Às vezes me pego pensando o que seria de mim, não fosse a ajuda tão valiosa de minha ajudante do lar, Zezé.Cheguei em casa no começo da noite. Cansada! Zezé, esquecida da vida, estava na sala, televisor ligado na novela das seis. O jantar, pelo aroma e som da panela de pressão, estava a caminho.
- Dona Diva, a senhora acredita em paixão da vida toda?
- Paixão? Não, Zezé. Paixão é feito foguete que sobe e depois desce.
- Aff, Dona Diva. Deixa o Seu Divo saber disso.
- Lavou a verdura pra salada, Zezé?
- Lavei alface.
- Vou agora tomar um banho, tempera a salada pra mim, por favor?
Olhou-me indignada. – Dona Diva, nessa novela tem paixão da vida toda e eu não posso perder o que vai acontecer. “Despois” eu lavo a alface.
Resignada, fui cuidar da minha vida. Uma hora depois, voltei pra sala. Zezé assistia ao telejornal.
- A senhora viu o que fez aquele deputado? “Robô” o dinheiro da merenda das “criancinha”, coitadinha das “criancinha”!
Suspirei, tentando não me zangar.
- Zezé, já temperou a salada?
- Vixe Maria, esqueci, “peraí” que já vou lá.
Depois do jantar, sentamos juntas na sala. A novela das nove rolava solta. Entre suspiros e comentários diversos, Zezé não se conformava com o descaso do mocinho, que parecia não querer nada sério com a mocinha.
Durante os comerciais, veio outra daquelas perguntas que ela bem sabe fazer. – Dona Diva, se o Seu Divo te falasse que não vai se casar com a senhora, o que a senhora faria?
- Eu daria um pé no traseiro dele, com certeza.
- Xi...
- Por que o “xi”, Zezé?
- É que ele não quer mesmo casar, então a senhora vai dar um pé no traseiro dele. Ainda bem que ele é gordinho, não vai doer tanto assim o pé, né Dona Diva?
- Ô Zezé, você já lavou a louça do jantar?
- Já vou lavar! Quer um chá pra acalmar?
- Pare de fazer perguntas, Zezé.
- A senhora tá parecendo aquela minha patroa japonesa. Japonesa? “Num” sei se era chinesa, coreana. Já sei, era japonesa mesmo!
- O que houve com sua patroa japonesa?
- Ah. Eu tinha uns catorze anos. A patroa todo dia colocava umas comidas na frente da “estauta” de um santo japonês. Um que é gordinho, parecido com o Seu Divo.
- Buda?
- Num sei não senhora o nome do santo. Então ela colocava as comidas. Bala, bolo, doce. E eu vivia com fome. Então eu ia lá e comia tudo. E a patroa ia na frente da "estauta" e falava "umas coisa" em japonês, rezava. Depois ela agradecia pro santo: - Obrigada, você comeu tudinho, tava com fome!
- Não acredito, Zezé!
- É sério, Dona Diva!
- A “muié” pensava que o santo tinha comido tudo!
- Ela nunca desconfiou de você?
- Desconfiô. Ela um dia disse assim pro santo: - Óia santinho, se um dia eu “discubri” que alguém “robô” sua comida, eu mato essa pessoa.
Não pude me conter. Ri muito!
- Dona Diva do céu! Morri de medo da “muié”. “Pidi as conta” e fui embora, “sebo nas canela”!
- Zezé, o que tem essa patroa japonesa a ver comigo?
- Hum... A senhora faz de conta que é boazinha, mas é brava pra caramba. Acho que se souber que eu deixei cair cândida na sua “brusa vermeia”, vai me matar.
-Você estragou a minha blusa nova?
- Num falei? Tô morta!
A noite terminou comigo bebendo um chá de camomila que ela preparou. Um chá calmante, pra eu esquecer os males que me assolam.
E eu aqui continuo a pensar: não imagino como seria minha vida sem a Zezé!
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