. Um que é gordinho, parecido com o Seu Divo.

- Buda?

- Num sei não senhora o nome do santo. Então ela colocava as comidas. Bala, bolo, doce. E eu vivia com fome. Então eu ia lá e comia tudo. E a patroa ia na frente da "estauta" e falava "umas coisa" em japonês, rezava. Depois ela agradecia pro santo: - Obrigada, você comeu tudinho, tava com fome!

- Não acredito, Zezé!

- É sério, Dona Diva!

- A “muié” pensava que o santo tinha comido tudo!

- Ela nunca desconfiou de você?

- Desconfiô. Ela um dia disse assim pro santo: - Óia santinho, se um dia eu “discubri” que alguém “robô” sua comida, eu mato essa pessoa.

Não pude me conter. Ri muito!

- Dona Diva do céu! Morri de medo da “muié”. “Pidi as conta” e fui embora, “sebo nas canela”!

- Zezé, o que tem essa patroa japonesa a ver comigo?

- Hum... A senhora faz de conta que é boazinha, mas é brava pra caramba. Acho que se souber que eu deixei cair cândida na sua “brusa vermeia”, vai me matar.

-Você estragou a minha blusa nova?

- Num falei? Tô morta!

A noite terminou comigo bebendo um chá de camomila que ela preparou. Um chá calmante, pra eu esquecer os males que me assolam.

E eu aqui continuo a pensar: não imagino como seria minha vida sem a Zezé!

26 de jul. de 2011

MR. MAGOO!

Já que o meu problema é de visão, o melhor remédio é rir muito! Diva Latívia comete algumas trapalhadas dignas do querido Mr. Magoo. Assisti a alguns desenhos dele no Youtube. Demorei um tempinho pra encontrar este, algo do meu tempo de criança. Aqui está, pra você que, feito eu, curte desenhos animados dos bons tempos!



ÓIA QUE TI FURO OS ZÓINHO!


Por que os homens olham outras mulheres, que não a sua própria mulher?
Alguns diriam: olham porque têm olhos. Não são cegos, portanto olham!
Porém, há uma diferença abissal entre olhar e “olhar”. Tem homem que encara, praticamente esquece quem está ao seu lado e perde-se naquele olhar de cobiça, algo que chega a ser agressivo pra companheira, ou até mesmo pra mulher que é alvo da olhada.
Passei pelas duas situações, inúmeras vezes. Alvo de olhares e vítima do olhar alheio. Ciumenta nata, não suporto ser a vítima. Hoje cedo, Divo ao volante do carro e eu, sentada no banco de passageiro. O semáforo fechou e, na pracinha da igreja, lá ia uma loirinha de seus 20 e poucos anos. Meio gordinha, cabelos longos e lisos, vestido desses de malha agarradíssimo, curtíssimo, meia-calça fio 70 de cor preta e botas. Idade para ser filha caçula de Divo, quiçá a neta. E ele, esquecido de mim, fez aquele movimento ingênuo de quem imagina não ter sido flagrado. Os olhinhos de Divo moveram-se para a esquerda, prenderam-se naquele rotundo traseiro, nas pernas roliças da garota. E eu, com a testa coçando, fiquei calada. Rapidamente avaliei o tamanho do transtorno, 9h00, um dia todo pela frente. Não quis chamar sua atenção, ele negaria, eu me irritaria e o pau quebraria. O farol abriu, o trânsito nos segurou antes de dobrarmos à esquerda na avenida. Novamente ele olhou. A expressão facial era de um bobo babão.
Por que os homens são assim? Eu sei. É comportamental, ainda mais em um país que muito mais valoriza o traseiro do que o cérebro feminino. Os machistas diriam: pudera, loirinha, novinha, vestidinho curto? E eu digo: ela tem o direito de vestir o que ela quiser. Já Divo, não tem o direito de perder assim o controle de seu olhar, ainda que equivocadamente de modo discreto. Sempre resta uma indagação angustiante: se age assim ao lado da mulher, o que é capaz então de fazer na ausência dessa mulher?
Mulher pode tornar-se vingativa. A roupa que hoje eu vestiria era um terninho de lãzinha fina, algo ideal para a temperatura fresca deste dia de inverno. Decidi usar um vestidinho com um decote um pouco mais pronunciado. A saia é esvoaçante, hoje está ventando. Um casaquinho para equilibrar o frescor do modelito. Salto alto, caprichei na maquiagem. Vou agora trabalhar, um ambiente austero, que exige compostura. Sentirei o peso dos olhares para meu traseiro. E Divo? Divo foi trabalhar de terno e gravata. Elegante, mas nada sensual. Eis a vingança feminina!

UM PALMO ADIANTE DO NARIZ


Meu ritual diário inclui encontrar o tema do próximo texto que publicarei neste blog. Ontem, caminhando apressada pelo centro de São Paulo, surgiu uma ideia: elevador. Ri sozinha, enquanto evitava o esbarrão de ombros desconhecidos, as calçadas esburacadas e os carros apressados. Lembrei de um episódio recente, ocorrido no dia em que precisei entregar com urgência um documento em um edifício desses modernos, na região da Avenida Paulista. Minha visão está com problemas. Acreditei durante muitos anos que a tal catarata fosse doença típica da velhice inevitável. Minha avó, aos 90 anos de idade, padece desse mal. Quando fui ao oftalmologista, imaginei que precisasse mudar a lente dos meus óculos. A visão cada dia pior, um tanto turva. E eis o diagnóstico: catarata. O médico explicou que a origem desse problema não se limita ao avanço da idade, mas a outros fatores, tais como o uso de corticoides e lesões oculares. Várias vezes perguntou: você sofreu algum trauma na região do rosto? E eu, que já fui criança levada, que já levei alguns tombos e cacetadas durante a vida, quis lembrar quando foi que bati a cabeça? Muitas vezes! Mas, sou cabeça-dura. Portanto, sobrevivi. A cirurgia será em breve, finalmente voltarei a enxergar as letrinhas miúdas que digito.
Volto ao tema do meu texto. Ri sozinha, enquanto caminhava pelo centro da cidade de São Paulo. Feito um filme, aquele momento ocorrido há poucos meses passou em minha lembrança. Meus passos cuidadosos, para não voltar a torcer o pé em algum buraco da rua. Não vejo, portanto sofro pequenos acidentes com frequência. Caminhei pela Avenida Paulista e cheguei ao endereço que buscava. Na recepção do prédio entregaram um desses crachás eletrônicos. A primeira dificuldade foi imediata, o elevador estava no andar térreo, parecia estar à minha espera. Não havia ascensorista e nenhum outro passageiro me acompanhava. A porta fechou e o bicho começou a subir. Procurei os botões para registrar o andar que desejava: 8º andar. Não encontrei os botões. Tentei encontrar meus óculos na bolsa. Nada! Dentro da minha bolsa guardo de tudo: carteira, maquiagem, pente, espelho, lenço de papel, celular, chaves, sombrinha, balinhas, pinça de sobrancelha, muitas moedas e até protetor solar. Parecia um daqueles sorteios, com os olhos vendados, mãos dentro da bolsa, eu tentava encontrar a caixinha de óculos. O elevador parou em um andar. Um rapaz jovem, não mais que 20 anos, entrou. – Moço, não encontro meus óculos. Você pode apertar o botão do 8º andar pra mim? Pois o garoto começou a rir. – Não tem botão!
Fiquei perplexa! – Você não registrou o andar antes de entrar no elevador?
- Não...
- HAHAHAHAHA!
- Tá rindo do quê?
Eu estava furiosa, zangada comigo e com minha pouca visão. Imaginei que fosse um elevador comum, mas era um desses trambolhos modernos, era preciso digitar o número do andar antes de entrar no elevador. Embarquei em uma espécie de ônibus que passaria do meu ponto. Desci no mesmo andar escolhido pelo rapazinho. Pedi: - pode registrar pra mim o 8º andar, estou sem meus óculos. Ele registrou e foi-se, mal escutou quando eu agradeci. Outro elevador chegou, esse com duas mulheres que conversavam animadamente. Não foi pro 8º andar, desceu até à garagem. Novamente saí do elevador. Resolvi revirar minha bolsa, à caça dos óculos. Encontrei o carregador do celular, até que enfim. Encontrei uma oração de Nossa Senhora Aparecida. E encontrei duas canetas que considerava perdidas.
- Senhora, posso ajudá-la?
Um segurança, desses morenos fortões, 4X4.
- Por favor, não encontro meus óculos, você pode me ajudar a chegar ao 8º andar?
- Pois não. Basta esperar o elevador A, ele vai levá-la ao andar.
- É que eu não consigo encontrar meus óculos.
- Então vou acompanhá-la.
Senti imenso alívio, um guia fortão para conduzir-me ao 8º andar.
No trajeto do elevador, finalmente encontrei meus óculos. Assim que os coloquei na pontinha do nariz pude ver meu anjo da guarda. Um homem de meia-idade, cabelos começando a nevar. Olhos muito castanhos, sorriso largo. Esperou que eu entregasse o documento na empresa que eu procurava e, depois, acompanhou-me até o andar térreo. Agradecida, estendi minha mão e o cumprimentei: tenha um ótimo dia! Muito obrigada!
Ainda há gentileza e cavalheirismo nesse mundo. Começo a entender como se sente uma velhinha que recebe auxílio para atravessar a rua: feliz! Sinto ser a versão feminina de Mr. Magoo!

