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Não havia dúvida, aquele menino era terrível. Esse o adjetivo que os adultos mais utilizavam. Havia outros: danado, capeta, levado, sapeca. Filho mais novo de uma família numerosa. Temporão. Aos sete anos de idade, sua extensa lista de traquinagens incluía uma foto que havia tirado da avó tomando banho. Sorrateiramente entrou no banheiro e clic! O flagrante foi registrado com a câmera fotográfica esquecida sobre a mesa da sala de jantar. Em tempos da lei da palmada, seus pais estariam em apuros se fizessem o prometido: dar-lhe umas belas palmadas no traseiro. Porém, tudo isso aconteceu há décadas e, naquele tempo, palmadinhas no bumbum eram normais. Entre uma chinelada e outra, entremeada com horas a fio de castigo no quarto, o garoto não parava de tramar a sua próxima estripulia.
No aniversário ganhou da tia um embrulho com papel colorido. Rasgou apressadamente. Dentro, um brinquedo que fez seus olhos brilhar de contentamento: O Pequeno Químico. Frascos contendo líquidos que prometiam fórmulas sensacionais, entre elas algo chamado “sangue do diabo”. Foi nesse dia que a garagem de casa explodiu. Correria, susto, aflição. O garoto com os cabelos arrepiados, os olhos esbugalhados. Sorriso de satisfação, algo similar à descoberta da pólvora. O kit de química foi confiscado pelo pai.
A infância transcorreu com muitos arranhões, algumas fraturas, dois dentes quebrados e cicatrizes que hoje ostenta orgulhosamente. Aos cinquenta anos de idade, o garoto cresceu. Seus filhos, contemporâneos da lei da palmada, não levam chineladas. No máximo, ficam de castigo, sem poder acessar a internet. Nenhum deles ganhou um brinquedo contendo elementos químicos. Moravam em um edifício com muitos apartamentos, não havia um espaço reservado para brincar, senão o playground. Nenhum era terrível, apesar da força da herança genética. Talvez, por esse motivo, resolveu mudar-se para o interior, desejava ver os filhos correndo descalços, subindo em árvores.
Na primeira semana, o mais velho foi picado por um inseto e teve uma forte crise alérgica. Na segunda semana, o outro filho caiu ao tentar escalar uma mureta. E ele, já arrependido, suspirou resignado. Nada daquilo se parecia com a sua infância, quando os machucados não eram seguidos de choradeira, mas sim de orgulho pelo “mal feito”. Lamentou a mudança dos tempos, a modernidade dos dias. Na sua época de menino, infância era sinônimo de balão em junho, bombinhas dentro de latas, bola de meia, figurinhas no concorrido “bafo”, bolinhas de gude, frutas colhidas e saboreadas direto do pé, carrinhos de rolimã. Observou à distância seus filhos sentados à frente do computador. Sentiu saudade da simplicidade de um tempo que não voltará nunca mais.
Aqui você encontrará temas ligados a comportamento, relacionamentos e cotidiano.
É proibida a reprodução não autorizada dos textos deste blog, de acordo com a Lei nº9.610, de 19 de fevereiro de 1998, que regula os direitos autorais.
Apresentação
Este blog nasceu no blog Janela das Loucas, onde assinava "Diva Latívia". Ali permaneci durante muito tempo, como autora principal das crônicas do blog. Redescobri que escrever é vital pra mim, guiada e editada por Abílio Manoel, cantor, compositor, cineasta e meu querido amigo. O Janela das Loucas não existe mais, Abílio foi embora pro Céu. Escrevo porque tenho esse dom divino, mas devo ao Abílio este blog, devo ao Abílio a saudade que me acompanha diariamente. Fiz e faço deste blog uma homenagem a aquele que se tornou meu irmão, de alma e coração. Aqui o tema é variado: cotidiano, relacionamentos e comportamento, em prosa e versos.
15 de jul. de 2011
ANTIGA INFÂNCIA
Não havia dúvida, aquele menino era terrível. Esse o adjetivo que os adultos mais utilizavam. Havia outros: danado, capeta, levado, sapeca. Filho mais novo de uma família numerosa. Temporão. Aos sete anos de idade, sua extensa lista de traquinagens incluía uma foto que havia tirado da avó tomando banho. Sorrateiramente entrou no banheiro e clic! O flagrante foi registrado com a câmera fotográfica esquecida sobre a mesa da sala de jantar. Em tempos da lei da palmada, seus pais estariam em apuros se fizessem o prometido: dar-lhe umas belas palmadas no traseiro. Porém, tudo isso aconteceu há décadas e, naquele tempo, palmadinhas no bumbum eram normais. Entre uma chinelada e outra, entremeada com horas a fio de castigo no quarto, o garoto não parava de tramar a sua próxima estripulia.
No aniversário ganhou da tia um embrulho com papel colorido. Rasgou apressadamente. Dentro, um brinquedo que fez seus olhos brilhar de contentamento: O Pequeno Químico. Frascos contendo líquidos que prometiam fórmulas sensacionais, entre elas algo chamado “sangue do diabo”. Foi nesse dia que a garagem de casa explodiu. Correria, susto, aflição. O garoto com os cabelos arrepiados, os olhos esbugalhados. Sorriso de satisfação, algo similar à descoberta da pólvora. O kit de química foi confiscado pelo pai.
A infância transcorreu com muitos arranhões, algumas fraturas, dois dentes quebrados e cicatrizes que hoje ostenta orgulhosamente. Aos cinquenta anos de idade, o garoto cresceu. Seus filhos, contemporâneos da lei da palmada, não levam chineladas. No máximo, ficam de castigo, sem poder acessar a internet. Nenhum deles ganhou um brinquedo contendo elementos químicos. Moravam em um edifício com muitos apartamentos, não havia um espaço reservado para brincar, senão o playground. Nenhum era terrível, apesar da força da herança genética. Talvez, por esse motivo, resolveu mudar-se para o interior, desejava ver os filhos correndo descalços, subindo em árvores.
Na primeira semana, o mais velho foi picado por um inseto e teve uma forte crise alérgica. Na segunda semana, o outro filho caiu ao tentar escalar uma mureta. E ele, já arrependido, suspirou resignado. Nada daquilo se parecia com a sua infância, quando os machucados não eram seguidos de choradeira, mas sim de orgulho pelo “mal feito”. Lamentou a mudança dos tempos, a modernidade dos dias. Na sua época de menino, infância era sinônimo de balão em junho, bombinhas dentro de latas, bola de meia, figurinhas no concorrido “bafo”, bolinhas de gude, frutas colhidas e saboreadas direto do pé, carrinhos de rolimã. Observou à distância seus filhos sentados à frente do computador. Sentiu saudade da simplicidade de um tempo que não voltará nunca mais.
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