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Apresentação

Este blog nasceu no blog Janela das Loucas, onde assinava "Diva Latívia". Ali permaneci durante muito tempo, como autora principal das crônicas do blog. Redescobri que escrever é vital pra mim, guiada e editada por Abílio Manoel, cantor, compositor, cineasta e meu querido amigo. O Janela das Loucas não existe mais, Abílio foi embora pro Céu. Escrevo porque tenho esse dom divino, mas devo ao Abílio este blog, devo ao Abílio a saudade que me acompanha diariamente. Fiz e faço deste blog uma homenagem a aquele que se tornou meu irmão, de alma e coração. Aqui o tema é variado: cotidiano, relacionamentos e comportamento, em prosa e versos.







9 de jul. de 2011

A TIA E A FESTA JULINA


Sempre quis saber quem inventou essa tal de “festa julina”. Pensava o seguinte: não basta festa junina? Julina não existe! Assim foi, até o dia em que minha sobrinha pediu que eu preparasse uma festinha julina, pra ela receber os amigos da faculdade. Comecei os preparos pela listinha do supermercado: ingredientes para o bolo de fubá, muito milho verde, pipoca, carne para o churrasco, legumes e verduras para a salada. Grifei algo que não dispenso: farinha para a farofa. Aliás, farofa é comigo mesma! Já estava no supermercado, quando ela telefonou: - Tia, compre cachaça, vinho e tudo o que precisar pra preparar quentão e vinho quente.
Meus pensamentos foram direto pro risco da coisa: bebida alcoolica e moçada, vai que de novo bebo e tenho amnésia? Mas, o que não faço pra alegrar minha família? Comprei tudo, do gengibre ao cravo e canela.
Final do dia, poucas horas antes do começo da festinha. Já tinha pendurado bandeirinhas de São João pela casa toda. Um custo encontrá-las. Subi e desci a ladeira daquela rua central de São Paulo, de loja em loja. Pouco havia restado do material destinado às festividades juninas. Por fim, encontrei não apenas o enfeite procurado, mas também balõezinhos e aquelas biribinhas, ou estalinhos. Pareceu perfeito!
De chapéu de palha na cabeça, com rendinha e longas trancinhas loiras, lá estava eu no fogão, preparando vinho quente e quentão. Receitinha simples, encontrada na internet. Açúcar, cascas de frutas, maçãs picadas. Para o quentão, gengibre fatiado bem fininho. Provei. Achei doce. Coloquei toda a garrafa da cachaça. Deixei apurar mais um pouquinho, em fogo brando. Provei novamente. Bom demais! Servi-me um copo. O frio daquele final de dia deu lugar a um calorzinho bom! Chegou a vez do vinho quente. Abri 2 garrafas de vinho tinto e segui as instruções passo a passo. Provei. Faltava canela. Juntei a especiaria e provei novamente. Eita que estava delicioso! Busquei uma caneca, caprichei na canela em pó e sentei-me confortavelmente na cozinha. Que calor, nem parecia inverno! Achei que o vinho quente poderia ser incrementado com mais maçãs. Piquei algumas, juntei à bebida. Melhor provar! Tão bom, mas achei melhor desta vez não misturar quentão com vinho quente. Prometi a mim que não misturaria nada, que apenas beberia o vinho quente. Mas, o quentão estava tão perfumado. Deixei pra decidir o que escolher apenas na hora da festa. Não resisti, repeti o vinho quente.
À noite chegaram os convidados. A mesma turminha conhecida, os que me convidaram para acampar e também me conduziram à balada. – Oi, tia, não vai beber tequila hoje, heim?
Eles não perdem a piada. Não beberia tequila, afinal era uma festa julina! Momento de esquentar as bebidas. Quando provei o quentão, cismei que faltava mais cravo. E lá fui eu provar novamente, desta vez não resisti ao copinho.
A coisa subiu feito foguete. – Xente, tá pronto o quentão. Xes podem xe xervir!
Faltava o vinho quente. A imagem da panela parecia caminhar sobre o fogão. – Pára quieto vinho quente. Xe fica aí xenão te amarro!
- Tia? Você bebeu?
- Não, querida. Xó provei um golinho.
- Tia! Você está de pilequinho!
- Menina, xá falei que xó provei.
-Mas, Tia, você é fraca pra beber. Por que não me chamou pra experimentar?
- Xaco, xá te expliquei que não chamei e xá falei que xó tomei uma canequinha.
Quando me vi em frente ao espelho do banheiro, eu estava vermelha feito um pimentão. Lá fora, 10C de temperatura, mas eu fervia de calor. Meio descabelada, chapéu de palha torto na cabeça. Um horror! Lavei o rosto com água fria, respirei fundo. Que vexame! Teria sido o vinho quente, ou teria sido o quentão? Pra rebater, nada melhor que pipoca. E fui novamente ao fogão. A panela rodava sem parar. – Vai logo, vê xe estoura deprexa que hoje não tô legal!
Metade queimou, mas deu pro gasto. A moçada de vez em quando passava por mim e perguntava: - Tia, você tá melhor? E eu, no estado que estava, divertia a todos. Por fim, os preparos ficaram por conta dos mais jovens. Comi umas paçoquinhas, para tentar rebater o porre que tomei de maneira incauta. Fiquei enjoada. No caminho entre a cozinha e a lavanderia, passos sinuosos, eu pisava naquelas minúsculas biribinhas atiradas ao chão. A cada estouro, a moçada ria sem parar.
No final da festa, conforme se despediam, os garotos faziam gracinha: - Tia, semana que vem tem festa do peão. Sabe preparar caipirinha? Só o nome da bebida, já causava mal estar. Quando acordei, no dia seguinte, minha cabeça parecia um balão, flutuando solto no espaço. Cabeça oca! É nisso que dá preparar vinho quente e quentão, tudo ao mesmo tempo. Agora preciso adicionar à minha lista de itens proibidos essas duas bebidas. Listinha negra, na qual o primeiro ítem é a tequila. Falei sozinha, em alto e bom som, pra ver se memorizo e jamais esqueço: “vinho quente e quentão, juntos não os beberei nunca mais”!

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