22 de jul. de 2011

MENOS? PAUSA!


Acordei no meio da noite. São Paulo em pleno inverno, temperatura baixa. Pijaminha de flanela xadrez de vermelho e branco, meias nos pés. Coberta com um edredom e, para completar, Divo que, de tão quentinho, lembrava um pãozinho doce saindo do forno. Perfeito! Perfeito? Comecei a transpirar. O calor não parecia vir da atmosfera. Descoberta, já sem as meias, escorria suor do meu rosto. Fui até à cozinha, precisava com urgência do socorro de um copo d´água. Olhei pro refrigerador. Abri a porta e, se eu lá coubesse, teria me encaixado entre as prateleiras. Ali, ao lado dos potes contendo as sobras do jantar, o iogurte e as latinhas de cerveja de Divo. Peguei um cubinho de gelo do freezer e passei em meu rosto. Um gesto insano, talvez instinto de sobrevivência. O apartamento gelado, tentei calcular a temperatura. Talvez 10C lá fora, não mais que isso. Em frente ao espelho do banheiro, notei minha face avermelhada. Que calor! Tal e qual em um micro-ondas, a quentura parecia vir de minhas entranhas e concentrar-se na cabeça. Minha cabeça estava pegando fogo! Fogo!!! Não resisti, entrei no banho, molhei meus cabelos longos e respirei aliviada. Duas horas da manhã, noite fria. Divo ainda adormecido, sono pesado de causar inveja. Quando desliguei o chuveiro, a incandescência inexplicável parecia ter desaparecido. Sequei os cabelos com o auxílio do secador. Barulhão. Voltei pra cama sentindo novamente o frio da madrugada. Tremendo, acomodei-me pertinho do quentinho Divo. Adormeci.
Esqueci o episódio até que, dias depois, em pleno almoço de domingo, aquela inexplicável onda de calor atacou novamente. Comecei a transpirar, pensei no inferno. Dei uma desculpa, fui até o banheiro. Resisti ao chuveiro convidativo. Abri a torneira da pia, molhei meus pulsos e meu rosto. Não passava. Os pensamentos confusos, que raios estaria acontecendo comigo? Estaria doida? Tentei me recompor. Passei o resto do dia cismada. Minha saúde excelente, então o que estaria acontecendo? E eis que uma ideia sussurrou algo pra mim: MENOPAUSA!
Fiquei deprimida. Cinquenta anos de idade, rostinho de não mais que quarenta , porém o cronômetro da idade é um vilão implacável e não se deixa enganar pela aparência. Velha? Quis chorar. Na primeira oportunidade chorei sem parar. Aliás, andava chorando por tudo e por todos. Irritada, os cabelos caindo, uns centímetros a mais em minha circunferência. Amaldiçoei meus hormônios. Corri ao médico. – Diva, você tem sentido calor? Ondas de calor que parecem subir até à cabeça?
Bingo! Menopausa mesmo! Agora, com a reposição hormonal via um gel que aplico diariamente nos braços, a coisa está relativamente sob controle. Já não choro à toa, nem sonho em entrar na geladeira no meio da noite. Tenho repetido pra mim o seguinte: faz parte, hoje em dia as pessoas vivem até os 80 anos ou mais. Portanto, é apenas uma fase.
Incrível, há algumas décadas uma mulher nessa fase que enfrento se parecia com uma anciã. Gordinha, curvadinha, cansada. E eu, que tenho fôlego de gata, pique pra ir à balada, que visto o mesmo manequim de sempre, só percebi que o tempo passou quando o calor chegou.
Pois que seja. Há muito pela frente. Acho, preciso rever meus conceitos. Sempre imaginei que, ao chegar nesse degrau da minha vida, eu estaria prestes a bater a caçoleta: velha e caduca! Tudo bem, sou meio caduca sim, mas isso faz parte do meu DNA, algo nato. Eis aqui uma garota de meia-idade. Meia? Bem, se eu viver até os cem anos, é meia-idade mesmo! Ainda penso feito adolescente. Sonho os sonhos da juventude. E o espelho, generoso comigo, não me reprova jamais.
Seja bem-vinda, menopausa. Faça de conta que a casa é sua, mas apresse sua visita, ou terei que deixar uma vassoura virada atrás da porta, antiga simpatia para afastar visitas indesejáveis. Coisa do tempo da vovó, que não tinha o recurso do gel hormonal, dos adesivos de hormônio e, aos 50 anos, tornou-se uma velhinha. Santa medicina moderna! Que Deus abençôe toda a tecnologia e todo o avanço médico do mundo atual. Por essas e outras, acho a vida um grande “barato”! Menos? Pausa! Prefiro o “muito” e sem essa de pausar! Gosto de agitação, de folia e de alegria. Quero tudo, quero mais! Avante!

20 de jul. de 2011

FELIZ DIA DO AMIGO!


Hoje, dia 20 de julho, Dia do Amigo.
O mais belo sentimento que podemos levar em nossos corações é o amor. Não digo amor romântico, simplesmente esse amor. Falo sobre o amor ao próximo, o amor fraterno. Ter afinidade, identificar-se com outro ser. Algo belo, que não depende de laços de sangue ou da paixão dos enamorados. Amigo, amiga. Perto ou longe, a amizade perdura. Anos mais tarde encontramos aquela pessoa que estudou conosco no colégio, na faculdade. O ex-vizinho que passou a infância ao nosso lado. E os laços de afeto ali intactos, o amor preservado apesar da ausência física desse alguém. A amizade aquece nossos dias. Palavras, gestos, compreensão, aceitação. Amigo nos quer do jeito que somos, sem desejar nos transformar em alguém ao seu modo, ou esperar demais da gente.
A verdadeira amizade atravessa toda a vida, ainda que a gente perca o contato com o amigo. Fica nas lembranças boas, nas fotos antigas, faz parte da gente. O amigo é o que somos, a isso se acrescenta uma estrelinha. Nós estrelados. Para rir, para falar, para calar, para nada fazer, para dar uma forcinha, para ouvir, para sentir, para esperar, para chorar ou para sonhar. Amigo nos ajuda a viver! Quem tem um amigo, que seja apenas um amigo, tem a sorte de não estar sozinho. Ao contrário do amor romântico, que cobra, exige, espera retribuição e exclusividade, a amizade é generosa e entrega-se sem muita expectativa. Doação. Amigo pode estar ao nosso lado, ser encontrado diariamente. Pode estar longe, em outra cidade ou país. A amizade persiste, ainda que à distância.
Amigo é pra sempre. Amigo é imortal. Amigo não morre, continua presente nas lembranças, bem guardado no coração da gente. Amigo não vai embora. Amigo não se torna ex. Esse o amor mais gostoso, feliz, positivo. Amigos tornam a gente alguém melhor, todos os dias, sem nada esperar em troca senão a nossa felicidade. Deixo aqui uma frase de Vinícius de Moraes: “a gente não faz amigos, reconhece-os”.

19 de jul. de 2011

TANTOS CRIMES! ATÉ QUANDO?


Li rapidamente o noticiário na internet. Há tempos evito assistir aos telejornais. A violência parece adentrar em minha sala. Ler possibilita a seleção do que quero ou não quero saber. Alienada, talvez. Meu coração já não é o mesmo. O tempo passou, ficou mole e bobo. Choro quando assisto à injustiça, à maldade, à violência.
Desde que fui vítima de um sequestro-relâmpago, tudo mudou. Parece que em mim havia uma certa inocência. Parecia imune a todo o mal. Quando alguém contava que foi assaltado, eu agradecia aos céus jamais ter sofrido algo semelhante. Pedia a Deus proteção a mim e a todos os meus. Até o dia em que escutei algo assim: - perdeu! Perdeu! Fica quietinha, cabeça baixa, não se mexa! Eram dois bandidos armados. O sequestro demorou mais de duas horas. Sacaram o dinheiro que conseguiram de diversos caixas eletrônicos em agências bancárias. Reviraram minha bolsa, queriam a senha do cartão de crédito. Quem tem senha de cartão de crédito? Mal conseguia lembrar a senha do cartão de débito, tal o medo que sentia. Pensava no meu filho, em pessoas que amo. Pensei que fosse morrer. Por fim, me largaram em uma rua escura, não levaram o carro. Fui chorar semanas mais tarde. Tive crise de pânico, não conseguia mais sair sozinha à noite. Aquele bairro, Moema, evitei durante vários meses. A vida voltou aos pouquinhos ao normal. Já o mundo, parece que jamais voltará ao normal!
Estava aqui, selecionando com o olhar as notícias mais leves. Não foi possível evitar uma notícia que causou em mim indignidade, pra não dizer nojo! Pai e filho, abraçados, juntos em uma feira agropecuária. Esses inúteis que têm agredido homossexuais, confundiram o pai e o filho com um casal gay e os agrediram. Estão machucados, por sorte estão vivos.
Então, quer dizer que ser gay merece agressão? Já não basta ser discriminado, precisa apanhar, talvez morrer? Quer dizer que andar de mãos dadas com alguém, abraçar, beijar, isso significa que seja um par romântico? Quanto preconceito! E se fosse um casal gay? Quem tem algo a ver com a opção sexual das pessoas? Cada qual faz sua escolha, não é da conta de ninguém se alguém é homossexual, bissexual ou heterossexual!
As nossas leis são muito brandas. Recentemente, com a mudança do Código de Processo Penal, eu que cursei uma faculdade de Direito, até me senti um tanto envergonhada. Ao invés de punir de modo exemplar quem comete uma série de delitos, ao invés de trancafiar em presídios aqueles que colocam a segurança de pessoas de bem em risco, mudaram tudo pra muito pior. É o caso de quem causou um acidente de trânsito com morte e pode pagar fiança e responder ao processo em liberdade. Permissividade! Frouxidão! Que país é este? Onde estarão aqueles criminosos que me sequestraram? Certamente continuam por aí, sequestrando.
Se amanhã eu sair pela rua e abraçar uma amiga, segurar sua mão, poderemos levar uma surra, talvez a gente morra. Amar o próximo, demonstrar afeto, escolher sua opção sexual, viver sua vida, nada disso podemos mais fazer. Cada dia mais e mais estamos acuados. Presos em casa, com grades. E lá fora os bandidos fazem o que bem querem. Estão protegidos pelas leis flácidas, pelo policiamento insuficiente, enquanto nós, que pagamos impostos, somos cidadãos brasileiros, não temos mais proteção alguma!
Já decidi, não vou mais ler notícias. Toda vez que assisto ao telejornal, choro de tristeza ou de raiva. Esse não é o mundo que meus pais desejaram pra mim, nem é o mundo que entreguei ao meu filho. Simplesmente porque somos pessoas de bem. Será que o mal vence o bem? Pois creio que, do jeito que anda a carruagem, logo estaremos em um mundo irrespirável, insuportável, detestável. E a culpa disso é nossa. Votamos errado nesses sujeitos que aprovam leis em benefício próprio. Em quem não está nem aí pra nós, muito menos pro mundo em que vivemos. A culpa é da Justiça? Difícil responder. Os processos se acumulam mais e mais. Não há funcionários suficientes. E os nossos impostos? Boa pergunta, especialmente quando precisamos pagar convênio médico porque os hospitais públicos deixam muito a desejar, quando pagamos colégio particular para nossos filhos, porque as escolas públicas costumam também deixar muito a desejar.
Moral da história. Estou revoltada. Comigo! Vou rever meu voto. Nas próximas eleições, aquele que apresentar um projeto bem elaborado e que dê mais segurança a São Paulo, terá o meu voto. Acompanharei cuidadosamente todo o seu trabalho, pra que cumpra o prometido. Afinal, o sujeito estará lá pra me representar.
O mundo só será bom e decente, quando o ser humano for bom e decente. Sem tamanha podridão, sem tamanha estupidez. Espero que quem cometeu o crime contra o pai e o filho vítimas da agressão, seja preso e permaneça preso por longos anos. Quimera, delírio, o cara está solto. Hoje em dia, só mesmo os ladrões de galinha vão assim presos. Os bandidões estão soltos, imunes a qualquer punição. Ou então pagam uma fiança qualquer e voltam pra sua vida desonrosa.
Como dizia minha mãe, vou mais é mudar pro mato. Plantar galinhas e criar couves. Viver o resto da vida em meu mundinho particular. Sem mais ler notícias, sem mais navegar na internet, sem mais assistir à televisão. Já que não posso transformar o mundo sozinha, vou me isolar em um castelinho cor-de-rosa, um faz-de-conta digno de uma ermitã. Não posso mais conviver com seres que matam por matar, roubam por roubar e depois ganham aquilo o que se tornou pra nós, gente de bem, algo limitado: a liberdade. Que mundo é esse, que abraçar um filho, abraçar um pai, pode ser alvo de agressão de criminosos? Que mundo é esse afinal?
Deixo aqui o link com a notícia sobre a agressão ao pai e ao filho.

http://g1.globo.com/bom-dia-brasil/noticia/2011/07/confundidos-com-casal-gay-pai-e-filho-sao-espancados-em-sao-paulo.html

16 de jul. de 2011

DIVO NA COZINHA


A odisseia do final de semana prossegue. Divo levou o carro pra lavar, no caminho resolveu passar no supermercado. Homem no supermercado? Excelentes donos de casa levam a listinha com os itens necessários para comprar. Divo é o cara do improviso. Chega no supermercado andando devagarzinho e vai direto pro setor de frios. Escolhe, escolhe. Pede salaminho e prova. Pede queijo prato fatiado e prova. Feliz, segue pra padaria. Compra pãezinhos quentinhos e vai pro açougue. Ali, a coisa fica complicada. Entende de cortes, peças, sabe exatamente o que vai comprar. Demora que é um horror! A fila aumenta atrás de si. Indiferente às reclamações dos demais clientes do supermercado, Divo compra de tudo um pouco. Jamais uma ida ao supermercado demora menos de uma hora. Jamais! O carrinho fica lotado quando passa no setor de bebidas. Cerveja, vinhos, cachaça, vodca. Haja paciência pra acompanhar Divo nas compras. Pois ele foi ao supermercado, assim que saiu do lava-rápido. Trouxe algo esquisito. Disse que é barriga de porco. O chamado torresminho. Puro colesterol! Imediatamente protestei! Fez-se de surdo e foi pra cozinha. Escolheu justamente a panela que eu havia separado para cozinhar a verdura. Óleo, sei lá mais o quê jogou lá dentro e eis a tal da barriga de porco fedendo absurdamente! Pensei: ecaaaaaa!!! Feliz, permaneceu na cozinha tempo suficiente para eu tramar este texto. Zangada, a cozinha estava tão limpinha! Gordura pra todo o lado, o exaustor a toda potência! E eis que o interfone tocou. Era Severino, o porteiro. – Dona Diva, posso pedir um favor?
Imaginei que os vizinhos estivessem furiosos com o odor exalado pela tal da barriga de porco.
- Pede pro Seu Divo dar um pouco desse torresminho? O cheiro está tão bom!
E eu aqui, escrevendo e tentando não provar a guloseima. Engordativa, engordurada. Chegou a caipirinha. Como resistir? Olhei pra tábua de passar roupas, ali jazem meus afazeres. Vou mais é me fartar!

SONHAR


Sábado ensolarado! A pilha de roupas pra passar pisca faceira pra mim. Eita vida besta! Fujo pro lado oposto e esbarro no notebook. Internet lenta! Tenta, tenta, tenta! Finalmente uma conexão! Péssima, mas dá pro gasto. Entro na página do blog. Um anúncio colorido diz que há apartamentos novos em um bairro bastante interessante. Clico. Informações pelo chat, direto com o corretor. Não posso comprar nada, a casa está à venda e não vende nem com reza brava.
- Bom dia, Sra. Diva!
- Bom dia, Sra. Corretora!
- Posso ajudá-la?
Ai! Toda vez que alguém pergunta “como vai?” ou “posso ajudá-la”, preciso me conter. Vou mal, estou sem grana, a casa não vende, Divo deixa todas as camisas sociais pra que eu passe no final de semana. O sol brilha, apesar do meu involuntário enclausuramento neste apartamento. Pra piorar, pode sim me ajudar: socorro!
- Vi um anúncio. Um apartamento de 2 dormitórios, lançamento no bairro da Vila Ensolarada. Espaço gourmet, suíte, cozinha americana. Qual é o valor?
- Senhora, temos ainda uma unidade. Vou verificar a disponibilidade e o valor. Um momento, não desconecte!
Vivo desconectada. Pedir que eu não desconecte é o mesmo que pedir ao sol, que parece indiferente às minhas adversidades momentâneas, que pare de brilhar!
- Há duas unidades. Uma na cobertura e a outra no primeiro andar.
- Qual o valor?
- A cobertura, 1.250.000,00. O primeiro andar, 820.000,00. Que tal?
Que mau!
- Tem no oitavo andar?
- Infelizmente, senhora, temos apenas as duas unidades que informei.
- Quero a cobertura!
- Por gentileza, deixe o seu telefone pra contato.
- XXXX-XXXX.
Forneci o celular do Divo. Ele não está em casa, saiu pra levar o carro pra lavar. Todo sábado o carro vai pro lava-rápido. E eu passo roupas. O sol brilha. A internet cai. E o blog bomba! Acho, quase comprei um apartamento. Só falta o dinheiro, mas isso pertence ao mundo dos mortais, sou Diva Latívia, que sonha e transforma ideias em textos. Eis meu apartamento, imaterial, churrasqueirinha no terraço, área de serviço que comporta a imensa tábua de passar. O girassol pertinho da janela. E eu, dona de casa, na cobertura onde a internet deve ao menos funcionar. Sonhar, sonhar, sonhar! E a roupa lá, pra passar. O sol a brilhar. O carro a lavar. A internet a despencar. Sonhar!

15 de jul. de 2011

ANTIGA INFÂNCIA


Não havia dúvida, aquele menino era terrível. Esse o adjetivo que os adultos mais utilizavam. Havia outros: danado, capeta, levado, sapeca. Filho mais novo de uma família numerosa. Temporão. Aos sete anos de idade, sua extensa lista de traquinagens incluía uma foto que havia tirado da avó tomando banho. Sorrateiramente entrou no banheiro e clic! O flagrante foi registrado com a câmera fotográfica esquecida sobre a mesa da sala de jantar. Em tempos da lei da palmada, seus pais estariam em apuros se fizessem o prometido: dar-lhe umas belas palmadas no traseiro. Porém, tudo isso aconteceu há décadas e, naquele tempo, palmadinhas no bumbum eram normais. Entre uma chinelada e outra, entremeada com horas a fio de castigo no quarto, o garoto não parava de tramar a sua próxima estripulia.
No aniversário ganhou da tia um embrulho com papel colorido. Rasgou apressadamente. Dentro, um brinquedo que fez seus olhos brilhar de contentamento: O Pequeno Químico. Frascos contendo líquidos que prometiam fórmulas sensacionais, entre elas algo chamado “sangue do diabo”. Foi nesse dia que a garagem de casa explodiu. Correria, susto, aflição. O garoto com os cabelos arrepiados, os olhos esbugalhados. Sorriso de satisfação, algo similar à descoberta da pólvora. O kit de química foi confiscado pelo pai.
A infância transcorreu com muitos arranhões, algumas fraturas, dois dentes quebrados e cicatrizes que hoje ostenta orgulhosamente. Aos cinquenta anos de idade, o garoto cresceu. Seus filhos, contemporâneos da lei da palmada, não levam chineladas. No máximo, ficam de castigo, sem poder acessar a internet. Nenhum deles ganhou um brinquedo contendo elementos químicos. Moravam em um edifício com muitos apartamentos, não havia um espaço reservado para brincar, senão o playground. Nenhum era terrível, apesar da força da herança genética. Talvez, por esse motivo, resolveu mudar-se para o interior, desejava ver os filhos correndo descalços, subindo em árvores.
Na primeira semana, o mais velho foi picado por um inseto e teve uma forte crise alérgica. Na segunda semana, o outro filho caiu ao tentar escalar uma mureta. E ele, já arrependido, suspirou resignado. Nada daquilo se parecia com a sua infância, quando os machucados não eram seguidos de choradeira, mas sim de orgulho pelo “mal feito”. Lamentou a mudança dos tempos, a modernidade dos dias. Na sua época de menino, infância era sinônimo de balão em junho, bombinhas dentro de latas, bola de meia, figurinhas no concorrido “bafo”, bolinhas de gude, frutas colhidas e saboreadas direto do pé, carrinhos de rolimã. Observou à distância seus filhos sentados à frente do computador. Sentiu saudade da simplicidade de um tempo que não voltará nunca mais.

DIA DO HOMEM


O televisor ligado no telejornal. Bem cedinho, a xícara de café forte em minhas mãos. Sexta-feira, véspera da melhor fatia do bolo semanal: sábado e domingo. Amanheci esperançosa: o dia passará depressa, logo será noite e poderei suspirar aliviada. Bem-vindo, final de semana!
O noticiário rolava solto na TV. Tragédias, acidentes, problemas políticos e econômicos. O sono parecia querer vencer o meu despertar. Olhei pro relógio desanimada. Hora de ir trabalhar. Rumei em direção à cozinha, busquei outra xícara de café. No caminho de volta para a sala, escutei o locutor do telejornal dizer que hoje é o “Dia do Homem”.
Homem que é homem não precisa provar a macheza pra ninguém. Homem que é homem não tem força nos punhos, mas no coração. Homem que é homem chora, se emociona, sorri feito menino e tem brilho no olhar. Tem uma pitada, maior ou menor, de romantismo. Se apaixona, fica bobo, vira poeta ainda que sem versos a registrar. Gestos, manias, o jeito de andar, sorrir e falar. Homem, desde menino, tem um encanto particular. São metades do nosso universo, que fica incompleto sem o par. Avô, pai, filho, irmão, sobrinho, primo, amigo, namorado, marido. Ah, vocês dão um trabalho imenso, mas sem vocês a vida não teria graça! Parabéns, pelo seu dia, garotos! Isso merece uma comemoração. O dia é de vocês, a conta é sua! Onde hoje vão nos levar?

12 de jul. de 2011

UM SORVETE E UM ROMANCE


Mas ela tinha essa mania! Toda vez que algo ia mal em sua vida, corria pro shopping center e se empanturrava daquele sorvete duplo, com muita cobertura de chocolate e castanhas moídas sobre tudo. Se o problema a deixasse ansiosa, um sorvete apenas não bastava. Munida de seu cartão de crédito Mega Ouro Plus, comprava novos sapatos. Sandálias de salto altíssimo ou simples sapatilhas, isso tanto fazia. Caminhava pelos corredores, admirava as vitrines das lojas. Às vezes entrava no cinema, escolhia algum filme romântico, desses com final feliz. Ela se imaginava no lugar da mocinha, suspirava a cada cena tórrida de amor. Há quanto tempo não era beijada? Havia perdido as contas. Seu último namorado a tinha deixado em uma discussão banal, sentados em um café na pracinha da igreja. Briga boba, nem lembrava mais por qual motivo. Dois anos? Não, talvez três. Todo esse tempo sozinha, nem um namorinho ao menos.
Um dia foi ao casamento da prima de uma amiga. A noiva com aquele vestido tão branco, estava bonita. O noivo pareceu baixinho, mesmo assim sentiu uma pontinha de inveja. A maioria de suas amigas estava casada, algumas já tinham filhos. E ela, aos 34 anos, começava a se conformar com a situação, morava sozinha, viajava desacompanhada e não mais sonhava com um príncipe encantado. De vez em quando ficava deprimida. Imaginava o resto da vida igualzinho ao dia de hoje, sem ter companhia pra dançar, ou pra ir ao teatro. Pensava um pouco e concluía que sua situação estava melhor que a de sua vizinha, que vivia brigando com o marido. O sujeito voltava tarde da noite pra casa, a briga começava depois da meia-noite. Melhor ser solteira, não ter namorado, do que passar por algo semelhante. E, pensando assim, sentia um certo alívio com sua realidade.
Certo dia o celular tocou e era seu ex-namorado, o Marco Aurélio. O coração bateu descompassado. Acreditem se quiserem, ele ligou por engano. Trocou o seu nome, Cidinha, por Camila. Pediu desculpas e desligou. Francamente, ela se sentia a última bolachinha do pacote, aquela que ninguém come, ninguém quer. Bolacha mole, rejeitada, em um pote sem tampa. De tão sozinha nem se preocupava mais em depilar as pernas no inverno. Quem iria ver a situação? Ela e, talvez, o espelho preso à parede do corredor.
Naquele dia de inverno, o céu estava nublado. Deu uma vontade louca de tomar sorvete. Lá foi pro shopping, pediu logo a taça maior, com aquele biscoito crocante, e caprichou na cobertura. Não sei se foi a garganta, ou se foi a digestão. O sorvete caiu muito mal. Sentiu-se febril, assim que voltou pra casa. No dia seguinte, não tinha melhorado, o corpo doía e não conseguiu sair pro trabalho. Resolveu ir ao pronto-socorro. E foi lá, sentada na salinha de espera, que ela o viu pela primeira vez. Todo vestido de branco, o estetoscópio pendurado no pescoço. Doutor Henrique. Depois da consulta sua vida mudou completamente. Paixão à primeira vista. Dias depois foram juntos ao cinema. Aquela cena de amor que tanto a fazia sonhar, saltou da tela. Lá estava ela, a protagonista de um romance água com açúcar. A solidão saiu de fininho, na pontinha dos pés. Agora os sorvetes são compartilhados, duas colheres na mesma taça. Ela e o doutor, juntos em uma história de amor.

QUEM AMA ASSUME!


O que aconteceria se agora, neste exato segundo, a vida acabasse, a morte vencesse o corpo e me levasse subitamente? Eu deixaria pessoas que amo, palavras que não disse, contas que não paguei, projetos interrompidos, sonhos que não se realizaram. Quantas vezes, ainda que sem notar, escapei da morte? Nem sei. A certeza é que, um dia, ela virá pra mim, assim como infelizmente ela chegará pra cada um. Espero que demore bastante!
Minha mãe dizia algo sobre o amor romântico, aquele amor que ofertamos ao nosso par: nunca faça de alguém o sol de sua praia, porque um ser humano tem vontade própria e, ao contrário do sol que brilha de modo generoso, esse alguém pode parar de aquecer seus dias, partir e deixá-la na escuridão.
Acho que ela sabia muito bem o que dizia, era alguém experiente. Entregar o coração a alguém oferece riscos. Ninguém sabe o quanto vai viver, quanto mais o quanto poderá durar um relacionamento. Desejamos que seja infinito, mas na verdade, nesta vida, infinito é algo que não existe. Tudo termina um dia, de um jeito ou de outro.
Achou desagradável o tema? Desculpe leitor, desculpe leitora. Porém, estou pensando na brevidade da vida, na fragilidade dos relacionamentos amorosos. Tanto tempo, tanta dedicação, tanta energia voltada pra um ser, aquela namorada, aquele namorado, aquele marido, aquela esposa. E tudo pode virar passado sombrio, basta uma puladinha de cerca, uma paixão clandestina ou mesmo a descoberta de que “o amor acabou”. E o fim, que jamais foi esperado, chega sem aviso prévio. Já era o relacionamento!
A gente investe no amor, talvez seja o investimento mais arriscado e mais pesado de todos os que fazemos nesta vida. Escolhemos um par, oferecemos exclusividade, nada de transar com outra pessoa. Engolimos alguns sapos, talvez pessoas agregadas a essa pessoa. Tentamos superar as dificuldades, as diferenças. Comungar os mesmos sonhos e planos. E o fim um dia chega, ainda que a morte seja a causadora desse fim.
Vale a pena sofrer porque alguém nos abandonou, traiu, foi embora, desistiu? Evidente que é doloroso, mas há pessoas que parecem não conseguir superar esse fim! Até chegam a encontrar um novo alguém, mas vivem pela metade, amam pela metade. O fantasma da ex-criatura os assombra. O medo de quebrar a cara de novo não os abandona, feito uma sombra. E esse alguém não consegue ser totalmente feliz e, muito menos, fazer o seu par feliz. Por medo, puro medo de sofrer novamente. Alguns se acham espertos: não vou mais casar, nem morar junto, isso não serve pra nada. Quero mais é cada um na sua casa, sem muito compromisso. E é justamente esse tipo de pessoa que jamais fará seu par feliz, afinal ele está pela metade, ele não supera a própria dor, não conseguiu florescer depois da tempestade que ocorreu em sua vida. Não mais investe, não mais se envolve totalmente.
A vida passa ligeiro. Não adianta imaginar que vai demorar pra envelhecer, porque a gente envelhece bem depressa. Os filhos crescem, casam, os netos nascem. Porém, parece que nem isso modifica o medo de certas pessoas. Continuam batendo na mesma tecla, aquela nota desafinada que só pensa em “si, si, si” e em seu medo: “dó, dó, dó”. Não saem do lugar.
O amor foi feito pra quem é simples de coração. Não pra quem planeja o amor com gráficos, estatísticas e cálculos. Quanto mais sofisticado o planejamento amoroso, tanto maior a chance de fracassar o relacionamento. O amor é pra quem anda descalço, pra quem sente a brisa bater no rosto, pra quem ri de si mesmo e admira o nascer do sol. Tem poesia embutida no amor, tanta que os poetas ainda conseguem, de modo inédito, escrever mais e mais sobre o tema. Inesgotável, assim é o amor.
Quem tem medo, quem não se entrega, quem calcula os passos, não é feliz. Isso serve pra investir na bolsa de valores, não no coração. Isso é ótimo pra atravessar a rua, não pra namorar, ou pra manter um bom casamento. Quem ama sonha, quem ama faz planos, quem ama não evita o compromisso.
Escrevi isso tudo pra lhes dizer que quem ama não sofre, nem faz sofrer. Quem ama não se magoa, nem magoa o par. Quem ama é feliz e leva a felicidade. Sem precisar oferecer presentes caros, sem precisar escrever coisas bonitas. O amor, por si só, é lindo. Imagine isso aliado à simplicidade do dia-a-dia.
Amar sem medo, essa a fórmula mágica, simples, natural de ser feliz. Quase todo o resto a gente compra no shopping.
Outro dia eu estava olhando as minhas comunidades no Orkut. Pouco entro naquele site, hoje em dia temos o tal do Facebook, ou Facecoisa, como diz Diva Latívia. Notei uma comunidade, da qual faço parte há algum tempo: "me assuma ou suma". Um tanto radical a frase, talvez. Porém, acho que o caminho é mesmo esse. Quem não assume, não deveria brilhar nem por um segundo na vida de alguém. É um sol que está fadado a esfriar, eis o que minha mãe dizia: ninguém é o sol da praia de ninguém!

10 de jul. de 2011

PESADELO


A fera que em mim habita amanheceu inquieta, despertou-me antes do sol raiar. Afiou as garras, mostrou os dentes pontiagudos, rugiu. Fugiu de mim, libertou-se inesperadamente. Fingi não reparar, ocupei-me com afazeres banais. Lá estava o bicho, a observar meus passos, persistente. Meus pensamentos observados, meus gestos acompanhados por seus olhos amendoados, sem brilho, olhar opaco. A fera que adestrava diariamente escapou da jaula. Capturá-la requeria cautela e habilidades muitas. Isolamento, reflexão, estratégia. Angústia! Fitei longamente seus olhos, contendo meus piores instintos. Aproximei-me cuidadosamente, sem hesitar, sem retroceder meus passos. Estendi a mão lentamente em sua direção e chamei-a com o tom de voz firme, sem revelar qualquer temor. Passo a passo, mais e mais perto, contendo meu pior inimigo: o medo de mim. Senti o odor de seu hálito, o calor de seu corpo gigantesco. Afaguei-a, aproximei-me tanto que, praticamente, nos tornamos uma só. Trouxe-a de volta pra dentro de mim, no mais obscuro labirinto de minha consciência. Lugar seguro, inofensivo, trancafiada novamente. Despertei aliviada, enfim sã e salva, a fera adormecida, enjaulada novamente. Um pesadelo! Sonhei ter fugido de mim.

9 de jul. de 2011

A TIA E A FESTA JULINA


Sempre quis saber quem inventou essa tal de “festa julina”. Pensava o seguinte: não basta festa junina? Julina não existe! Assim foi, até o dia em que minha sobrinha pediu que eu preparasse uma festinha julina, pra ela receber os amigos da faculdade. Comecei os preparos pela listinha do supermercado: ingredientes para o bolo de fubá, muito milho verde, pipoca, carne para o churrasco, legumes e verduras para a salada. Grifei algo que não dispenso: farinha para a farofa. Aliás, farofa é comigo mesma! Já estava no supermercado, quando ela telefonou: - Tia, compre cachaça, vinho e tudo o que precisar pra preparar quentão e vinho quente.
Meus pensamentos foram direto pro risco da coisa: bebida alcoolica e moçada, vai que de novo bebo e tenho amnésia? Mas, o que não faço pra alegrar minha família? Comprei tudo, do gengibre ao cravo e canela.
Final do dia, poucas horas antes do começo da festinha. Já tinha pendurado bandeirinhas de São João pela casa toda. Um custo encontrá-las. Subi e desci a ladeira daquela rua central de São Paulo, de loja em loja. Pouco havia restado do material destinado às festividades juninas. Por fim, encontrei não apenas o enfeite procurado, mas também balõezinhos e aquelas biribinhas, ou estalinhos. Pareceu perfeito!
De chapéu de palha na cabeça, com rendinha e longas trancinhas loiras, lá estava eu no fogão, preparando vinho quente e quentão. Receitinha simples, encontrada na internet. Açúcar, cascas de frutas, maçãs picadas. Para o quentão, gengibre fatiado bem fininho. Provei. Achei doce. Coloquei toda a garrafa da cachaça. Deixei apurar mais um pouquinho, em fogo brando. Provei novamente. Bom demais! Servi-me um copo. O frio daquele final de dia deu lugar a um calorzinho bom! Chegou a vez do vinho quente. Abri 2 garrafas de vinho tinto e segui as instruções passo a passo. Provei. Faltava canela. Juntei a especiaria e provei novamente. Eita que estava delicioso! Busquei uma caneca, caprichei na canela em pó e sentei-me confortavelmente na cozinha. Que calor, nem parecia inverno! Achei que o vinho quente poderia ser incrementado com mais maçãs. Piquei algumas, juntei à bebida. Melhor provar! Tão bom, mas achei melhor desta vez não misturar quentão com vinho quente. Prometi a mim que não misturaria nada, que apenas beberia o vinho quente. Mas, o quentão estava tão perfumado. Deixei pra decidir o que escolher apenas na hora da festa. Não resisti, repeti o vinho quente.
À noite chegaram os convidados. A mesma turminha conhecida, os que me convidaram para acampar e também me conduziram à balada. – Oi, tia, não vai beber tequila hoje, heim?
Eles não perdem a piada. Não beberia tequila, afinal era uma festa julina! Momento de esquentar as bebidas. Quando provei o quentão, cismei que faltava mais cravo. E lá fui eu provar novamente, desta vez não resisti ao copinho.
A coisa subiu feito foguete. – Xente, tá pronto o quentão. Xes podem xe xervir!
Faltava o vinho quente. A imagem da panela parecia caminhar sobre o fogão. – Pára quieto vinho quente. Xe fica aí xenão te amarro!
- Tia? Você bebeu?
- Não, querida. Xó provei um golinho.
- Tia! Você está de pilequinho!
- Menina, xá falei que xó provei.
-Mas, Tia, você é fraca pra beber. Por que não me chamou pra experimentar?
- Xaco, xá te expliquei que não chamei e xá falei que xó tomei uma canequinha.
Quando me vi em frente ao espelho do banheiro, eu estava vermelha feito um pimentão. Lá fora, 10C de temperatura, mas eu fervia de calor. Meio descabelada, chapéu de palha torto na cabeça. Um horror! Lavei o rosto com água fria, respirei fundo. Que vexame! Teria sido o vinho quente, ou teria sido o quentão? Pra rebater, nada melhor que pipoca. E fui novamente ao fogão. A panela rodava sem parar. – Vai logo, vê xe estoura deprexa que hoje não tô legal!
Metade queimou, mas deu pro gasto. A moçada de vez em quando passava por mim e perguntava: - Tia, você tá melhor? E eu, no estado que estava, divertia a todos. Por fim, os preparos ficaram por conta dos mais jovens. Comi umas paçoquinhas, para tentar rebater o porre que tomei de maneira incauta. Fiquei enjoada. No caminho entre a cozinha e a lavanderia, passos sinuosos, eu pisava naquelas minúsculas biribinhas atiradas ao chão. A cada estouro, a moçada ria sem parar.
No final da festa, conforme se despediam, os garotos faziam gracinha: - Tia, semana que vem tem festa do peão. Sabe preparar caipirinha? Só o nome da bebida, já causava mal estar. Quando acordei, no dia seguinte, minha cabeça parecia um balão, flutuando solto no espaço. Cabeça oca! É nisso que dá preparar vinho quente e quentão, tudo ao mesmo tempo. Agora preciso adicionar à minha lista de itens proibidos essas duas bebidas. Listinha negra, na qual o primeiro ítem é a tequila. Falei sozinha, em alto e bom som, pra ver se memorizo e jamais esqueço: “vinho quente e quentão, juntos não os beberei nunca mais”!

5 de jul. de 2011

AI QUE FRIO!!!


A temperatura aqui, na cidade de São Paulo, está baixa. Frio, muito frio! O sol aparece durante o dia, aquece quem ali permanece. Porém, dentro de casa ou dentro de um escritório, não há o calorzinho bom do sol. Meus ossos resolveram protestar, amanheci com os joelhos se recusando a colaborar: emperrados! Quando entrei na cozinha, parecia ter entrado na geladeira. Mirei a pia, com um pouquinho de louça que deixei para lavar hoje cedo. Vontade de chorar! Porém, quem garante que, se eu chorasse, não derramaria pedrinhas de gelo face abaixo? A conta da luz chegou, abri. Depressa atirei a fatura pra dentro da bolsa. Hoje irei ao banco pagá-la, antes que Divo descubra que aumentou 20% o consumo de energia elétrica. A culpa disso? O aquecedor de ambiente, que permanece no meio da sala. Não temos lareira, que ele entenda que houve economia de lenha: uma despesa pela outra.

Há algumas semanas cismei que o frio seria inesquecível. Abri o guarda-roupa e de lá tirei casacões que sequer imaginava usar em uma viagem nacional. Gorros de lã, luvas, cachecóis, aquelas meias de lã grossas. Andaram rindo de mim: vai pro Polo Norte? E hoje, quando acordei, já enrolada em um xale de tricô, percebi mais de uma coisa. A primeira é que acertei na previsão do tempo. A segunda, percebi ao passar na frente do espelho usando óculos de grau, envolta em um xale, toda encolhidinha de frio: estou parecendo a vovozinha. A terceira é que, apesar da elegância das roupas de inverno, tanto frio não me faz bem. Para digitar este texto, com os dedos enrijecidos pela baixa temperatura, precisei remover as luvas.

Ah, quem me dera fosse hoje feriado. Um chocolate quente, cobertor, um filme na TV. Mais tarde, um delicioso prato preparado no fogão, acompanhado de uma taça de vinho tinto. Sonequinha durante a tarde, até acordar sem pressa. Chá mate, uma fatia de bolo de fubá. À noite, aquela sopa de queijo que preparo dentro do pão italiano. E mais vinho, claro. Porém, hoje, terça-feira, é dia útil. No horário comercial estarei dentro do prédio gelado onde trabalho. Encapotada, parecida com a mulher que veio da neve. Sem vinho, sem cobertor, sem televisor. Quem sabe o chá eu consiga providenciar. Eita vida dura essa de paulistana friorenta!

Há quem esteja atribuindo a mim essa queda na temperatura. Um alerta: oi! Sou a Diva, não a Deusa! Gosto do frio, escrevi sobre isso, mas não modifico a temperatura, por absoluta ignorância em matéria de alteração da natureza. Jamais, em minhas cinco décadas de vida, experimentei tamanho frio. Toda temperatura extrema é desagradável. Em uma cidade feito a minha, a São Paulo cercada de asfalto e concreto, no verão o calor torna-se insuportável. Acho que não gosto de passar sufoco algum. Nem pra mais, nem pra menos. Ando mais elegante, desfilo casacos, lenços, roupas de lã que são a última moda. Mas, amanhecer parecendo uma velhinha, com o esqueleto emperrado, isso ninguém merece. Pois que volte o calor, mas que não me faça transpirar. Sem escaldar minha pele alva, sem derrubar minha pressão arterial. Quero sombra e água fresca. Se assim for, eu topo! E ai de quem, dentro de poucos meses, se queixar do calorão. Será, então, a minha revanche! Reclamarei muito!

Agora, com licença. Vou encarar o gelado escritório. Bom frio a todos e, para aqueles que apreciam o calor, desejo calma. Nada melhor que um dia após o outro. O verão há de voltar. Neste momento, em minha cidade, o termômetro marca 11C. Coragem, Diva, coragem! Coragem, leitor, coragem!

3 de jul. de 2011

FINAL FELIZ EXISTE?


Há um tema que sempre volta aqui, em meus textos. Um assunto complexo e que considero ao mesmo tempo subjetivo e objetivo: casamento.

Desde crianças, nos contos de fadas com final feliz, aprendemos que para casar com alguém é preciso amor. Esse o sentimento mais puro e nobre que alguém pode carregar no peito e entregar a alguém. Cinderela conseguiu essa façanha, de Gata Borralheira transformou-se em princesa, mas penou horrores até conquistar a etapa final. Lavou chão, aturou a madrasta e as irmãs malvadas, foi inicialmente impedida de ir à festa no castelo do príncipe e, não fosse a ajudinha extra da fada-madrinha, sequer teria conhecido o ser amado. Na vida real não existe fada-madrinha e, falando sério, homem não é príncipe, mulher não é Cinderela.

Na adolescência costuma acontecer o primeiro amor, aquela paixão inesquecível. Tira o sono, tira a fome, tira a concentração da gente. Sonhos, delírios, uma experiência vasta com emoções marcantes. Quase sempre fica apenas na lembrança, o ser amado torna-se adulto e segue sua vida, muitas vezes sequer temos dele, ou dela, uma só notícia, isso anos e anos mais tarde.

É tudo aprendizado, o amor romântico ensina muito, incansavelmente e, para ser mais exata, durante toda a vida. Um namoro começa, aos poucos a névoa da paixão se dissipa. Nesse momento resta apenas a dupla, sem muitos floreios. Lá estão ambos, do jeito que são. A expectativa de realizar o tal do final feliz, coisa incutida em nossas cabeças desde a infância, começa a tornar-se um desafio, afinal o príncipe esperado é apenas um cara normal, com manias que podem ser desagradáveis, planos futuros que podem ser individuais. Idem quanto à amada, que bem pode revelar-se alguém cheia de “defeitos” aos olhos de seu par. Eis que, então, a sorte está lançada! Será possível amar alguém sem jogar sobre esses ombros os sonhos, as ilusões, os traumas e as enormes expectativas? Amar sem iludir-se, sem responsabilizar integralmente o parceiro, ou parceira, pelo sucesso ou insucesso do relacionamento? Complicado.

Tenho ultimamente escutado algo: pra quê serve casamento, se hoje em dia a lei não mais protege de modo eficaz aqueles que se casam? Isso depende não apenas do ponto de vista de cada um, mas creio que das intenções verdadeiras de cada um. Há pessoas que não se casam legalmente, que vivem juntas e, sabemos disso, unir-se a alguém não significa simplesmente assinar um papel, um contrato. Para unir-se a alguém é preciso vontade, disposição, determinação e mesmos objetivos. Sim, o amor é essencial, mas esse amor não é puramente romântico. E é aí que reside o X da questão. Para conservar o relacionamento, o casamento, é preciso ser mais do que marido, mais do que esposa: é preciso ser amigo de seu par. Vou tentar explicar o que penso a respeito disso que falei. A vida é uma sequência ilógica de surpresas, boas e ruins. Voltarei à estória da Cinderela. Já imaginaram se, ao dar à luz ao primeiro filho, a Cinderela tivesse engordado 20, 30 kg? Ela teria perdido aquela silhueta delicada, cinturinha tão fininha. Certamente, seu pé que coube naquele minúsculo sapatinho de cristal, ganharia nova numeração. Andaria menos disponível para o príncipe e sempre às voltas com o bebê. Talvez, para compensar essa “perda” temporária da esposa, o príncipe começasse a sair mais com os amigos, navegar durante a madrugada na internet, achasse algo que aliviasse a mudança que ocorreu em seu casamento. Algo parecido com o que, algumas vezes, acontece na vida real?

Quanto mais alguém se relacionar com o par, melhor haverá de conhecê-lo, mas para efetivamente conhecer alguém é necessário passar por diversas situações juntos. Portanto, para saber se um casamento vai dar certo, se um casamento terá durabilidade ou não, é preciso viver esse casamento. Não adianta nada assinar um papel achando que isso será garantia de felicidade. Nem adianta também não assinar nenhum papel imaginando que isso será garantia de imunidade emocional ou material, para o caso de não dar certo o relacionamento no futuro. O ideal seria casar-se desejando que tudo corra bem, mas sabendo que poderá não durar até o final da vida, até porque não somos eternos, somos mortais.

Imagine um lago bonito, água aparentemente límpida. Dia ensolarado e quente. Vontade de mergulhar e refrescar-se. Coloca-se na água a pontinha do pé – fria – imagina-se, então, se naquele lago a água é muito profunda, se há algum jacaré, algum peixe com dentes afiados, talvez uma serpente venenosa? Tira-se então o pé da água, lembrando que é perigoso nadar em local desconhecido. Vai embora suando, derretendo sob o sol. Para trás de si o lago, com sua profundidade e riscos não assumidos. É perigoso? Depende. Como se diz por aí, em rio que tem piranha, jacaré nada de costas. Porém, viver é assumir riscos necessários e assumir as consequências de nossas atitudes. Se acontecer um afogamento, por exemplo, a culpa não será do lago, mas algo natural. Se acontecer uma insolação, por falta do refresco necessário, será responsabilidade de quem, sabendo que água e sombra são fundamentais para a sobrevivência, preferiu não refrescar-se naquele lago. Por medo do desconhecido!

Assim é o casamento.Ainda que sejamos bons nadadores, bons remadores, a qualquer momento, ainda que décadas mais tarde, poderemos prender o pé em alguma pedra, tronco, poderemos ter câimbra e virá o afogamento. E de quem será a culpa? De ninguém. Relacionamentos são assim, feitos a cada braçada. Se um dia chegam ao fim é porque não somos personagens de estórias infantis. Somos seres humanos, de carne e osso, gente de verdade. Nem tudo é pra sempre, ao nosso modo. E, casamento, ainda que sem contrato, sem assinatura de um papel, é muito mais a determinação contínua de um casal, objetivo comum, do que mera formalidade legal.

Felizes para sempre? Nem sempre. O que importa mesmo é não desistir de amar, não carregar o passado como quem leva pra sempre um piano nas costas. Não atirar esse peso sobre os ombros do novo par. Não recusar-se a mergulhar no lago com medo de se afogar, por mera covardia. Com papel, sem papel, tanto faz. Ser feliz é fazer alguém feliz. Sendo assim, casar com alguém é um pacto de felicidade, ainda que aconteçam coisas ruins, ainda que os dias não sejam todos cor-de-rosa, ainda que a princesa fique parecida com a Fiona ( Shrek), ainda que o príncipe tenha manias, no mínimo, irritantes.

O relacionamento amoroso pode ser a mais rica experiência de um ser. Um treino constante de superação, tolerância e respeito à individualidade do par. Esse aprendizado é contínuo, perdura nas bodas de ouro do casal e pode ir muito além. Casamento feliz não tem receita, não tem fórmula mágica. Quem ama constrói, quem ama agrega. Eis que um dia, de repente, olha-se ao redor e nota-se a raiz profunda, os frutos, a beleza do relacionamento. Isso quando realmente há o amor. E quando não há o amor, quando um está simplesmente aturando o outro, o jeito é parar pra pensar nos motivos disso. Casamento não é prisão, casamento não é castigo. A lei não protege o coração de ninguém. Lei não é seguro afetivo.

Observei as fotos do casamento do príncipe de Mônaco. Linda a noiva! Um dia casei, depois me divorciei, também já fui a noiva, vivi o que precisava para chegar no dia de hoje, com a experiência que tenho comigo. Olhei para o meu lado, Divo Latívio sentado no sofá da sala, comendo salgadinho, bebendo sua cervejinha, pijaminha surrado, meio descabelado, distraído assistindo um programa na TV. Segurei sua mão e suspirei feliz, finalmente aprendi a valorizar o que é verdadeiro: AMOR!

2 de jul. de 2011

SAUDADE EM SI ( Para Abílio Manoel)

Saudade em si
Claves, letras, Céu.
Lá, nuvens que fazem nó.
Fá, som ao redor.
Sem ti é tudo dó.
Som, som, som.
Sua voz, música entoada sem ti.
Ré, melodia que te faz aqui.
Canção dentro de mim.
Nosso elo, dó, dó, dói sem ti!
 Mi, mi, mi.
Sol, saudade em si.
Mi, saudade em mim.


1 de jul. de 2011

O CHÁ QUE PROMETE ARRUMAR CASAMENTO


Considero o sossego o bem imaterial mais valioso que alguém pode obter. Quem tem sossego está em paz, tem saúde, amor, não está com a conta corrente no vermelho, dorme tranquilamente, está de bem com o espelho. Ah, sossego... Estava sossegadinha e ainda despertando nesta manhã.
A inspiração passou ligeirinha por mim. Sussurrou uma nova ideia para uma crônica. Diante do televisor, ao lado de Divo. Pouco mais de oito horas da manhã. No telejornal a matéria sobre o clima frio e, depois, outra reportagem: cerejeiras floridas no sul do país. Belas imagens, o contraste das flores e galhos delicados com o azul intenso do céu.
Ainda sonolenta, eis que brilhou a ideia: tradição oriental, convescote sob as cerejeiras. Reunião feliz, bucólica. Para aquelas que desejam o casamento, a recomendação é beber chá sob as floridas cerejeiras. Aquelas que tiverem a sorte de ter seu chá abençoado com uma pétala da cerejeira trazida pelo vento, se casará e terá felicidade.
Até aqui está bonitinho o meu texto, mas nasci para ser palhaça. Portanto, eis que decidi beber chá sob uma cerejeira em flor. Ao lado da minha casa, dona Mityko, amiga de minha mãe, tem uma cerejeira na frente de seu belo sobrado branco. Apressei-me. Procurei um chá de saquinho, não tinha de camomila, serviu aquele de nome esquisito: “bons sonhos”. Esquentei a água no micro-ondas, escolhi uma canequinha com a estampa da Cinderela. Mergulhei caprichosamente o sachê do chazinho na água escaldante. E lá fui eu, pro outro lado da rua.
Estava ali, ansiosa. Nada do vento soprar. Olhava pra cima e, vez ou outra, olhava ao redor. A cada vizinho que por ali transitava, eu tentava disfarçar. Olhava pra cima, ia mais pra frente, mais pra trás, mais pra direita, mais pra esquerda. Um motoqueiro passou e buzinou pra mim. E eu lá, mirando as pétalas da cerejeira em flor, uma espécie de malabarismo segurando a xícara e olhando pro alto. Passou um vizinho. – Bom dia, Sr. Antônio. É... Estou aqui admirando a cerejeira! Bonita, não é? E lá se foi o Sr. Antônio, sem dar muita bola pra minha maluquice. Eis que passou por mim o vigia da rua, Vanderlei. – Ô Dona Diva, a senhora tá procurando a dona Mityko? Ela saiu cedo hoje. – Não, Vanderlei. Eu vim aqui olhar a cerejeira. E papo vai, papo vem, mostrei a ele o chá. Coitadinho, àquela hora ainda não tinha tomado o café da manhã. Generosa, ofereci um golinho da xícara, eu poderia preparar outro chá pra mim. E eis que, nesse momento, nas mãos de Vanderlei, a pétala de flor caiu dentro do chá.
Pois é. Não serei eu a casar-me. Não desta vez. Preciso voltar lá, tentar outra vez. Quem sabe, convencer Divo a passear sob a árvore, segurar a xícara pra mim só um pouquinho? Acho que se ele se casar, a chance de eu me casar também se multiplicará. Quem sabe um case com o outro, Divo e Diva, coincidência feliz. Pois é, caro leitor, eu não desisto. Até simpatia oriental está valendo. Se souber de algo mais eficaz, conte pra mim. Quanto ao Vanderlei, continua de rolo com a faxineira da casa do final da rua. Não ata, nem desata. O chá “ bons sonhos” parece ter surtido algum efeito, não o vi o resto do dia, deve ter ido embora pra casa mais cedo. Eita chá danado de bom! Se não arruma casamento, ao menos dá um soninho irresistível!